Opinião
Os riscos dos
mutirões da casa própria
Artur Quaresma Filho (*)
Pressionados
pela crescente demanda habitacional e com recursos limitados para investir,
alguns governantes têm sido tentados a buscar alternativas para viabilizar
a construção da casa própria pelas famílias
de baixa renda. Uma delas é oferecer crédito para a aquisição
de material de construção. Imaginam aqueles administradores
públicos que, com cimento, tijolos e algum material de acabamento,
o cidadão sem posses dará um jeito e construirá sua
casa. Aí há vários enganos. O desperdício de
material é grande. Parte vai para ampliações ou reformas
e não para edificar uma residência. As estatísticas
oficiais erram ao interpretar cada financiamento para material como sendo
uma nova unidade habitacional.
Outro equívoco é tentar
organizar mutirões. Governantes imaginam que mobilizar a população
para construir a casa própria, além de ser mais econômico,
rende votos. É aí que mora o perigo. Exceto em alguns casos
pontuais, os mutirões gastam mal e as moradias acabam saindo mais
dispendiosas do que se tivessem sido feitas dentro dos programas de habitação
popular convencionais.
Isso ocorre porque os governos estabelecem
parcerias com sociedades civis que contratam mão-de-obra de forma
aleatória, muitas vezes informal, adquirindo material de construção
sem acompanhamento técnico e sem poder de negociação.
Os resultados são desastrosos.
Moradias construídas sem qualidade, com grande desperdício
de insumos e erros na edificação exigem reformas precoces
e, não raro, a reconstrução. Materiais fora das normas
técnicas e com preços extorsivos acabam encarecendo os projetos.
O sonho da casa própria transforma-se em pesadelo, que certamente
não renderá votos.
O que parecia barato sai caro, e
não apenas devido à falta de gestão da qualidade que
racionalize a produção e evite o desperdício de material.
Dados oficiais que procuram argumentar
o contrário omitem a renúncia fiscal de tributos, o apoio
logístico do Estado e o estímulo à economia informal.
E não mencionam os acidentes de trabalho decorrentes do uso de mão-de-obra
não qualificada, que fazem o Estado gastar mais com saúde
e aposentadorias precoces. Isso só aumenta o déficit fiscal.
Assim, quando subsidiarem programas de moradia popular, os administradores
públicos necessitam de cuidados redobrados. É equivocado
entregar uma quantia para as prefeituras e imaginar que unidades habitacionais
econômicas e bem construídas estarão de pé em
alguns meses.
Para construir bem, sobretudo nas
regiões metropolitanas em que o déficit habitacional é
mais acentuado, a preferência deve ser pelos programas convencionais.
A Caixa Econômica Federal só financia construtoras que tenham
a certificação do Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade
do Hábitat (PBQP-H). Das licitações da Companhia de
Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), só participam as empresas
certificadas pelo Programa da Qualidade Habitacional do Estado de São
Paulo (Qualihab). Esse potencial não pode ser desperdiçado.
Em casos pontuais, mutirões
de acabamento das edificações podem ser organizados, com
supervisão técnica das construtoras. É factível
montar parcerias entre Caixa Econômica Federal, Banco Nossa Caixa,
CDHU, entidades da construção e associações
de futuros moradores. Mas, se o objetivo for erradicar o déficit
habitacional para valer, com eficiência e sem desperdício
de recursos públicos, não se pode prescindir das licitações
para a construção de conjuntos habitacionais, com o envolvimento
da iniciativa privada especializada do setor.
(*) Artur Quaresma
Filho é presidente do SindusCon-SP. |