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Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 04/09/03 22:05:11
Edição 118 - MAR/2003 

Opinião 

Os riscos dos mutirões da casa própria

Artur Quaresma Filho (*)

Pressionados pela crescente demanda habitacional e com recursos limitados para investir, alguns governantes têm sido tentados a buscar alternativas para viabilizar a construção da casa própria pelas famílias de baixa renda. Uma delas é oferecer crédito para a aquisição de material de construção. Imaginam aqueles administradores públicos que, com cimento, tijolos e algum material de acabamento, o cidadão sem posses dará um jeito e construirá sua casa. Aí há vários enganos. O desperdício de material é grande. Parte vai para ampliações ou reformas e não para edificar uma residência. As estatísticas oficiais erram ao interpretar cada financiamento para material como sendo uma nova unidade habitacional.

Outro equívoco é tentar organizar mutirões. Governantes imaginam que mobilizar a população para construir a casa própria, além de ser mais econômico, rende votos. É aí que mora o perigo. Exceto em alguns casos pontuais, os mutirões gastam mal e as moradias acabam saindo mais dispendiosas do que se tivessem sido feitas dentro dos programas de habitação popular convencionais.

Isso ocorre porque os governos estabelecem parcerias com sociedades civis que contratam mão-de-obra de forma aleatória, muitas vezes informal, adquirindo material de construção sem acompanhamento técnico e sem poder de negociação. 
Os resultados são desastrosos. Moradias construídas sem qualidade, com grande desperdício de insumos e erros na edificação exigem reformas precoces e, não raro, a reconstrução. Materiais fora das normas técnicas e com preços extorsivos acabam encarecendo os projetos. O sonho da casa própria transforma-se em pesadelo, que certamente não renderá votos. 

O que parecia barato sai caro, e não apenas devido à falta de gestão da qualidade que racionalize a produção e evite o desperdício de material. 

Dados oficiais que procuram argumentar o contrário omitem a renúncia fiscal de tributos, o apoio logístico do Estado e o estímulo à economia informal. E não mencionam os acidentes de trabalho decorrentes do uso de mão-de-obra não qualificada, que fazem o Estado gastar mais com saúde e aposentadorias precoces. Isso só aumenta o déficit fiscal. Assim, quando subsidiarem programas de moradia popular, os administradores públicos necessitam de cuidados redobrados. É equivocado entregar uma quantia para as prefeituras e imaginar que unidades habitacionais econômicas e bem construídas estarão de pé em alguns meses.

Para construir bem, sobretudo nas regiões metropolitanas em que o déficit habitacional é mais acentuado, a preferência deve ser pelos programas convencionais. A Caixa Econômica Federal só financia construtoras que tenham a certificação do Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade do Hábitat (PBQP-H). Das licitações da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), só participam as empresas certificadas pelo Programa da Qualidade Habitacional do Estado de São Paulo (Qualihab). Esse potencial não pode ser desperdiçado.

Em casos pontuais, mutirões de acabamento das edificações podem ser organizados, com supervisão técnica das construtoras. É factível montar parcerias entre Caixa Econômica Federal, Banco Nossa Caixa, CDHU, entidades da construção e associações de futuros moradores. Mas, se o objetivo for erradicar o déficit habitacional para valer, com eficiência e sem desperdício de recursos públicos, não se pode prescindir das licitações para a construção de conjuntos habitacionais, com o envolvimento da iniciativa privada especializada do setor. 

(*) Artur Quaresma Filho é presidente do SindusCon-SP.