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Edição 116 - JAN/2003 

Metrópole 

Em busca da união

Aproveitar as diferenças para alavancar negócios

Carlos Pimentel Mendes (*)

Sugeriu um político que em vez de se comemorar os aniversários das divisões administrativas, que formaram as cidades da região, recentes, fosse comemorado em bloco o aniversário da Baixada Santista, destacando assim que cerca de 500 anos de História do Brasil se passaram nesta região - pois mesmo antes da chegada de Martim Afonso para constituir a cellula mater da nacionalidade, já existiam comprovadamente na região os indígenas e mesmo o famoso Bacharel de Cananéia. 

Praias de Santos, com os belos jardins: citados no Livro dos Recordes
Praias de Santos, com os belos jardins: citados no Livro dos Recordes
(foto: Secom/Prefeitura Municipal de Santos)

Assim posta, a idéia foi logo descartada, pois chega a ser inimaginável nos dias atuais fazer uma festa metropolitana, quando nem nas questões mais básicas - como a recente polêmica do lixo urbano - se consegue um acordo político para resolver problemas que atingem a todos.

Mas, há outro aspecto da questão que não preocupou ao autor da sugestão. Voltemos então cinco séculos aos tempos em que os núcleos urbanos, mesmo entremeados por vastos matagais e áreas lodacentas, ainda assim mantinham sistemas de mútuo socorro e assistência, para defesa contra os ataques de índios e piratas. 

Esta solidariedade que se perdeu com o desejo de autonomia das vilas, que passaram a se separar para tratar dos interesses próprios de cada comunidade, pois já não existiam índios e piratas a combater, nos séculos XIX e XX. Porém, nos anos recentes, as atribulações dos tempos coloniais deram lugar às de caráter metropolitano: sumiram os matagais e lodaçais entre as cidades, hoje um visitante não consegue mais saber, num rápido olhar, onde termina uma cidade e começa outra.

Neste início de milênio, em que comunidades às vezes de pólos opostos da terra se irmanam usando para isso as tecnologias de informática e telecomunicações, ensaiando os primeiros passos para a realização de atividades colaborativas, chega a espantar que cidades vizinhas não consigam se unir para a promoção conjunta de atividades geradoras de renda e emprego, ou ao menos para a solução de problemas comuns. Mas, não vou repisar o que já foi dito vários anos antes, há novos temas a debater. 

Pier de Pesca, entre a Ponte Pênsil e a Praia do Gonzaguinha, em São Vicente
Pier de Pesca, entre a Ponte Pênsil e a Praia do Gonzaguinha, em São Vicente
(foto: Márcio Pinheiro/Prefeitura Municipal de São Vicente)

Um só... – Em toda a divulgação regional, e mais visível ainda nos eventos internacionais do Turismo, não se busca atrair visitantes para a Baixada Santista, mas tão-somente para uma das cidades, quase que dizendo que as demais são de qualidade inferior. Já por diversas vezes foi citado nestas páginas que o turista imediatamente associa um grupo de cidades às propostas turísticas "Serras Gaúchas" ou "Circuito das Águas", não há uma identidade desse tipo para o turismo regional. Mesmo porque, pode-se dizer que não há turismo regional, no melhor significado dessa expressão.

Ora, o turista que vem de longe não pretende se isolar numa cidade apenas, ele quer passear por toda a região, conhecer suas atrações. Mesmo porque a Fortaleza da Barra, vista de Santos, fica em Guarujá, e para ir à área continental santista, passará por essa cidade ou Cubatão... Por que não lucrarem todas as cidades, facilitando ao turista se locomover entre elas, hospedando-se em Santos mas almoçando no Guarujá e jantando em São Vicente, por exemplo? Na verdade, toda a região perde com a desunião, pois deixa inclusive de conseguir a atenção (leia-se: verbas) dos governos estadual e federal para o desenvolvimento regional.

Mesmo em detalhes sutis se percebe o problema: Santos vem divulgando que é a terceira cidade paulista em qualidade de desenvolvimento humano, sexto posto no País, e ainda a décima na lista Exame de melhores cidades para negócios, muito à frente das demais, frisa: "Santos também é a única cidade da Baixada Santista a figurar na listagem das 500 melhores do País em IDH-M - São Vicente aparece em segundo, na região, com o 604º lugar" reza o texto da Prefeitura de Santos. Mas, que desenvolvimento humano pode ter, que negócios pode fazer, se não pode ser separada de um contexto regional que não ostenta os mesmos predicados? Que, por conta de interesses não harmonizados, detona as próprias possibilidades de desenvolvimento? 

Nessa questão, quem vai a Santa Catarina, por exemplo, nota outra mentalidade: cidades até fisicamente distantes entre si estão muito mais próximas em termos de divulgação, programando por exemplo eventos que não colidem entre si mas se fundem e complementam, dando ao visitante uma sensação de dinamismo contínuo, os eventos de uma cidade sendo divulgados também nas outras, num jogo de ganha-ganha em que a sinergia potencializa os resultados. O Nordeste é outro exemplo: as micaretas se sucedem cidade após cidade, prolongando o Carnaval por até seis meses...

Cachoeira do Parque Ecológico do Perequê, em Cubatão
Cachoeira do Parque Ecológico do Perequê, em Cubatão
(foto: Prefeitura Municipal de Cubatão)

Nas entrelinhas – Enquanto isso não acontece, examinemos a "fala do trono", para formular alguns alertas que ajudem a balizar a política na região. Divulga o governo paulista que o turismo será prioridade para gerar emprego e renda, o que em tese seria ótima notícia para toda a Baixada Santista, pois o governo quer apoiar o empresariado vigorosamente em quatro setores básicos: turismo de negócios, convencional, ecoturismo e rural. 

Nas entrelinhas, descobre-se as más notícias. Embora se qualifique para receber apoios em todos esses setores, a Baixada Santista está prestes a ver a debandada do turismo de negócios para um local perto de aeroporto importante, onde o governo quer construir uma estrutura para eventos que comportem 20 mil pessoas. Por ter demorado décadas numa briga intestina sobre o aeroporto regional que - espera-se - possa agora sair do papel, a região poderá ver aquele investimento em turismo aportar em outras plagas.

Informa o governo que no setor do ecoturismo "é preciso ir além das opções tradicionais", e lembra que o turismo de pesca é um grande negócio. Ora, quem conhece a história das comunidades de pescadores às margens do canal de Bertioga e Estuário sabe que, muito antes de se falar em turismo de pesca, era ali que os turistas e pescadores de final de semana iam se abastecer de iscas vivas, até que o assoreamento e a poluição quase liquidaram o negócio... e as comunidades que dele dependiam. Os olhos do secretário de turismo estão na outra ponta do Estado, pousados no rio Paraná... Quem o convidará a dar uma espiada nas áreas continentais de Santos e São Vicente?

Para o turismo rural, a visão do secretário repousa nos "casarões históricos belíssimos"... do Vale do Paraíba... Enfim, para o turismo convencional, o secretário se divide entre as belezas das praias e das montanhas. Como as montanhas parecem mais bem organizadas para atrair sua valiosa atenção, sobrará tempo para o secretário aceitar um convite para se bronzear numa praia desta "região metropolitana"?

(*) Carlos Pimentel Mendes é jornalista, editor do jornal eletrônico Novo Milênio.