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Edição 140 - Mai/2005
INCLUSÃO URBANA 

Acessibilidade é a chave para 25 milhões de brasileiros

Essa preocupação pode criar um diferencial com grande poder de atração turística

Carlos Pimentel Mendes (*)

Cerca de 10% da população dos países em desenvolvimento porta algum tipo de deficiência, segundo a Organização das Nações Unidas. No Brasil, dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam um contingente de 25 milhões de pessoas nesta situação: 15% da população. São pessoas às quais é necessário garantir o direito de locomoção com autonomia e independência, permitindo seu fortalecimento social, político e econômico, como cidadãos plenos que também são. E isso passa pelo planejamento das edificações, da sinalização do trânsito, das calçadas, dos veículos de transporte urbano e outros equipamentos das cidades.

Ao mesmo tempo em que cresce a preocupação em atender, com instalações adequadas, todo esse importante contingente da população, surgem também produtos e serviços especiais, como as rampas em calçadas pré-produzidas e pisos intertravados de concreto, apresentados em recentes exposições pela Associação Brasileira de Cimento Portland (ABCP), que lembra inclusive a possibilidade de incremento ao turismo em cidades preparadas para receber visitantes com necessidades especiais.


Calçada com marcação podo-táctil, apresentada em recente exposição da ABCP
Foto: Sandra Mello

Nessa questão, não basta apenas boa vontade, é necessário reunir conhecimentos que permitam o correto planejamento dos acessos. Por exemplo, nos cálculos para um corredor de circulação, deve-se lembrar que um idoso com bengala ocupa cerca de 75 cm de largura; uma cadeira de rodas, incluindo o espaço lateral para as mãos, precisa de 0,80 cm (porém, requer espaço extra para o movimento); uma pessoa que use equipamento auxiliar andador requer largura mínima de 0,85 cm; já um jovem acidentado com muletas precisa de 0,95 cm. Em suma, e considerando até mesmo os usuários da bengala branca, uma boa referência de largura para corredores, rampas e portas é 1,20 m.

Os projetistas e construtores também devem ter em mente que as rampas de acesso não devem ter inclinação transversal maior que 2% e declividade máxima de 7%. Pessoas em cadeiras de rodas, os chamados cadeirantes, têm limitações de alcance de objetos com as mãos, o que significa que telefones públicos, interruptores, balcões e janelas devem levar isso em consideração no seu planejamento e na instalação. Os estacionamentos devem incluir vagas para veículos conduzidos ou conduzindo pessoas com mobilidade reduzida e/ou portadoras de deficiências. A ligação externa das edificações com as ruas e com edifícios vizinhos/anexos de uso comum também deve ser planejada levando em conta essas necessidades especiais. É preciso criar também áreas de rotação, para que os usuários de cadeiras de rodas efetuem manobras. 

Até mesmo carpetes e capachos espessos devem ser evitados, pois prejudicam a movimentação dessas pessoas. Elevadores devem ter sinalização tátil e sonora, inclusive com a informação sobre o andar em que se encontram. E a sinalização visual deve seguir um padrão internacional, de fácil reconhecimento.

Nos banheiros, não basta a presença de portas largas, é preciso que seu interior permita uma área de giro para as cadeiras e rodas, as saboneteiras estejam em altura adequada, existam barras de apoio feitas de material resistente e em altura apropriada (inclusive junto a bebedouros).

Em locais de reunião, como teatros e cinemas, é preciso evitar a discriminação dos portadores de deficiências, resistindo por exemplo à tentação de reservar a eles os piores lugares na platéia. Espaços para cadeiras de rodas ou poltronas para obesos devem ser integradas aos demais assentos, com as mesmas condições de conforto e visibilidade oferecidas ao restante do público, seguindo os princípios básicos do Desenho Universal, como lembra o Guia de Acessibilidade em Edificações, da capital paulista (veja quadro).


Calçada com diferenças de cor e textura, apresentada em recente exposição da ABCP
Foto: Sandra Mello

Ir... e vir - A autonomia de locomoção pressupõe a existência de condições para um deslocamento completo, da origem ao destino desejado. Isso quer dizer que não basta a alguém residir num prédio especialmente equipado com todas as comodidades para portadores de deficiências (alô, construtores, eis um bom apelo mercadológico que ainda não usaram...), é preciso que essa pessoa, chegando à rua, possa continuar seu caminho, apoiada por equipamentos públicos como indicadores sonoros e sinalizadores táteis no piso para travessia nas principais vias, calçadas com guia rebaixada em todas as esquinas, adequações em ônibus para o recebimento de cadeirantes etc.

Santos, por exemplo, pode divulgar que tem tudo isso. Ou que não tem nada disso, conforme quem analisa. Por exemplo, vários ônibus possuem as plataformas elevatórias para cadeirantes. Mas são raros, e mais raro ainda é que funcionem, tanto que nem se pode contar com eles, a não ser que o Ministério Público, já acionado, consiga fazer a Piracicabana corrigir o problema (a empresa, como em tudo o que se refere às suas atividades de exploração do transporte público regional, prefere apenas negar o óbvio).

Sinalização sonora para deficientes visuais, existe em dois, talvez três locais da Cidade. Número ridículo se considerarmos que precisaria haver em todas as centenas de lugares onde já se concluiu pela necessidade de semáforos.

Até mesmo uma coisa simples, já reclamada em telenovelas, como a instalação de um piso diferenciado ao redor dos telefones públicos orelhões e outros equipamentos do tipo existentes nas calçadas, não há sequer um exemplo que permita a alguém afirmar que isso existe na Baixada Santista. Quantos portadores de bengalas brancas já não descobriram, batendo a cabeça, a presença de orelhões que as bengalas não sinalizaram? O mesmo vale para a passagem sob escadarias: é preciso criar elementos (um pequeno jardim, por exemplo), sob as escadas, para impedir a passagem por locais com altura inferior à recomendada de 2,10 m.

(*) Carlos Pimentel Mendes é jornalista, editor do jornal eletrônicoNovo Milênio.


Rampa em calçada pré-fabricada, apresentada pela ABCP em recente mostra
Foto: Sandra Mello

Desenho Universal

O conceito de "Desenho Universal", criado por uma comissão em Washington, EUA, no ano de 1963, foi inicialmente chamado de "Desenho Livre de Barreiras", por ter seu enfoque voltado à eliminação de barreiras arquitetônicas nos projetos de edifícios, equipamentos e áreas urbanas. Posteriormente, esse conceito evoluiu para a concepção de Desenho Universal, pois passou a considerar não só o projeto, mas principalmente a diversidade humana, de forma a respeitar as diferenças existentes entre as pessoas e a garantir a acessibilidade a todos os componentes do ambiente.

São princípios básicos do Desenho Universal:

1) Acomodar amplamente as diferenças antropométricas, ou seja, permitir que pessoas de diversos padrões (adultos, crianças, idosos etc.) ou em diferentes situações (em pé, sentados etc.) possam interagir sem restrições com o ambiente projetado. Significa estar atento a alguns limites físicos e sensoriais capazes de comprometer a ação e o alcance impostos a pessoas mais baixas, mais altas ou em cadeiras de rodas, por exemplo.
2) Reduzir a quantidade de energia necessária para a utilização de produtos e ambientes. Considerar, enfim, distâncias e espaços, de modo que estes fatores não obriguem o indivíduo a um esforço adicional ou cansaço físico.
3) Adequar ambientes e produtos para que sejam mais compreensíveis, prevendo inclusive as necessidades de pessoas com perdas visuais ou auditivas, criando soluções especiais por meio de cores vibrantes, sinais táteis e sonoros.
4) Integrar produtos e ambientes para que sejam concebidos como sistemas e não como partes isoladas.

Extraído do Guia de Acessibilidade em Edificações, elaborado pela Comissão Permanente de Acessibilidade (CPA) da Prefeitura Municipal de São Paulo, sob a coordenação do secretário executivo Edison Luís Passafaro.