J. Muniz Jr. (*)
Nas documentações históricas, sobre a defesa militar da
Capitania e fortificações marítimas da Praça de Santos, constam citações sobre outros fortes, reais e imaginários, tais como o Forte de São João,
que teria existido na Ilha do Carvalho - que no parecer do historiador Alberto Sousa (1),
seria a atual ilha Barnabé, onde, segundo observa, nunca sequer foi iniciado, e que teria sido ele imaginário.
Embora o historiador Washington Luís descreva (2)
que, em todo o tempo em que permaneceu em São Vicente, o fidalgo Martim Afonso de Sousa não fez nenhuma fortificação para a defesa das terras,
Benedito Calixto (3)
pondera que o donatário, pensando na defesa da sede, da colônia, além de rude torre de defesa, tratou de fortificar e guarnecer "não só a vila de
São Vicente", como também a povoação de Itanhaém. E que as circunstâncias obrigaram-no a levantar baluarte de defesa no Porto das Naus, em frente ao
porto de Tumiaru, artilhar a "muralha natural" da boca da Barra de S. Vicente, em frente à primitiva vila e Ilha do Sol...".
O historiador J.F. de Almeida Prado (4)
também faz referência à fortaleza de Tumiaru, "onde se ergueria a futura Ribeira das Naus".
Cumpre-nos lembrar que a aludida ilha, chamada pelo citado historiador de "Ilha do Sol" não é a ilha de Santo
Amaro, que teve tal denominação nos tempos coloniais. No caso, a citação é para a antiga Ilha do Mudo, conhecida atualmente
como Ilha Porchat.
Planta de S. Vicenzo, de autoria de Vicent Hubert e datada de 1698, que J. Muniz Jr. atribui
a Frei João José de Santa Tereza, mostra a "Fortalezinha", à esquerda da ilha de Santo Amaro
Com referência às primitivas fortificações, o historiador Joaquim Duarte Alves Feitosa
(5) conta-nos que, no sopé do morro dos Barbosas, em São
Vicente, "erguia-se a fortificação pré-afonsina denominada "Torre de Pedra", e que desse ponto até a barra da Bertioga, sucederam-se "as
fortificações defendendo aquele vilarejo e o de Santos", cujos habitantes estavam sempre em sobressalto, temendo ataques dos índios ou os atos de
pirataria.
Na antiga planta da Ilha de Santo Amaro e de São Vicente,
do Frei João José de Santa Tereza (6), destacam-se cinco
fortificações: uma em Bertioga, a de Vera Cruz do Itapema, a de Santa
Madalena (Barra Grande), uma outra defronte do canal da Barra, provavelmente o da Estacada do Castro e, finalmente
uma última à esquerda, na boca da barra de São Vicente, entre a atual Ponte Pênsil e a praia de Paranapoan.
Sobre essa quinta e última fortificação, presume-se que seja a famosa Fortalezinha,
erigida desde os tempos coloniais nas imediações da antiga Fazenda de Paranapoan, pois de acordo com o relato de Edison Telles de Azevedo
(7): "... Nessa praia existiu, em longínqua era, a Fortalezinha
ou Casa de Pedra..."
Tal fortificação ficava no caminho da praia de Paranapoan, bem na ponta ou curva, antes de
se chegar na dita prainha, e sobre a mesma o Professor Costa e Silva Sobrinho faz a seguinte dissertação (8):
...o fortim mais tarde conhecido pelo nome de Fortalezinha, a qual se acha mencionada na planta
hidrográfica da barra e do porto de Santos, levantada pelo barão de Tefé, em 1876; no mapa da Comissão Geográfica e Geológica do Estado de São
Paulo, edição preliminar de 1911; e nos trabalhos de Calixto. Ela ficava precisamente no sítio
denominado mais tarde "Fortalezinha" ou "Casa de Pedra". Numa escritura pública de venda do sítio Paranapuan, passada em 12 de
fevereiro de 1891, entre Joaquim Manuel das Neves e outros e Antônio de Lima Machado e outro, pudemos verificar que aquele sítio dividia de um
lado "com a prainha", em frente à boca da barra de São Vicente, e "Pasto Grande", e partia da Fortalezinha ou Simirinduba
ao cume do morro etc. |
Sabe-se que, a 24 de maio de 1766, o Capitão General da Capitania de São Paulo, D. Luiz
Antônio de Sousa, ordenou ao Capitão Fernando Leite Guimarães, comandante da Fortaleza da Barra Grande da Vila de
Santos, que fosse à Vila de São Vicente com o objetivo de delinear dois fortes, de acordo com a capacidade que houvesse. O primeiro na Ilha e o
segundo na Ponta do Bananal, e que cada um deles tivesse "capacidade de sustentar 4 peças" (9).
Outro forte citado em antigos manuscritos é o da Ponta do
Camarão, não existindo notícias sobre o ano de sua edificação, havendo inclusive dúvidas sobre o local onde teria sido levantado. A respeito, o
Marechal Daniel Pedro Muller, que foi do Real Corpo de Engenheiros, acentua (10)
que, nos idos de 1830, sua guarnição em tempo de paz era de apenas três homens, contando em tempo de guerra com 1 oficial, 2 inferiores, 10
artilheiros, 30 artilheiros-serventes e 20 soldados infantes.
Sobre a sua provável localização, que é discutida até os dias atuais, vejamos o
parecer do historiador Francisco Martins dos Santos (11):
O Almanaque da Província de São Paulo de 1870 cita também, declarando que a sua construção fora feita
apenas em parte, nunca tendo sido concluída. Ficamos assim perfeitamente indecisos, sem podermos identificá-lo com certeza, visto que até mesmo
os velhos santistas que consultamos nada puderam adiantar.
Entretanto, como nos mapas antigos da cidade consta como Ponta do Camarão a grande curva do Paquetá, é
possível que ali tenha existido esse Forte e não em outro lugar. |
No que tange às primitivas fortificações vicentinas, cabe observar que, de acordo com os
registros históricos, a Fortalezinha, ou Casa de Pedra, existiu na Ponta do Paranapoan, enquanto a Torre de Pedra foi levantada
próximo ao morro dos Barbosas, "por iniciativa de Gonçalo da Costa e do Bacharel Mestre Cosme Fernandes, que protegeu durante alguns anos o
povoado de São Vicente, origem da cidade atual, como marco e broquel da nossa primeira civilização", conforme acentua o Prof. Francisco Martins dos
Santos (12). Afirma ainda o mesmo historiador que a fortaleza
do Bacharel foi a primeira fortificação erguida em terras do atual Estado de São Paulo.
Notas:
(1) "Não conseguimos saber
ao certo onde era essa ilha do Carvalho, mas quer-nos parecer que era a própria ilha do Barnabé. A família de Barnabé Vaz de Carvalho, cujo nome de
batismo passou à ilha, era entrelaçada com José Antônio Vieira de Carvalho, por laços de casamento. A ilha Barnabé, que lhe coube por herança, e na
qual existiam ainda há uns trinta anos os muros esfacelados de um velho casarão colonial (em 1873, era ainda proprietária da ilha Dona Anna Zeferina
Vaz de Carvalho), seria, pois, a ilha do Carvalho, onde pretendia erigir o novo Forte de São João, que, aliás, nunca foi encetado" (Os Andradas,
Vol. I, pág. 42).
(2) Na Capitania de São
Vicente, pág. 10.
(3) Capitanias Paulistas,
Cap. XVII, pág. 166 - vide também a Topografia de São Vicente em 1852, organizada por B. Calixto, em 1922, na mesma obra, entre as páginas 52
e 53, onde está assinalada a fortalezinha no Caminho de Paranapoan.
(4) Primeiros Povoadores
do Brasil, pág. 111.
(5) Os Militares na
História do Brasil, Rev. do IHGS, vol. I, dezembro de 1959, pág. 43.
(6) Os Andradas, pág.
115.
(7) Praia e Fazenda
Paranapuan, Vultos Vicentinos, pág. 5.
(8) Romagem pela Terra
dos Andradas, pág. 115.
(9) Efemérides Santistas,
Costa e Silva Sobrinho, pág. 79.
(10) Ensaio Estatístico
da Província de São Paulo.
(11) História de Santos,
Vol. I, pág. 356.
(12) Obra citada, pág.
348/349.
(*) J. Muniz Jr. é jornalista e escritor e publicou este texto em seu
livro Fortes e Fortificações do Litoral Santista, edição do autor, 1982, Santos/SP. |