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HISTÓRIAS E LENDAS DE GUARUJÁ
O Forte do Itapema (1)

Localizado em ponto estratégico para a defesa das vilas da Baixada Santista em séculos anteriores, o Forte do Itapema, como é hoje conhecido (esquecidos em parte os nomes de Forte do Pinhão da Vera Cruz e de Fortaleza da Vera-Cruz, ou ainda Santa Cruz) não tem data conhecida de sua edificação. Sobre ele, relata o pesquisador J. Muniz Jr., em matéria publicada em 4 de novembro de 1979 no antigo jornal Cidade de Santos:


As muralhas da fortaleza num quadro a óleo do pintor Benedito Calixto
Imagem publicada com a matéria

No porto, um monumento histórico

Não se sabe ao certo a época da edificação do forte do Itapema. Entretanto, antigos documentos registram que, já na metade do século XVI, existia uma murada fortificada naquele sítio da Ilha de Santo Amaro, tendo sido a terceira fortificação a ser levantada na antiga Ilha do Sol, isso depois da construção da Fortaleza da Pedra (na sua ponta Norte, do outro lado de Bertioga, posteriormente denominada São Felipe) e da Fortaleza de Santo Amaro ou Barra Grande, à entrada da barra. O fortim do Itapema não passava então de um ponto aproveitável para a estratégia daquela época, sendo válido ressaltar que, naquele tempo, só havia fortalezas nas chamadas vilas marítimas ou da Marinha.

Num dos seus brilhantes trabalhos, o historiador Costa e Silva Sobrinho revela que a edificação do forte se verificou na segunda metade do século XVI, e que era chamado primeiramente de Forte do Pinhão da Vera Cruz, passando depois para Fortaleza da Vera-Cruz e posteriormente para da Santa Cruz. Informa ainda que o seu primeiro capitão teria sido Francisco Nunes Cubas (sobrinho de Braz Cubas), que havia adquirido terras na Ilha de Santo Amaro, por provisão do Governador Geral D. Francisco de Souza.

Na sua História de Santos, o historiador Francisco Martins dos Santos observa que a fundação da fortaleza do Itapema ocorreu "... na primeira fase do reinado dos Felipes, por iniciativa dos descendentes de Jorge Ferreira, genro de João Ramalho e capitão-mor várias vezes, primeiro senhor das terras onde ela se fez". Relata ainda que, por volta de 1670, era seu comandante o capitão paulista Pedro Tacques de Almeida, e que, em 1680, exercia o mesmo comando o sargento-mor Gaspar Leite Costa.

É sabido que a fortificação foi levantada em cima das rochas, à flor d'água, com o objetivo de defender a margem oriental do estuário da então Vila de Santos, pois, conforme a estratégia da época, se por acaso o invasor inimigo conseguisse passar por suas baterias, seria então repelido pelos canhões do antigo Forte da Praça ou de Nossa Senhora do Monte Serrat, localizado bem próximo ao terreno onde hoje se encontra o prédio da Recebedoria de Rendas do Estado, nas imediações da estação flutuante de barcas do Departamento Hidroviário da Secretaria de Transportes do Estado.


Planta do Fortim de Vera Cruz do Itapema no Século XVIII
Imagem: reprodução do livro Os Andradas, publicada com a matéria

A fortaleza do Itapema é vista como importante "praça militar' no mapa da Capitania de São Vicente, feito por João Teixeira de Albernas no século XVII, cujo original encontra-se na Mapoteca do Itamarati, e em 1670 encontrava-se sob o comando de Pedro Tacques de Almeida, que além de capitão-mor foi provedor e contador da Fazenda Real da Capitania de São Paulo, juiz da Alfândega e vedor da gente de guerra da Praça de Santos.


No mapa da Capitania de São Vicente do século XVII é visto como importante praça militar
Imagem: reprodução do arquivo J. Muniz Jr., publicada com a matéria

Em fins daquele mesmo século, foi comandada ainda pelo capitão José Tavares de Siqueira, nascido em Santos, e pelo português sargento-mor Gaspar Leite Cesar, inclusive pelo paulista Domingos da Silva Monteiro, que teve a patente confirmada em 1701, e que lhe fora passada pelo governador e capitão-general do Rio de Janeiro, Arthur de Sá Menezes, a 6 de julho de 1699.

Segundo os Apontamentos Históricos da Província de São Paulo, do major Manoel Eufrázio de Azevedo Marques, no primeiro quartel do século XVIII, a fortaleza Vera Cruz da Vila de Santos estava numa situação precária e quase em ruínas.

Devido ao mau estado da fortaleza, que encontrava-se até sem artilharia, e preocupado ainda com as fortificações da Praça de Santos, o rei D. João V enviou carta ao Conde Sarzedas, governador e capitão-general da Capitania de São Paulo, relatando num trecho: "...outro fortim mais acima da Fortaleza da Barra Grande meia legoa distante da V. a da parte do norte chamado Itapema em admiravel citio p. a defença da barra, mas q'este alem de ser pequeno estava demolido, e incapaz de poder servir sem hu reparo e que o Armazem da polvora e Armas estaba cuberto somente de telha vãa e em terra devendo ao menos ser por sima forrado de madras e por baixo ladrilhado de tijolo..." (SIC).


Planta da Ilha de Santo Amaro (em primeiro plano) e suas fortificações,
elaborada pelo Frei João José de Santa Tereza
Imagem reproduzida do livro Os Andradas, de Alberto Souza, e publicada com a matéria

Reforma da fortaleza

Em setembro de 1724, o capitão-general Rodrigo Cesar de Menezes recomendava numa carta-patente a promoção, ao posto de sargento-mor da fortaleza de Vera Cruz, o abastado português Torquato Teixeira de Carvalho, isso devido à sua experiência militar, e ainda pelo falecimento do antigo comandante Domingos da Silva Monteiro, em 1723. Sendo pessoa importante da Vila, Torquato propôs ao governo português a reedificação daquela praça militar, além da sua guarnição total com peças de artilharia, tudo isso às suas próprias expensas. E como a obra estava orçada em 40.000 cruzados, ele pediu em remuneração o posto de capitão, soldo e hábito de Cristo, além do comando para três vidas em seus descendentes.

Aceita a proposta, a reforma foi então executada durante um período de 10 anos, tendo sido suas muralhas aparelhadas com artilharia de grosso calibre. Enquanto Torquato Teixeira de Carvalho se encarregava pessoalmente das obras, teve a confirmação da patente de capitão-comandante, através da decisão do rei de Portugal, datada de 24 de setembro de 1738. A Cronologia Paulista, de José Jacinto Ribeiro, esclarece que, segundo o alvará real, o posto de capitão-comandante da fortaleza do Itapema foi concedido a Torquato Teixeira de Carvalho, em recompensa dos serviços prestados na reconstrução daquela praça forte, às suas custas, e por estarem satisfeitas as condições da dita obra.

Depois da morte de Torquato, que ocorreu em meados do século XVIII, conforme o trato, a fortaleza foi comandada pelo seu filho, o capitão João Teixeira de Carvalho, que, posteriormente, cedeu lugar ao sobrinho Capitão Francisco Olinto de Carvalho, que por sua vez deixou o comando para o filho deste, o Capitão João Olinto de Carvalho.

Por volta de 1770, aquela fortificação encontrava-se guarnecida com quatro peças de calibre 12 e quatro de calibre 8, e já em fins daquele mesmo século estava com seis peças, todas desmontadas.

Numa outra documentação - manuscrito sobre as fortificações da costa marítima da Capitania de São Paulo - de fins do Século XVIII, consta o seguinte a seu respeito:

"A fortaleza de Itapema se acha com seis peças, todas desmontadas, porem boa artilharia apezar de não ter tido quem lhe preste o minimo beneficio. Esta fortaleza, pela situação em que se acha, tem grandes vantagens pelo grande damno que pode fazer aos navios, apezar de lhe apresentar pouco fogo; porem, como o canal é muito proximo á fortaleza, pode esta pelo menos cortar toda a enxarcia e fazel-os desarvorar com planquetas, balas fixas e encadeadas, e pelo ângulo que forma o canal offerecem os navios a pôpa ao flanco, de cuja vantagem se podem aproveitar os da fortaleza, mettendo-lhes balas de coxias, e arrazar-lhes as obras mortas, fazendo-lhes ao mesmo tempo grande mortandade. Nesta fortaleza há logar para se fazer um telheiro em que se possam recolher quatro peças, com seus reparos, e o quartel precisa de grande concerto".(SIC).

Em princípios da segunda década do Século XIX, a edificação da fortaleza constava de muralhas, parapeito e casa de pólvora, sendo que, por volta de 1817, de acordo com uma Portaria datada de 22 de maio e que trazia a assinatura do então governador e capitão-general Francisco de Assis Mascarenhas, o Conde de Palma, o segundo-tenente de Engenharia Rufino José Felizardo veio para a Vila de Santos com a finalidade de dirigir os consertos das fortalezas locais, inclusive da praça forte do Itapema.

Eis as palavras iniciais da aludida Portaria, que transcrevemos a título de curiosidade:

"Havendo-me representado o Sargento-Mor Bento Alberto da Gama e etc. ... Gov.or da Praça de Santos a percisão que tinha de concertos a Fortaleza da Bertioga, os Quartos da Palamentada de Itapema, e Trincheira, os Carretoens da Artilharia, e reparos, e tendo outro sim determinado a Junta da Real Fazenda ao Almoxarife daquella Praça desse logo princípios aos ditos Cocertos; Mas convindo para que fiquem mais bem feitos, que elles sejam derigidos por um Official de Engenharia. Ordeno ao 2º Ten.e de Engenheiros Rufino José Felizardo, que sem demora passe a Praça de Santos, e depois de se apresentar com esta Portaria ao Sargento-Mor Governador da Sobredita Praça examine os concertos preciosos nas mencionadas Obras debaixo da sua inspecção faça continuar os que já se mandarão fazer, e achar que se necessitão outros, além dos determinados me dê promptamente parte com o seu competente orçamento, para eu determinar o que convier...". (SIC).


A fortaleza do Itapema toda embandeirada no ano de 1906
Foto da coleção Marques Pereira, publicada na Revista Comemorativa do centenário da elevação de Santos à categoria de cidade, em 1939, e republicada com a matéria

Decadência da fortaleza

Conforme descrição do Marechal Daniel Pedro Muller, em seu Ensaios Estatísticos da Província de São Paulo, em 1830, a fortaleza tinha, em tempo de guerra, uma guarnição composta de 1 oficial superior, 2 inferiores, 8 artilheiros, 24 serventes-artilheiros e 20 soldados de infantaria.

Na sua Reminiscências de Viagens e Permanência no Brasil, Daniel P. Kidder, ao descrever uma viagem marítima entre o Rio de Janeiro e Santos no mês de janeiro de 1839, diz que, ao entrar no porto santista, observou o seguinte: "...subindo o canal vimos primeiramente, à esquerda, agrupamentos de casa, que, como quem viaja pelo país perfeitamente pode antecipar, constitui o que se chama de Vila Nova. Logo adiante, do lado oposto surgiu o Forte Ipanema, velha fortificação já bastante decaída e cuja guarnição se resumia em uma única família..." Apesar do ilustre viajante ter trocado o nome para Ipanema, ele fazia referência à fortaleza do Itapema, no extremo da cidade de Santos.

Por volta de 1850, os canhões ainda permaneciam em suas muralhas, e já em meados daquela década, encontrava-se com muitos estragos e totalmente desarmada, servindo apenas como depósito de pólvora e, posteriormente, até como depósito de entulhos, e finalmente, em julho de 1883, veio a sofrer um incêndio que a deixou quase que totalmente desmantelada.

E assim, batida pelo tempo, foi perdendo toda a sua utilidade como fortaleza, em fins do século passado (N.E.: século XIX) e princípios deste (N.E.: século XX). Através do Aviso de 9 de setembro de 1905, da Intendência Geral da Guerra, foi confiada à Alfândega, que levantou uma torre no seu pátio, em 1908, para a instalação de holofotes, e uma vez transformada num posto de observação passou a dar combate ao contrabando.

Nessa nova fase, o antigo fortim, forte ou fortaleza do Itapema, veio ainda a prestar relevantes serviços à cidade, principalmente durante todo o período da II Grande Guerra Mundial. E nos dias de hoje, apesar de desativado, se constitui numa das atrações do porto, podendo ser vista tanto do lado do cais, do Paquetá, como também das lanchas que fazem o serviço de transporte entre Santos e Vicente de Carvalho.

Bem que aquela antiga praça de guerra, que é um verdadeiro monumento histórico da Ilha de Santo Amaro, poderia se transformar num ponto turístico de Vicente de Carvalho, e assim, poder ser visitado por turistas e por outras pessoas que passam suas férias na região da Baixada Santista.

Pesquisa e texto de J. Muniz Jr.


O antigo posto da Alfândega, com a sua torre levantada no pátio da velha fortaleza em 1908
Foto de 1915, arquivo J. Muniz Jr., publicada com a matéria

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