Engenharia
Enfim, a Torre
da Liberdade
Edifício será
o mais alto dos EUA
Carlos Pimentel Mendes (*)
Talvez
nenhum outro prédio no planeta tenha recebido tantos palpites em
seu projeto, na forma de construí-lo, até quanto à
necessidade de criá-lo. Antes mesmo de ser colocada a primeira pedra,
mais de 700 brochuras com análises foram preparadas, concursos internacionais
foram realizados, o tema foi debatido na imprensa mundial e em incontáveis
reuniões com a população local, páginas na
Internet e correspondência eletrônica. Inúmeras vezes
os conceitos foram revistos e reformulados, para conciliar a vontade de
criar um marco em memória da tragédia ali ocorrida com o
desejo de aproveitar o espaço comercial mais valorizado da Terra.
Justifica-se tanta celeuma: estava
e está em jogo a própria identidade e soberania de um país,
cuja simbólica águia estava encolhida, abatida em pleno vôo,
num trágico 11 de setembro de 2001. Naquele momento, outro símbolo
tão caro aos estadunidenses, a liberdade, foi duramente atingido,
com seguidas violações aos direitos individuais e coletivos
em nome do combate ao terrorismo, atropelando o próprio conceito
de democracia e a base de toda a legislação dos EUA.
Fazer uma praça, local de
culto ao passado? Seria reconhecer a impotência do Golias perante
os Davis e seus aviões-bomba. Reconstruir simplesmente as torres
gêmeas? Seria um gesto de conformismo ante o grande prejuízo
humano e material sofrido.
Era preciso algo mais: uma obra que
concilie passado e futuro e permita conjurar os fantasmas que rondam o
local e as mentes das pessoas, um ícone e ao mesmo tempo um ponto
de integração das diferentes atividades urbanas (finanças,
turismo, lazer, comércio, transportes). Que sirva de base para a
águia voltar a voar. Em liberdade.
"Elevar os espíritos e restaurar
a paisagem", na definição dos responsáveis pela reconstrução
do centro de New York, são os objetivos da Torre da Liberdade, que
começa agora a ser erguida, para ser um testemunho da resistência
e uma parte importante do memorial pelos heróis do World Trade Center,
que em 2001 se havia transformado no Ground Zero, o ponto zero, o centro
do terremoto que abalou as convicções de invencibilidade
e segurança dos estadunidenses.
A construção do prédio
deve gerar US$ 15 bilhões em movimentação econômica
em New York, representando em média uns 8 mil postos de trabalho
ao ano durante 13 anos. Além do espaço para escritórios,
o edifício compreende áreas abertas, observatórios,
restaurantes de classe internacional, acessos ao centro comercial e financeiro
e à estação do metrô.
Início de construção:
primeiro trimestre de 2006. A estrutura metálica começa a
aparecer em 2007 e atinge o topo em 2009. O edifício deve ser inaugurado
em 2010. Seu nome: Torre da Liberdade.
Ícone – "Se eles odeiam
nossos prédios, vamos reconstruí-los aqui; se eles odeiam
nossa prosperidade, vamos prosperar aqui; se eles odeiam nossa cultura,
vamos celebrá-la aqui; se eles odeiam nossas vidas, vamos vivê-las
aqui", disse o professor James Young, da Universidade de Massachussets,
no artigo "Celebrando vida com vida", a respeito desse prédio, que
embora tendo concepção modernista, remete às tradições
arquitetônicas novaiorquinas, como a imponência monumental
(refletida em edificações como o Empire State e os edifícios
Crysler e Woolworth).
Refletida é bem a palavra,
pois o cubo de base tem lados com 64,8 x 64,8 metros (200 x 200 pés),
lembrando a área que era ocupada pelas torres gêmeas destruídas
em 2001. Mistura de aço inoxidável e titânio, deverá
brilhar e refletir dinamicamente a luz, em tons cambiantes de acordo com
o clima e as estações, o que lhe dará ao mesmo tempo
uma grande leveza e fluidez de formas.
Dos cantos chanfrados dessa base
surgirão oito triângulos isósceles que, vistos de cima,
formarão um octágono perfeito. A partir da base, elevam-se
69 andares de escritórios, atingindo a altura de 1.120 pés
(362,88 m). O prédio se completa com observatório e parapeito
em vidro, nas alturas de 1.362 pés (441,29 m) e 1.368 pés
(443,23 m), as alturas das torres gêmeas originais. Outros pisos
e um mastro com a antena da Manhattan Television Alliance (MTVA) - que
ali terá seus retransmissores) completam a altura final da obra,
atingindo 1.776 pés (575,42 m). Esse mastro, criado por um grupo
de arquitetos, artistas, projetistas de iluminação e engenheiros,
e fixado por um sistema de cabos, nasce de um anel de suporte circular,
similar à tocha da Estátua da Liberdade. Aliás, a
composição inteira evoca a Estátua da Liberdade e
deve emitir luz, possuindo seu próprio Farol da Liberdade.
A robustez da obra é assegurada
por uma combinação de vigas e colunas ligadas por uma combinação
de soldas e cavilhas, resistindo a cargas laterais através da inclinação
dos elementos do quadro. Completado com um núcleo de concreto, deverá
conferir substancial rigidez e redundância a toda a estrutura do
prédio, ao mesmo tempo em que provê um interior livre de colunas
para oferecer a máxima flexibilidade.
Generosos espaços abertos,
preenchidos com árvores, conectam a obra às ruas vizinhas
e dão acesso ao Memorial da Liberdade. Enquanto o memorial evoca
o passado e as lembranças, a torre representa o futuro e as esperanças,
elevando-se ao céu numa estrutura facetada de formas cristalinas,
que refletem a luz. O conjunto evoca ainda as tradições arquitetônicas
novaiorquinas de elegância e simetria, além de recuperar um
quarto do total de áreas para escritórios anteriormente existentes
naquele local.
A torre deve representar um novo
marco tecnológico mundial em eficiência e conservação
energética e suporte ambiental, destacando-se que a reciclagem e
a reutilização de materiais construtivos contribuirão
para a preservação ambiental. Vidros de alta transparência
manterão a luz diurna no interior das instalações;
a qualidade do ar no interior do edifício será preservada
pelo emprego de materiais construtivos não tóxicos, evitando-se
o uso de componentes orgânicos voláteis; haverá economia
de água pela reutilização de águas pluviais
nos sistemas de refrigeração e irrigação; serão
empregados recursos para co-geração de energia eólica
e a partir de células fotoelétricas, bem como equipamentos
que permitam reduzir a demanda de energia.
Prevê-se a redução
no tráfego de veículos pela proximidade dos meios de transporte
e integração com ciclovias. Até os motores dos equipamentos
usados na construção do prédio serão regulados
para consumo de combustível com baixo teor de enxofre, para reduzir
a emissão de poluentes.
Segurança – Mesmo incorporando
requisitos sem precedentes de segurança, criando um novo padrão
que excede o previsto nas já rígidas posturas municipais
novaiorquinas, o prédio deverá se manter aberto e acessível,
com entradas pelos quatro lados. Além da redundância estrutural
e dos robustos padrões construtivos à prova de fogo, o prédio
terá filtros biológicos e químicos no sistema de suprimento
de ar. Para garantir essas capacidades, terá proteção
para todos os sistemas anti-incêndio, escadas com ar pressurizado,
iluminação de emergência, saídas de emergência
redundantes e interconectadas para todas as ruas vizinhas, e todos os sistemas
de segurança (escadas, comunicações, elevadores, sprinklers
etc.) estarão encaixados em um muro central que chega a ter quase
um metro de espessura em vários lugares.
O prédio foi planejado para
facilitar o atendimento de emergência com robustos cabos de comunicação,
uma escada especialmente projetada para uso pelos bombeiros, poderosos
elevadores montados em um núcleo central do prédio que serve
a cada andar do prédio. Além disso, "áreas de refúgio"
serão criadas em cada andar. Para satisfazer requisitos de segurança,
a obra teve aumentada em um terço a sua distância desde a
Rua Oeste (rota 9a), para 29,16 metros (90 pés).
Equipe - Inúmeros especialistas
e empresas estão envolvidos na obra, destacando-se: como desenvolvedor
e proprietário, World Trade Center Properties, LLC (uma subsidiária
de Silverstein Properties, Inc); como arrendatário, a autoridade
portuária de New York e New Jersey; planejamento para a reconstrução
da área de Baixa Manhattan, pela Lower Manhattan Development
Corporation; arquitetos, Skidmore, Owings & Merrill, LLP; gerentes
de construção, Tishman Construction Corporation; engenheiros
estruturais, Cantor Seinuk Group; engenheiros MEP, Jaros Baum & Bolles,
Inc.; consultores de sustentação ambiental, Jaros Baum &
Bolles, Inc. e GreenOrder; planejamento de iluminação por
Claude R. Engle; engenharia civil e de transportes, Philip Habib &
Associates; arquitetos paisagistas, Peter Walker Partners; segurança,
Ducibella, Venter & Santore e Weidlinger Associates; acústica,
Cerami & Associates; transporte vertical, Jaros Baum & Bolles,
Inc.; engenheiros geotécnicos, Mueser Rutledge Consulting Engineers;
testes em túnel de vento por Rowan Williams Davies & Irwin Inc.
(*) Carlos
Pimentel Mendes é jornalista, editor do jornal eletrônico
Novo Milênio
Imagens
desta página: O projeto
da Torre da Liberdade: simulações de sua implantação
no local e na paisagem
de New York Imagens por
Skidmore, Owings & Merrill
|