Fonte atual, no início do
Caminho Monsenhor Moreira, a escadaria do Monte Serrat
Foto: Carlos Pimentel Mendes, 23/6/2000
Fui
a Itororó
Beber água e não achei
Adeus bela morena
Que no Itororó deixei...
A música é bem conhecida e cantada pelas crianças em todo o Brasil, mas até mesmo muitos
santistas desconhecem sua origem santista, e há quem atribua origens baianas pelo fato de em Salvador existir o Dique do Itororó.
Na verdade, conta o falecido escritor Olao Rodrigues, em seu livro Cartilha da História de Santos (1980,
Santos), que a fonte, situada no sopé do Monte Serrate, era "servida por água límpida e cristalina,
que brotava da rocha a meio caminho do lendário morro" e "muita gente para lá acorria a fim de saborear o bom líquido,
com ou sem sede, pois dizia-se que quem dela sorvesse, não mais deixaria a cidade. E a lenda pegou. Fez fama. Certo é que centenas e milhares de
criaturas que tomaram a gostosa água aqui ficaram como desejavam."
A fonte antiga, escondida junto a um telheiro de garagem, atrás da fonte atual
Foto: Carlos Pimentel Mendes, 23/6/2000
Continua o autor: "Antigamente, quando a cidade não dispunha de rede abastecedora, a água do
Itororó era buscada para uso doméstico, como também servia a muitas lavadeiras pobres. Tudo tem seu fim. A Municipalidade canalizou o líquido, que
passou a jorrar com mais densidade. Mas também vieram os abusos. E, um dia, a água pura, límpida e cristalina, que nascia naturalmente, foi
considerada bacteriologicamente nociva e, como tal, condenada para uso público. Mais adiante, ainda no sopé do Monte Serrate, construiu-se outra
fonte muito procurada, como se a água viesse de qualquer nascente do morro. Também esta não está mais em uso, tais os abusos que maloqueiros -
homens e mulheres - perpetravam; embora sujeita ao registro comum da rede, está há tempo desligada.
"Não temos, pois, Fonte do Itororó, nem legítima, nem disfarçada. Aliás, a antiga Biquinha está
situada em próprio municipal, o Serviço de Eletricidade da Prefeitura Municipal. Antes, lá funcionou empresa industrial, a Companhia de Águas do
Itororó, que suspendeu sua atividade. Até boate foi em outros tempos - O Churrasco - muito movimentada lá por 1932-33.
Placa na garagem do prédio municipal, ao lado da fonte antiga do Itororó
Foto: Carlos Pimentel Mendes, 23/6/2000
"A
Biquinha do Itororó - onde começava o ribeiro do mesmo nome, que atravessava algumas ruas, como as do Rosário e 15 de Novembro, indo perder-se no
mar - não passa hoje de rica tradição de nossa terra, famosa até em outras regiões pela limpidez e pureza de sua água", completa Olao
Rodrigues.
Em anos recentes, a segunda Biquinha do Itororó foi recuperada pela administração municipal, recebendo placa
alusiva à origem da lenda. Situa-se no início da escadaria que dá acesso ao alto do Monte Serrat, no final da Rua Itororó. A primeira bica fica
atrás da atual, em local ocupado pela garagem do prédio municipal. Sob o telheiro da garagem, pode ser vista ainda a antiga placa indicativa "Águas
do Itororó".
A Biquinha do Itororó é mencionada também na publicação Indicador Turístico, lançada em 1885 no Brasil:
"Servida por água límpida e cristalina. Diz-se que a sua água fazia o milagre de fixar na cidade quem a sorvesse".
Descrição - Em página Web da
Prefeitura Municipal de Santos, depois de citada a relação com a música folclórica, é feita esta descrição da fonte de Itororó:
"[...]
A fama da música supera a singeleza do chafariz parietal, que consta de cuba tripartida encimada por azulejos brancos. Eles são arrematados por um
friso com desenhos inspirados na mitologia, sob acabamento de azulejos decorados. Todo em azul e branco, o conjunto é completado por moldura de
concreto. Dos lados, elas formam volutas que se prolongam até o ápice, finalizado por pináculo com carranca. Separadas por um muro, palmeiras e
chapéu-de-sol documentam o que sobrou do antigo Jardim do Itororó.
"A princípio chamada de Tororó, que em tupi quer dizer jorro ou enxurrada, mais tarde a bica
passou a ser denominada de Itororó, que significa água barulhenta ou de enxurrada. Ela formava o ribeiro do Itororó, cortado por pontes de madeira e
que atravessava ruas como a atual João Pessoa e XV de Novembro, em direção ao mar. Pertenceu a Brás Cubas, fornecendo água para seu curtume,
abasteceu uma lavanderia pública e, em 1932, serviu a Empresa Águas do Itororó, fabricante de refrigerantes.
"[...]
Além dos versos anônimos do cancioneiro popular, a Fonte de Itororó inspirou músicos como Villalobos e poetas como Antônio Carlos de Andrada e Silva
e Martins Fontes. Abandonada durante décadas, em 2001 foi recuperada por um grupo de artistas denominado NOA. A ação está incluída no Programa de
Revitalização do Centro Histórico, desenvolvido pela Prefeitura Municipal, a partir de 1997."
A fonte, em 2004
Foto: Prefeitura Municipal de Santos
Origens - Conta o historiador Francisco Martins dos Santos, em sua História de Santos (volume 2,
segunda edição, 1986) que Itororó denominava uma fonte e um riozinho junto aos quais, desde 1532, estabeleceram roças e moradas dois dos principais
povoadores de Enguaguaçu e fundadores da cidade de Santos, Pascoal Fernandes e Domingos Pires:
"Chegados com Martim Afonso de Souza, parece terem eles encontrado no lugar um Afonso
Botelho, que certamente indenizaram para o tirar dali e obterem do governador todas aquelas terras situadas na encosta do morro de São Jerônimo
(N.E.: atual Monte Serrat) até o porto, e do riozinho São Jerônimo até proximidades do
outeiro de Santa Catarina. O riozinho de Itororó foi canalizado pelo saneamento há muitos anos, e a antiga Fonte, de águas férreas (analisadas em
1841, a pedido de um fiscal da Câmara, que lhes descobrira tais virtudes), serviu ao público até 1930 mais ou menos. Suas águas chegaram a ser
industrializadas por uma empresa, em seus últimos tempos, e, depois, poluídas ou julgadas poluídas pela construção de
moradas proletárias em suas cabeceiras, foram condenadas, e, ao que parece, desviadas das antigas bicas para a canalização já antiga do rio.
"Hoje, após haver inspirado poetas (ao próprio Antônio Carlos Ribeiro de Andrada e Silva),
após terem servido às antigas e pitorescas lavanderias públicas, após 400 anos de tradição e serventia pública de toda natureza, Itororó é apenas
uma lembrança. Teve o mesmo destino de todas as outras que existiam na cidade tradicional, e de tão grata memória.
"O antigo ribeiro de Itororó chegou a chamar-se também Ribeirão do Carmo, por sair ao lado
do Convento, no porto. Nas antigas escrituras ele aparece como Tororó, corruptela de Xororó e Y-xororó (I-xororó) (= água
corrente - manancial - na língua brasílica). Quem sobe o Monte Serrat (a pé), começa o caminho e a subida pela fonte histórica".
Empresa Águas do Itororó
Anúncio publicado no jornal santista A Tribuna em 26 de março de
1929 - página 15
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