O porto e a cidade de Tonsberg estão localizados na costa meridional, na entrada do Golfo de Oslo (Oslofjord), a cerca de 60 quilômetros a Sudoeste da capital da Noruega. Fundada
pelos vikings, há 3 mil anos, é a mais antiga povoação norueguesa. Foi nesse porto, de grande tradição marítima, que surgiu, em outubro de 1861, a firma Wilh. Wilhelmsen, criada por Abraham Wilhelmsen e seu filho Mort
Wilhelm, com a finalidade de prestar serviços de corretagem e fornecimento marítimo. A partir de 1865, Wilhelm Wilhelmsen tornou-se proprietário, em sociedade, de duas escunas de madeira e, 20 anos
mais tarde, em 1886, a sua empresa controlava 11 veleiros, utilizados sobretudo para a exportação de madeira de lei produzida nas regiões próximas a Tonsberg.
Nesse mesmo ano de 1886, Halfdan Wilhelmsen, filho de Wilhelm, entrou para a firma-família, depois de completar seus estudos em Oslo. O jovem, de excepcional talento para os negócios marítimos, talento este que
propulsionaria a empresa WW (tal como ficara conhecida) a altos níveis.
A todo vapor - Uma das primeiras iniciativas de Halfdan foi a de adquirir, apesar da oposição paterna, o primeiro vapor da armadora - possuidora, até então, somente de navios-veleiros.
Este cargueiro havia sido construído em 1881, na Inglaterra, com o nome de Talabot, e, no decorrer de 1887, sua utilização permitiu a realização de lucros três vezes superior a seu custo.
Halfdan havia iniciado sua carreira com o pé direito, literalmente, trazendo, com a compra do Talabot, a nova era do navio a vapor para o cenário de shipping norueguês.
Com esse mesmo navio, surgiu, em sinal de boa sorte, o hábito de dar aos navios da frota WW nomes diversos, que se iniciavam sempre com a letra "T", e o slogan que acompanhou a
evolução da armadora já então era bem significativo da vontade férrea de Halfdan Wilhelmsen: "Full steam ahead", ou seja, "A todo vapor".
Novo serviço - Quando Wilhelm Wilhelmsen faleceu, em 1910, a WW havia se tornado grande empresa marítima, possuindo uma frota de 32 vapores de carga, representando cerca de 160 mil
toneladas de peso morto - cargueiros até então utilizados quase exclusivamente no tramp trading, isto é, sem rotas ou linhas regulares.
Foi somente a partir do ano seguinte que a WW entrou no serviço de linhas, associando-se com outra armadora norueguesa, a Fearnley & Eger, para a criação da Norwegian Africa & Australia
Line (Naal).
A eclosão da Primeira Guerra Mundial trouxe outra grande oportunidade de expansão. Aproveitando a neutralidade da Noruega no conflito, a WW fundou, em novembro de 1916, uma subsidiária, a
Wilhelmsen Steamship Lines, destinada a oferecer navios com saídas regulares entre os Estados Unidos, o Brasil e os países do Prata, no assim denominado cross trade.
A partir de 1917, a Wilhelmsen Steamship iniciou suas operações no serviço de linha entre as costas Leste da América do Norte e do Sul, linha esta que ligava Nova Iorque a Buenos Aires,
via escalas em portos intermediários no Brasil, principalmente Rio de Janeiro e Santos.
Neste serviço, exclusivamente de carga, foram utilizados cerca de 30 vapores em diferentes épocas, entre 1917 e 1947, trinta anos exatos de duração desta linha. Nela serviram alguns cargueiros de construção
anterior à Primeira Guerra Mundial, como, por exemplo, o Sark (de 1903), o Jethow e o Herm (ambos de 1905), o Taurus, o Tabor (também 1905) e o Trafalgar (de 1906).
Diesel - Em fins de 1919, a WW passou a ordenar a construção de uma série de navios movidos a óleo diesel (ao invés de carvão). Entre 1921 e 1924, foram completadas e entregues 11
unidades destinadas a substituir tonelagem mais antiga movida a vapor.
A primeira destas unidades recebeu o nome de America, entrando em serviço em setembro de 1921. Seguiram-se, por ordem de entrega, o Teneriffa, o Thalatta, o Tiradentes, o Tennessee,
o Titania, o Talisman, o Tortugas, o Taiwan, o Tungsha e o Tourcoing.
A política de renovação da frota não ficou só nestes navios, já que, de 1924 a 1939, nada menos do que outros 40 cargueiros seriam encomendados e construídos para a Wilhelmsen, todos
levando a letra "T" como inicial de seus nomes.
A embarcação foi construída pelo estaleiro Deutsche Werft, do porto de Hamburgo, na Alemanha
Quadrigêmeos - Da série de 11 navios entregues de 1921 a 1924, quatro nos interessam de mais perto, já que eram navios gêmeos, construídos no mesmo estaleiro da Deutsche Werft, de Hamburgo: Tiradentes,
Titania, Talisman e Tampa.
Estes quatro cargueiros só se diferenciavam por detalhes de acabamento e pequenas diferenças em suas tonelagens. Todos serviram a linha sul-americana a partir de Nova Iorque.
Possuíam maquinário de propulsão composto de dois motores a óleo combustível com seis cilindros cada um, construídos pela empresa AEG, de Berlim, ligados a dois hélices. Nos dois primeiros navios mencionados haviam
sido instaladas algumas cabinas para passageiros, o número destes não indo além de um máximo de 10. Cada navio dispunha de cinco grandes porões de carga, alguns dos quais eram refrigerados.
O Tiradentes e o Tampa sobreviveriam ao conflito, o primeiro sendo vendido pela WW em 1950 e demolido em 1956. O segundo, apreendido pelos alemães em 1940, foi recuperado no
fim da guerra e vendido a armadores gregos em 1958. Terminaria sua vida útil em 1959, naufragando no Oceano Índico.
O Titania permaneceu a serviço da WW até 1937, ano em que foi revendido a outra armadora norueguesa ao mesmo tempo que o Talisman. O Titania terminou seus dias em
junho de 1931, sob o nome de Vigeid, torpedeado pelo submarino U-371, quando realizava viagem entre Nova Orleans e Manchester.
Acidente - Em janeiro de 1935, ao iniciar mais uma de suas rotineiras viagens entre Nova Iorque e Buenos Aires, o Talisman foi protagonista de um grave acidente marítimo com o paquete costeiro de
passageiros Mohawk, de bandeira norte-americana, pertencente à Agwilines.
O Mohawk e o Talisman haviam zarpado quase que contemporaneamente do porto novaiorquino ambos com rumo Sul, o primeiro levando a bordo 53 passageiros e 110 tripulantes e o segundo, tão somente carga.
Às 21h30 do dia 24, a cerca de quatro milhas (7,4 quilômetros) ao largo da costa de Nova Jérsei, os dois vapores entraram em colisão a pleno regime de velocidade. O choque da proa do Talisman no costado de
bombordo do Mohawk abriu larga brecha neste último, e desde logo ficou claro que o navio afundaria, conseqüentemente.
Apesar disso, em um último desesperado esforço, seu capitão, o comandante Wood, tentou levar o paquete a encalhar em uma praia próxima - não conseguindo, porém, este intento.
Dada a ordem de abandono, os tripulantes do Mohawk tiveram grande dificuldade para lançar ao mar os botes salva-vidas, já que reinava intenso frio, que havia congelado e emperrado os mecanismos de
lançamento. Em menos de uma hora, o Mohawk foi a pique, salvando-se no total 118 pessoas, 45 outras perecendo no desastre.
O cargueiro norueguês, seriamente avariado na proa, retornou a Nova Iorque, onde, nos dias subseqüentes, seu comandante, Wang, prestou declarações à Comissão Marítima de Inquérito, afirmando que o Mohawk,
que navegava em direção paralela ao seu navio, bruscamente e sem nenhuma advertência, viera a se colocar de través - sendo, então, colhido pela proa do Talisman, que lhe penetrou o costado.
Wang declarou também que, embora fosse noite fria, a visibilidade era perfeita e a única explicação para a mudança repentina de rumo do navio americano seria a ruptura do leme, que já fora objeto de reparos antes
da saída do Mohawk de Nova Iorque. A comissão acabou acatando esta hipótese como razão e causa do acidente.
Após sofrer os devidos reparos por cerca de um mês, o Talisman voltou à linha para a América do Sul. No ano seguinte, a Wilhelmsen decidiu, portanto, se desfazer do navio e o
colocou à venda, substituindo-o por um novo Talisman, construído em 1937. A melhor oferta proveio de outra armadora norueguesa, a Bruun-Lippe Rederi, que o adquiriu pela soma de 3,5 milhões de coroas, dando-lhe o novo nome de Vigilant.
Poucos meses depois, o navio foi novamente negociado, sendo comprado pela empresa Skibs, do porto de Gdynia, que o utilizou até 1940, com o mesmo nome.
Segunda Guerra - Após a invasão da Noruega pelas tropas do III Reich, o vapor, rebatizado Ringstad, passou a ser utilizado sob controle das autoridades marítimas britânicas, levando, porém, bandeira
norueguesa e prestando serviços em diversas rotas no Atlântico Norte, até ser afundado por torpedeamento em janeiro de 1942.
Em meados desse mês, o Ringstad (ex-Talisman) havia saído de Cardiff com um carregamento de 2.600 toneladas de porcelana, destinadas a Nova Iorque, com 37 tripulantes e seis passageiros a bordo.
Ao largo da costa escocesa, o navio juntou-se ao comboio ONS 55, iniciais que denotavam um comboio de velocidade lenta, destinado a cruzar o Atlântico Norte de Leste para Oeste, navegando em rota bem setentrional e
tendo Halifax (Nova Escócia) como destino.
No início da tarde do dia 24 desse mês, o comboio foi atacado pelo U-333, do comandante Peter Cremer, em um ponto a Noroeste do Cabo Race (Terra Nova, Canadá), nas coordenadas 45º 50' Norte de longitude e
51º 04' Oeste de longitude, ataque do qual resultou a perda do Ringstad e de 30 pessoas (27 tripulantes e três passageiros) que se encontravam a bordo.
O U-333 era um submarino novo, comissionado em agosto do ano precedente, do tipo VII C e que realizava sua primeira patrulha de guerra. Havia zarpado de Kiel, em 27 de dezembro, para as águas do Atlântico
Norte. Antes de atingir o Ringstad, Cremer já havia posto a pique três outros vapores.
"Fogo amigo" - Uma semana após o sucesso do Ringstad, Cremer afundou, sem o saber, um navio de seu próprio país, o cargueiro alemão Spreewald, que, como furador de bloqueio, tentava retornar à
Alemanha, após longo périplo através dos oceanos Pacífico, Índico e Atlântico.
O Spreewald levava em seus porões um carregamento importante de borracha, quinino, tungstênio e 300 homens de tripulação de navios capturados pelo corsário Kormoran em seu cruzeiro de guerra.
Após o torpedeamento do Spreewald e a constatação do erro, foi organizada uma enorme operação de salvamento dos náufragos, operação essa que envolveu nove submarinos durante cinco dias. Graças a ela, a
grande maioria dos que se encontravam a bordo do Spreewald puderam ser salvos. |