Maria Auxiliadora não se conforma com o esquecimento
a que o marido foi relegado ainda em vida
Foto: Adalberto Marques, publicada com a matéria
HISTÓRIA
Família de artista quer ajuda para publicar pesquisa inédita
Fabra pintou a história da fundação de São Vicente
Pedro Cunha
Da Sucursal
Esquecido em uma casa na periferia de Praia Grande,
Carlos Fabra, autor da maior sequência de pinturas sobre a história da Fundação da Vila de São Vicente, faleceu no dia 10 de junho do ano passado,
aos 67 anos. Desde então, a família do artista uruguaio tenta publicar um livro inédito, sobre o primeiro século da Cellula Mater, por dois
motivos imperativos: valorizar a memória do pesquisador, e sair da miséria.
Com mais de 500 páginas, o material é fruto de um amplo estudo realizado por Fabra nos
dois últimos anos de vida, quando um câncer no estômago já o consumia dia após dia. Antes de morrer, o pesquisador revelou à família que o livro
precisava ser publicado, pois seria revelador.
"Não tenho condição de guardar adequadamente este material em casa e temo que a
pesquisa acabe se perdendo com o tempo. O livro está pronto e só precisa de uma revisão", lamenta a esposa do artista, Maria Auxiliadora Fabra, que
mora com os dois filhos em Ribeirópolis, próximo à Curva do S, em Praia Grande.
Na introdução da pesquisa, Fabra esclarece que o livro reúne informações de diversos
estudos sobre São Vicente, já publicados, mas que permanecem fragmentados. O conhecimento do artista sobre a Cidade é mais do que notório.
Além de ter pintado uma série de 37 quadros retratando a formação da Primeira Vila,
batizada de Memorial da História Vicentina, Fabra participou de importantes publicações sobre São Vicente. Dentre elas, destacam-se a
Poliantéia, com informações sobre o Município e o trabalho Gohayó, inicialmente encartado em A Tribuna e, em seguida, reunido em
forma de livro.
Maremoto - Após acompanhar uma morte silenciosa e sem nenhum reconhecimento
público - só um político teria comparecido ao enterro -, a família do artista ficou revoltada ao ver os quadros de Fabra expostos em rede nacional
nos últimos dois domingos, quando o programa Fantástico, da Rede Globo, utilizou uma de suas pinturas para contar a história do maremoto que
destruiu a primeira vila.
"Quando vi o quadro no Fantástico, fiquei feliz ao perceber que o trabalho de
meu pai é importante. Mas, ao mesmo tempo, não consigo entender porque esqueceram dele antes e depois da morte", diz o filho mais velho, Ricardo, de
18 anos.
Mesmo sem ter assistido ao programa, a irmã, Michele, de 17 anos, concorda com a
injustiça sofrida pelo seu genitor. "Fabra nasceu no Uruguai, mas amava São Vicente. E o povo vicentino também o amava, pois sempre mostrou-se
solidário, nos momentos de necessidade que passou. Espero que este reconhecimento ainda exista", ressalta Maria Auxiliadora, recordando o episódio
em que o marido decidiu colocar o Memorial da História Vicentina, a série de quadros, à venda para chamar a atenção da sociedade.
De acordo com ela, em fevereiro de 2001, Fabra percebeu que estava com sérios
problemas de saúde e ficou preocupado com o futuro da família. "Por uma questão política, ele perdeu o emprego na Secretaria de Cultura e nós
estávamos com muitas dificuldades financeiras. Por isso, resolveu anunciar que venderia os quadros".
Convocação popular para um ato público, na então Vila
de São Vicente, por Carlos Fabra
Imagem divulgada na Internet pela página Web oficial da Prefeitura Municipal de São Vicente
Município adquiriu as obras
Ao saber da disposição de Carlos Fabra de vender o Memorial da História Vicentina,
a série de quadros, o prefeito Márcio França adquiriu a obra histórica para o Município, por cerca de R$ 30 mil, por meio de uma parceria com um
empresário. "Com o dinheiro, compramos esta casa e guardamos o restante, para nos mantermos. Mas logo os problemas voltaram".
Enquanto as pinturas de Fabra ganharam destaque no Instituto Histórico e Geográfico de
São Vicente (IHGSV), seu autor caminhou para uma situação cada vez mais grave. "Bastante doente, ele não tinha sequer uma alimentação adequada. Até
para transportá-lo para o hospital, nos momentos de crise, foi complicado. Para piorar, não conseguimos um lugar para fazer a quimioterapia", conta
Maria.
Ela faz questão de salientar que o presidente do IHGSV, Fernando Martins Lichti, foi
uma das poucas pessoas que ajudaram o marido até o último instante, abrindo espaço para Fabra ensinar história e arte no instituto. "Ele formou uma
geração de pintores, escultores e pesquisadores".
Com orgulho, Maria mostra a Medalha de Grande Mérito Cultural que Fabra recebeu do
IHGSV, um mês antes de falecer. Na residência, ela ainda guarda algumas pinturas e esculturas do marido, incluindo o único quadro que ele fez sobre
Praia Grande, em 1995, mostrando a pesca de arrastão com parelha de bois.
"Não recebe nenhuma pensão. Como ele era uruguaio, teve problemas para reunir a
documentação e não conseguiu se aposentar. Estamos desamparados", diz. Se alguém estiver interessado em conhecer o material escrito por Fabra, pode
entrar em contato pelo telefone 3477-2885. O Memorial da História Vicentina pode ser visto no IHGSV, que fica na Rua Frei Gaspar, 280, no
Centro de São Vicente.
Reunião da Primeira Câmara das Américas, por
Carlos Fabra
Imagem divulgada na Internet pela página Web oficial da Prefeitura Municipal de São Vicente
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