Especial
Obras modernizam
porto
Mas empresas evitam divulgar
informações até as eleições
Carlos Pimentel Mendes (*)
O que
pensaria o leitor se, buscando informações técnicas
sobre uma obra, do tipo a ser prestado por um arquiteto ou engenheiro,
o pedido de informações sobe pela hierarquia da empresa até
a diretoria e volta negado em razão de que “a empresa não
deseja se pronunciar por enquanto, talvez dentro de dois meses”? E se a
inexplicável sonegação das informações
acontecesse simultaneamente em várias empresas, apesar dos insistentes
contatos feitos durante cerca de 10 dias?
Tudo isso ocorreu justamente num
contexto em que a administração do porto passa por importantes
mudanças, que em tese - somente em tese, pelo visto - não
deveriam afetar os contratos de concessão, nem mudar as operações
no cais, se forem considerados apenas parâmetros técnicos.
Na prática, décadas de administração política
do porto, e a própria forma como foram elaborados os contratos de
concessão, causaram distorções no relacionamento entre
os agentes econômicos ligados à atividade portuária.
Por exemplo, em diversos pontos do cais,
a raposa é que toma conta do galinheiro. Perdão pela imagem
literária, já que as histórias da carochinha até
registram a existência de raposas bastante honestas: nunca foram
apanhadas em delito. Mas o fato é que, em Santos, é comum
que o concessionário do terminal fique encarregado de informar à
administradora do cais a quantidade de carga movimentada e quanto deve
pagar de tributos. Faltam fiscais nos quadros da administradora portuária
para controlar e conferir essas informações. Um terço
(em valor) das cargas do comércio exterior brasileiro passa pelo
porto de Santos. Deve ser bem pouco o valor arrecadado, para não
ser possível à controladora do porto remunerar um grupo de
fiscais...
Pode ser uma grande coincidência
que - num quadro tão marcado ao longo dos anos pela desenvolta movimentação
de políticos em busca do controle de um feudo eleitoral e de cargos
em empresas por onde o dinheiro circule - faltando apenas dois meses para
as eleições em nível estadual e federal, uma empresa
diga que só poderá informar sobre suas obras e instalações
bem na época em que o Brasil conhecerá os primeiros números
do pleito nacional. E que em todas as outras consultadas ocorram tantos
problemas para a liberação das informações
desejadas.
? – A falta das desejadas informações
oficiais deixa uma interrogação no ar. Qual a causa? Certas
obras poderiam, se divulgadas, causar reações de entidades
ambientalistas? Existiriam interesses políticos que poderiam alterar
o quadro de concessões, motivo pelo qual nenhuma empresa quer se
tornar foco das atenções e talvez de um inoportuno conflito
de interesses? A regionalização do porto, em função
das eleições, pode influir em critérios que sempre
se diz serem técnicos? Eis o resultado da falta de transparência:
abre-se espaço a toda sorte de especulações. E até
mesmo a uma investigação mais apurada pela sociedade sobre
a possibilidade de ambiente tão turvo esconder práticas que
a sociedade, se consultada, talvez desaprove.
Esperemos que seja apenas uma infeliz
coincidência:
...que
o Moinho Pacífico só possa falar dentro de dois meses sobre
os novos silos em suas instalações na Bacia do Macuco.
...que
a Citrosuco não deseje se pronunciar “por enquanto” sobre a instalação
de suas novas câmaras frigoríficas no terminal situado também
no Bairro Macuco.
...que
o engenheiro designado pela Ferronorte/Caramuru não tenha enviado
as informações sobre o novo armazém para grãos
e farelos no porto santista.
...que
a operadora Santos-Brasil não tenha apresentado as informações
sobre a ampliação do terminal de contêineres da margem
esquerda do porto, o Tecon.
...que
o Grupo Cosan não tenha enviado, apesar da promessa, os dados sobre
a reforma do incendiado armazém portuário para granéis.
A própria Codesp, administradora
do porto, parece não possuir informações relevantes
sobre obras previstas ou em fase de realização em sua área
de influência, mesmo que elas possam alterar muito o perfil da movimentação
de cargas pelo porto. Ah, sim, faltam fiscais. E, aparentemente, aquelas
empresas também não enviam à administração
do porto tais informações, que seriam vitais para o planejamento
das atividades do porto.
Pesquisa – Já que as autoridades
e os empresários não dispõem das informações,
que o jornalista as encontre por si. Por exemplo, as instalações
da Citrosuco Paulista em Santos passam por obras a serem concluídas
em 10/2002, junto ao Armazém 29, que permitirão duplicar
sua movimentação de cargas: além de continuar exportando
anualmente 250 mil toneladas de suco concentrado e congelado, principalmente
de laranja, passará a movimentar 250 mil toneladas de suco fresco.
As novas instalações armazenarão 130 mil t deste produto,
e pelo menos 17 dos 41 tanques previstos já estão em uso.
Para esse novo produto, tanto os tanques como os dutos que fazem a ligação
com os navios são de aço inoxidável reforçado.
O Terminal de Contêineres (Tecon)
já colocou em operação os 100 metros iniciais de seu
novo cais, que se somam aos 510 metros construídos pelo governo
federal antes do arrendamento à operadora Santos-Brasil em 1997.
Essa ampliação - a um custo global de cerca de US$ 20 milhões,
incluindo o correspondente acréscimo no retroporto, que deve estar
concluído até 2004 - já permite o funcionamento de
um terceiro berço de atracação de navios (ampliando
desde já a movimentação de contêineres nesse
terminal em 20%, para 270 mil unidades em 2002), e até 2/2003 deverão
entrar em operação os demais 150 metros, ora em obras, totalizando
760 metros de cais. A construção é feita pela Andrade
Gutierrez e permitirá que o terminal se mantenha na posição
de maior instalação portuária latino-americana para
contêineres, passando de 366 mil m² para 454 mil m².
Já a Caramuru Alimentos passou
a operar em 5/2002 seu segundo terminal, o Armazém 39 externo, que
construiu em parceria com a Ferronorte para ampliar em até 120%
seus embarques de soja (para 1,5 milhão de toneladas ainda em 2002).
Podendo armazenar 90 mil toneladas do produto, o armazém conta com
ramais ferroviários e esteiras aéreas, ligando-o ao cais
do Corredor de Exportação. Em 2003, a Caramuru quer movimentar
ali 2 milhões de t de grãos, ampliando a operação
para 2,5 milhões de toneladas em 2004, 3 milhões em 2005
e 3,6 milhões em 2006. A área inclui ainda o armazém
40 externo, arrendado com a Citrosuco, que permite movimentar 1,2 milhão
de toneladas de grãos e farelo de soja.
A Votorantim Celulose e Papel (VCP),
que já contava com os armazéns portuários 14 e 15,
começou em 2/2002 a operar - através da Transchem Agência
Marítima - também o armazém 13, destinado à
movimentação de celulose, bobinas de papel e laminados (Duratex/Eucatex),
somando os três armazéns uma área de cerca de 10 mil
m² cobertos. O volume de celulose a ser exportado via Santos deve
crescer 160% em 2002, de 230 mil para 600 mil toneladas anuais.
No mais, quem garante que no prazo
divulgado, até o final de 2002, será assinado o convênio
que transfere a administração do complexo santista da Codesp
(controlada pelo Ministério dos Transportes) para o governo paulista?
Mas isso é outra história.
(*) Carlos
Pimentel Mendes é jornalista, editor do jornal eletrônico
Novo
Milênio. |