Cidadania
Autonomia municipal
e redução de cadeiras nas Câmaras de Vereadores
José Raimundo da Silva
(*)
O Supremo
Tribunal Federal confirmou a tendência de limitar o número
de vereadores por município. Durante a sessão de julgamento
de 11 de dezembro de 2003, cinco ministros se manifestaram a favor da adoção
de um critério de proporcionalidade para a definição
de um número limite para vereadores, adotando assim a fórmula
de proporcionalidade de autoria do presidente da Corte, ministro Maurício
Corrêa, relator do processo, pela qual os municípios devem
ter um vereador para cada 47.619 habitantes.
Segundo Corrêa, a Constituição
estabelece no artigo 29 que os municípios com até um milhão
de habitantes terão o mínimo de 9 e o máximo de 21
vereadores. Assim, ele dividiu um milhão por 21 para chegar a uma
margem, ou seja, cidades com menos de 47 mil habitantes devem se limitar
a 9 vereadores e as demais seguiriam a proporção estabelecida
por ele.
Apenas dois ministros – Sepúlveda
Pertence e Marco Aurélio Melo – foram contrários a essa fixação
de limites. Atualmente o processo se encontra com o ministro César
Peluzzo, que pediu vistas, mas falta apenas um voto para que o STF bata
o martelo a favor da limitação.
O maior argumento para a limitação
seria a redução dos custos das Câmaras municipais no
Brasil. Em que pese o respeito que temos ao entendimento dos senhores ministros,
ousamos fazer algumas ponderações, entendendo ser um assunto
por demais polêmico.
A Constituição de 1988
elevou o Município a membro da Federação, em seu artigo
1º, dando-lhe autonomia administrativa, financeira e política
(artigo 29, CF). No entanto, cuidou o Legislador de estabelecer parâmetros
para os gastos das Câmaras: total da despesa não pode ultrapassar
certos percentuais, que vão de 5 a 8% relativos ao somatório
da receita tributária (art. 29); a Câmara não poderá
gastar mais de 70% de sua receita com folha de pagamento, incluído
o gasto com o subsídio de seus vereadores, sujeitando o Presidente
a incorrer em crime de responsabilidade em caso de desobediência
ao preceito legal (art. 29ª, parágrafos 1º, 2º e
3º); estabelece critérios para a fixação dos
subsídios dos senhores vereadores, limitando de 20 a 75% do subsídio
pago aos deputados estaduais, dependendo do número de habitantes
(art. 29, inciso 6º, letras "a" a "f"); limita o total de despesa
com a remuneração dos vereadores, que não pode ultrapassar
o montante de 5% da receita do município (art.29, VII, da CF).
Não bastasse o mandamento
constitucional, as Câmaras são ainda fiscalizadas pelos Tribunais
de Contas, que dão parecer final sobre as contas do Legislativo,
aplicando várias sanções, desde multa, passando pela
devolução das importâncias gastas de forma irregular
que causem dano ao erário, até a rejeição das
contas, que causa a inelegibilidade de seus agentes.
Ademais, a Lei de Responsabilidade
Fiscal (LRF) veio trazer mais obrigações no que diz respeito
às finanças das Câmaras: a despesa total com pessoal
não pode ultrapassar 6% da receita corrente liquida do município,
incluindo Tribunal de Contas do Município, quando houver (art. 20,
inciso 3, letra "a"); a despesa com pessoal não pode crescer mais
que dez por cento da despesa realizada no exercício imediatamente
anterior (art. 71); despesa com serviços de terceiros não
poderão exceder em percentual àquela havida em 1999 (art.
72, vigorando até 2002). Vê-se assim que caem por terra
os argumentos quanto à redução de gastos das Câmaras,
visto os parâmetros já estabelecidos em legislação,
tanto constitucional quanto ordinária, que balizam a ação
dos chefes das Casas Legislativas, sujeitando-os, em caso de desobediência,
a penas severas, sendo a maior delas a perda do mandato e a conseqüente
inelegibilidade.
Acreditamos sim que, uma vez estabelecido
pelo Supremo fórmula aritmética para definir o número
de vereadores, estaremos ferindo a autonomia municipal, pois ao estabelecer
parâmetros mínimo e máximo quis o Constituinte deixar
ao município a decisão de fixação do número
de vereadores. Até porque é no município que o cidadão
reside, nasce, cresce, paga seus impostos, trabalha, estuda, constitui
família, torna-se cidadão e participa ativamente dos destinos
da Nação e cabe ao Legislador Municipal aquilatar a importância
e a magnitude da sua comuna e os interesses que a cercam para somente então,
obedecendo à carta Magna, definir o número daqueles que vão
falar e decidir em nome da sua comunidade. É a chamada opção
política.
Por outro lado, uma vez confirmada
a decisão, haverá sem sombra de dúvida uma queda da
representatividade popular, um enfraquecimento dos Legislativos e, o pior,
ficarão mais vulneráveis a pressões externas.
Viva a autonomia municipal.
(*) José
Raimundo da Silva é Vice-Presidente da Associação
dos Advogados de Guarujá e Secretário Geral da Câmara
de Guarujá. |