MEIO-AMBIENTE
Progresso ambiental
Palavras não são
opostas, e o tema ambiental não é questão, é
solução
Carlos Pimentel Mendes (*)
Na antológica
história, o primeiro vendedor de calçados que chegou àquela
terra onde todos estavam descalços viu um problema: não venderia
nada, pois ninguém ali usava sapatos. O outro viu ali uma fantástica
oportunidade: ninguém ainda usava sapatos... Transplantando
a história para a temática ambiental, pode-se avaliar como
- a cada dia - crescem as oportunidades de trabalho e negócios relacionadas
ao que até agora se costumava chamar de "questão" ambiental.
Pois o cuidado com o meio-ambiente não é um problema, é
uma fonte de oportunidades. E a crescente preocupação mundial
com o assunto está alavancando uma série enorme de atividades
que menos de uma década atrás nem seriam viáveis por
falta de clientes ou consumidores.
Harmonia
entre o homem e o meio-ambiente...Foto: divulgação
Desde o surgimento da Lei Federal
6.938, de 31 de agosto de 1981 (que estabeleceu a Política Nacional
do Meio-Ambiente), a legislação ambiental é cada vez
mais complexa, tanto em termos locais, com as posturas dos códigos
de obras e de uso do solo, que variam de município para município,
como passando pelas decisões em nível metropolitano e estadual,
pelas leis federais e chegando às convenções internacionais.
E ainda pelas normas específicas que estão sendo elaboradas
para cada setor da atividade humana, em todos os níveis de autoridade.
Esse cipoal normativo - que já
merecia uma consolidação e revisão, até por
existirem normas discordantes entre si, ou mal formuladas e ambíguas,
ou desatualizadas - abre um imenso campo de trabalho para advogados em
geral, consultores e especialistas. Sobrando espaço para os profissionais
da informação, que podem criar boletins e sites Web que reunam
toda essa gama de informações, promovam sua interpretação
e crítica.
Para não falar na defesa dos
direitos dos consumidores, que implicará em trabalho até
para especialistas em idiomas, que acabarão sendo chamados a opinar
sobre a conveniência e precisão de determinadas palavras usadas
nas embalagens, bulas e manuais, em nome da transparência que deveria
reger as relações entre produtores e consumidores de bens
e serviços...
Ainda no campo dos serviços,
há espaço para médicos e veterinários em geral
(capazes de analisar efeitos passados, presentes e futuros das alterações
ambientais sobre os seres humanos e os animais); para os botânicos,
biólogos e profissionais de áreas afins, que possam verificar
as alterações no habitat e seus efeitos sobre as espécies
analisadas; para especialistas em confecção de relatórios
e estudos de impacto ambiental; geólogos podem opinar sobre como
os solos e subsolos serão impactados pelas obras projetadas e como
evitar efeitos danosos das mesmas aos terrenos, cursos d’água e
correntes marinhas e/ou aéreas; geógrafos serão cada
vez mais chamados a se posicionar sobre alterações em cursos
naturais (de rios, geleiras, águas pluviais), cortes em montanhas,
quebra-mares e instalações portuárias etc.
Até os contadores ganham novas
funções, pois as empresas agora têm de fazer, além
do balanço contábil, também o balanço social,
contabilizando os ativos e passivos ambientais e sociais. Precisam quantificar
esses patrimônios e débitos, obtendo um diagnóstico
de sua atuação com base nas mesmas regras de ativos e passivos
que regem a contabilidade tradicional.
...deve
estar associada ao progresso sócio-econômico e a oportunidades
de negócios Foto: divulgação
Créditos ambientais
- Daí, abre-se mais um campo de trabalho: para os compradores e
vendedores de créditos ambientais, tanto em nível empresarial
como no governamental. Se os consumidores cada vez mais rejeitam produtos
de empresas com grande passivo ambiental e social, elas têm de providenciar
soluções nessa área. Que nem sempre são simples
como a instalação de um novo filtro de ar. Em certos casos,
a partir das convenções internacionais que vêm surgindo,
como o Protocolo de Kyoto, as empresas precisariam se reinventar, o que
em certos casos é economicamente inviável.
Para tais casos, surge uma nova modalidade
de negociação, que é a compra ou venda de créditos
ambientais. Uma empresa poluidora pode fazer a compensação
desse passivo com a compra do ativo de organizações que atuam
"limpando" o ambiente, ou cujos processos produtivos contribuam significativamente
para a melhora ecológica do planeta. Essa compra de créditos
pode ser também por meio de financiamento de projetos na área
ambiental realizados em outros países. Cabe ao negociador localizar
as oportunidades mais favoráveis, tanto de compra como de
venda.
Controle
na derrubada de florestas ampliará o mercado de madeira certificada. E ampliará
o mercado de trabalho para os certificadores dessa madeira Foto: divulgação
Novas empresas - Novas oportunidades
também podem ser vislumbradas quando se lembra que as convenções
marítimas e aéreas internacionais controlam cada vez mais
severamente a destinação dos resíduos de navios e
aviões: restos de combustíveis, água de lastro, lixo
de bordo, esgoto sanitário, lavagem de tanques. Empresas especializadas,
antenadas com as novas exigências, terão de ser criadas e
contratadas para a execução desses trabalhos.
Se a normatização internacional
considera até o impacto ambiental das tintas usadas no casco das
embarcações e nos conteineres, das emanações
de gases e vapores, e exige o controle de insetos e bactérias que
são transportados pelos veículos de carga terrestres, marítimos
e aéreos (devido à possibilidade de propagação
de doenças e pragas), há espaço cada vez mais amplo
para a atuação de empresas especializadas em desinfecção
desses veículos, na filtragem dos vapores, na inspeção
das cargas.
Uma vez que a rapidez nos transportes
internacionais facilita a locomoção de pessoas e a conseqüente
propagação de doenças muitas vezes desconhecidas,
ou para as quais certas regiões do mundo não estejam preparadas
sequer para reconhecer os sintomas, faltam especialistas atualizados e
equipamentos sofisticados que permitam detectar focos de problemas médicos
e sanitários com a rapidez necessária para que sejam circunscritos
e providenciado o tratamento e a vacinação adequada.
A chegada dos produtos geneticamente
modificados, já uma realidade indiscutível em todo o mundo,
representa campo de trabalho para nutricionistas, químicos, agrônomos
e outros profissionais, aptos a controlar a miscigenação
entre culturas de produtos com genes alterados e os já existentes
na Natureza. E, novamente, advogados, médicos e muitos outros profissionais
serão chamados a acompanhar os efeitos dessas mudanças e
opinar sobre as alterações já feitas e outras que
serão introduzidas.
E, por fim, abre-se também
o campo para os legisladores ambientais, que terão trabalho redobrado
na elaboração e atualização contínua
de normas cada vez mais detalhadas e específicas, no debate sobre
as penalidades a serem aplicadas, nos ajustes das normas menores para compatibilizá-las
com as leis hierarquicamente superiores e as convenções internacionais.
Abrindo em conseqüência novas opções de trabalho
e fechando este ciclo com a volta ao início desta matéria...
(*) Carlos
Pimentel Mendes é jornalista, editor do jornal eletrônico
Novo
Milênio.
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