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Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 08/03/02 22:17:15
Edição 110 - JUL/2002 

Especial

Obras modernizam porto

Mas empresas evitam divulgar informações até as eleições

Carlos Pimentel Mendes (*)

O que pensaria o leitor se, buscando informações técnicas sobre uma obra, do tipo a ser prestado por um arquiteto ou engenheiro, o pedido de informações sobe pela hierarquia da empresa até a diretoria e volta negado em razão de que “a empresa não deseja se pronunciar por enquanto, talvez dentro de dois meses”? E se a inexplicável sonegação das informações acontecesse simultaneamente em várias empresas, apesar dos insistentes contatos feitos durante cerca de 10 dias?

Tudo isso ocorreu justamente num contexto em que a administração do porto passa por importantes mudanças, que em tese - somente em tese, pelo visto - não deveriam afetar os contratos de concessão, nem mudar as operações no cais, se forem considerados apenas parâmetros técnicos. Na prática, décadas de administração política do porto, e a própria forma como foram elaborados os contratos de concessão, causaram distorções no relacionamento entre os agentes econômicos ligados à atividade portuária.

Novos tanques da Citrosuco: duplicar a movimentação de cargas. Foto: Luiz Carlos Ferraz
Por exemplo, em diversos pontos do cais, a raposa é que toma conta do galinheiro. Perdão pela imagem literária, já que as histórias da carochinha até registram a existência de raposas bastante honestas: nunca foram apanhadas em delito. Mas o fato é que, em Santos, é comum que o concessionário do terminal fique encarregado de informar à administradora do cais a quantidade de carga movimentada e quanto deve pagar de tributos. Faltam fiscais nos quadros da administradora portuária para controlar e conferir essas informações. Um terço (em valor) das cargas do comércio exterior brasileiro passa pelo porto de Santos. Deve ser bem pouco o valor arrecadado, para não ser possível à controladora do porto remunerar um grupo de fiscais...

Pode ser uma grande coincidência que - num quadro tão marcado ao longo dos anos pela desenvolta movimentação de políticos em busca do controle de um feudo eleitoral e de cargos em empresas por onde o dinheiro circule - faltando apenas dois meses para as eleições em nível estadual e federal, uma empresa diga que só poderá informar sobre suas obras e instalações bem na época em que o Brasil conhecerá os primeiros números do pleito nacional. E que em todas as outras consultadas ocorram tantos problemas para a liberação das informações desejadas.

22 novos silos do Moinho Pacífico. Foto: Luiz Carlos Ferraz
? – A falta das desejadas informações oficiais deixa uma interrogação no ar. Qual a causa? Certas obras poderiam, se divulgadas, causar reações de entidades ambientalistas? Existiriam interesses políticos que poderiam alterar o quadro de concessões, motivo pelo qual nenhuma empresa quer se tornar foco das atenções e talvez de um inoportuno conflito de interesses? A regionalização do porto, em função das eleições, pode influir em critérios que sempre se diz serem técnicos? Eis o resultado da falta de transparência: abre-se espaço a toda sorte de especulações. E até mesmo a uma investigação mais apurada pela sociedade sobre a possibilidade de ambiente tão turvo esconder práticas que a sociedade, se consultada, talvez desaprove. 

Esperemos que seja apenas uma infeliz coincidência: 

...que o Moinho Pacífico só possa falar dentro de dois meses sobre os novos silos em suas instalações na Bacia do Macuco. 

...que a Citrosuco não deseje se pronunciar “por enquanto” sobre a instalação de suas novas câmaras frigoríficas no terminal situado também no Bairro Macuco. 

...que o engenheiro designado pela Ferronorte/Caramuru não tenha enviado as informações sobre o novo armazém para grãos e farelos no porto santista. 

...que a operadora Santos-Brasil não tenha apresentado as informações sobre a ampliação do terminal de contêineres da margem esquerda do porto, o Tecon. 

...que o Grupo Cosan não tenha enviado, apesar da promessa, os dados sobre a reforma do incendiado armazém portuário para granéis. 

A própria Codesp, administradora do porto, parece não possuir informações relevantes sobre obras previstas ou em fase de realização em sua área de influência, mesmo que elas possam alterar muito o perfil da movimentação de cargas pelo porto. Ah, sim, faltam fiscais. E, aparentemente, aquelas empresas também não enviam à administração do porto tais informações, que seriam vitais para o planejamento das atividades do porto.

Silos do Moinho Pacífico: informações só daqui a dois meses. Foto: Luiz Carlos Ferraz
Pesquisa – Já que as autoridades e os empresários não dispõem das informações, que o jornalista as encontre por si. Por exemplo, as instalações da Citrosuco Paulista em Santos passam por obras a serem concluídas em 10/2002, junto ao Armazém 29, que permitirão duplicar sua movimentação de cargas: além de continuar exportando anualmente 250 mil toneladas de suco concentrado e congelado, principalmente de laranja, passará a movimentar 250 mil toneladas de suco fresco. As novas instalações armazenarão 130 mil t deste produto, e pelo menos 17 dos 41 tanques previstos já estão em uso. Para esse novo produto, tanto os tanques como os dutos que fazem a ligação com os navios são de aço inoxidável reforçado.

O Terminal de Contêineres (Tecon) já colocou em operação os 100 metros iniciais de seu novo cais, que se somam aos 510 metros construídos pelo governo federal antes do arrendamento à operadora Santos-Brasil em 1997. Essa ampliação - a um custo global de cerca de US$ 20 milhões, incluindo o correspondente acréscimo no retroporto, que deve estar concluído até 2004 - já permite o funcionamento de um terceiro berço de atracação de navios (ampliando desde já a movimentação de contêineres nesse terminal em 20%, para 270 mil unidades em 2002), e até 2/2003 deverão entrar em operação os demais 150 metros, ora em obras, totalizando 760 metros de cais. A construção é feita pela Andrade Gutierrez e permitirá que o terminal se mantenha na posição de maior instalação portuária latino-americana para contêineres, passando de 366 mil m² para 454 mil m².

Terminal XXXIX da Ferronorte/Caramuru. Foto: Luiz Carlos Ferraz
Já a Caramuru Alimentos passou a operar em 5/2002 seu segundo terminal, o Armazém 39 externo, que construiu em parceria com a Ferronorte para ampliar em até 120% seus embarques de soja (para 1,5 milhão de toneladas ainda em 2002). Podendo armazenar 90 mil toneladas do produto, o armazém conta com ramais ferroviários e esteiras aéreas, ligando-o ao cais do Corredor de Exportação. Em 2003, a Caramuru quer movimentar ali 2 milhões de t de grãos, ampliando a operação para 2,5 milhões de toneladas em 2004, 3 milhões em 2005 e 3,6 milhões em 2006. A área inclui ainda o armazém 40 externo, arrendado com a Citrosuco, que permite movimentar 1,2 milhão de toneladas de grãos e farelo de soja.

A Votorantim Celulose e Papel (VCP), que já contava com os armazéns portuários 14 e 15, começou em 2/2002 a operar - através da Transchem Agência Marítima - também o armazém 13, destinado à movimentação de celulose, bobinas de papel e laminados (Duratex/Eucatex), somando os três armazéns uma área de cerca de 10 mil m² cobertos. O volume de celulose a ser exportado via Santos deve crescer 160% em 2002, de 230 mil para 600 mil toneladas anuais.

No mais, quem garante que no prazo divulgado, até o final de 2002, será assinado o convênio que transfere a administração do complexo santista da Codesp (controlada pelo Ministério dos Transportes) para o governo paulista? Mas isso é outra história.

Armazém da Ferronorte/Caramuru: capacidade para 90 mil toneladas. Foto: Luiz Carlos Ferraz

(*) Carlos Pimentel Mendes é jornalista, editor do jornal eletrônico Novo Milênio.