Mercado
Construir relações
em escala global... e local
Fornecedores locais precisam
de estratégias criativas para reconquistar seu mercado
Carlos Pimentel Mendes (*)
No
mundo da economia globalizada, existe um sábio conselho: "Pense
globalmente, aja localmente". Funciona assim: mesmo para prestar um bom
atendimento aos clientes locais, é necessário que o empresário
tenha uma mentalidade de mercado global, sabendo que qualquer mudança
no mundo pode fazer com que um fornecedor de qualquer outro país
tenha melhores condições de preço e prazo de entrega
que o próprio fornecedor local.
Todos os alertas foram dados. Como
quando um navio-fábrica de cimento ficou ancorado no porto de Santos,
para receber matéria-prima do exterior e produzir o cimento com
preço melhor que o apresentado nas lojas santistas pelos fornecedores
nacionais. Ou quando um conhecido arquiteto santista comentou que já
se tornava mais confiável e barato encomendar via Internet os cálculos
do projeto a um escritório em Atlanta/EUA e, aprovado o projeto,
mandar também pela Internet que um centro gráfico paulistano
fizesse a impressão das plantas.
Na Baixada Santista, os fornecedores
de materiais de construção demoraram muito para perceber
o beco em que o setor estava entrando, ao manter velhas práticas
comerciais, enquanto o mercado se movia em busca de melhores preços
e de mais variedade, no lado de cima da Serra do Mar ou em qualquer outro
lugar do planeta. Pois agora, qualquer fornecedor pode ser encontrado a
um clique do mouse, acabando a vantagem de estar fisicamente próximo
do cliente para agir como quiser.
Mas, perceberam? Alguns se movimentam
no sentido de fazer com que as construtoras comprem os materiais nas lojas
locais, pela simples razão de serem locais. Pode até ser
um bom mote de campanha, mas somente se for acompanhado por outras ações
que mostrem ser efetivamente vantajoso adquirir esses materiais no mercado
local. E é bom que a ação seja rápida: a duplicação
da rodovia Imigrantes terá um impacto sobre a economia local que
já vem sendo objeto de estudos. Tanto pode facilitar a descida de
futuros clientes para as lojas locais como pode facilitar a revoada dos
antigos clientes em busca de melhores condições serra acima.
Sem
reserva – Embora existam protestos - como quando os Estados Unidos
fecham as fronteiras ao aço estrangeiro para proteger o mercado
interno -, a criação de barreiras aos competidores estrangeiros
é um ato ligado à soberania nacional. Mas, a própria
Constituição veda a criação de barreiras comerciais
entre estados ou entre municípios. Assim, de imediato seria derrubada
na Justiça qualquer pretensão de forçar a criação
de uma reserva de mercado municipal ou metropolitana. Mesmo porque, ainda
que fosse possível, fatalmente seriam encontradas formas "alternativas"
de atravessar as fronteiras municipais.
Então, se o comércio
local de materiais de construção quer reconquistar a clientela
regional, tem que provar que possui qualidade, variedade e preço.
Tem de estabelecer as parcerias que já deveria ter criado há
mais de uma década com grandes fornecedores, para obter preços
melhores; tem de formar grupos de compras para ganhar escala de compra
junto aos fornecedores das matérias-primas; tem de encontrar formas
de manter o estoque constantemente renovado, para apresentar produtos mais
modernos e variados.
Não é possível
que uma única loja na capital paulista apresente mais variedade
de produtos que todas as lojas da Baixada Santista juntas - e não
é comentário por ouvir dizer, mas algo notado por este jornalista
ao tentar encontrar no mercado local um lustre ou um espelho de tomada,
por exemplo.
E a questão não se
resume a produto, é preciso considerar o serviço de instalação.
Mesmo empresas de maior renome não se preocupam com esse "detalhe"
- muitas vezes o principal criador de ex-clientes. Com certeza, instaladores
de persianas verticais não serão bem recebidos em muitos
apartamentos e casas da região, após as barbaridades que
alguns deles cometeram - também só para dar um exemplo. Os
clientes não têm tempo nem paciência para ensinar aos
"instaladores profissionais" as regras básicas de suas profissões
- tão básicas que até o cliente leigo sabe quando
está sendo maltratado pelo fornecedor que contratou.
Não que inexistam empresas
inidôneas e profissionais incompetentes no lado de cima da Serra
do Mar. Porém, algumas empresas de fora dessa região metropolitana
conseguiram, aos poucos, conquistar a clientela da Baixada Santista. No
mínimo, alguém dormiu no ponto, deixando de reagir à
invasão do mercado. É em momentos assim que se vê como
custa caro - custa a sobrevivência do próprio negócio
- acomodar-se e esperar que o consumidor vá eternamente se deixar
seduzir pelos velhos argumentos de venda.
Caminho
– Se os comerciantes locais querem recuperar o mercado, em vez de apenas
lamentar a perda, existe uma série de passos práticos que
precisa ser seguida. O primeiro deles é agirem da forma como fazem
seus clientes: pesquisar produtos, prazos de entrega, preços finais
e financiamentos, serviços de instalação. Observar
o que os clientes realmente querem encontrar numa loja de materiais para
construção e reforma. Atentar para os motivos que levam alguém
a percorrer as lojas concorrentes na Grande São Paulo e em outros
centros.
Tabulados os dados sobre as preferências
dos consumidores em termos de produtos e serviços, analisar as formas
de estabelecer um diferencial favorável que atraia esses consumidores
para a região. Devem levar em conta nessa análise que, às
vezes, com duas lojas oferecendo o mesmo produto ao mesmo preço,
ganha o cliente a que tiver fama de prestar melhores serviços de
instalação e manutenção. Por outro lado, às
vezes o preço no balcão é o mesmo, mas a firma paulistana
não cobra frete e a santista acrescenta à conta essa despesa...
Logística é um aspecto
importante: concorrentes podem se unir, por exemplo, para a compra conjunta
de certos materiais e a manutenção de um depósito
também conjunto, evitando o custo da estocagem individual. No mundo
globalizado, outras parcerias antes inimagináveis já ocorrem.
Por exemplo, será que cada loja precisa ter um serviço próprio
de entregas, ou grupos de lojas, mesmo concorrentes, poderiam contar com
uma mesma entregadora, racionalizando as entregas? Os comerciantes poderiam
promover exposições conjuntas, intercambiar produtos e manter
catálogos em comum, para que o consumidor tenha mais variedade de
escolha - caso em que o diferencial para a escolha da loja não seria
o produto em si, mas a excelência no atendimento, a capacidade de
encantar o cliente...
Só então, feita a lição
de casa, seria factível - e altamente justificável - realizar
uma campanha para que o consumidor vote nos candidatos da região
(isto é, escolha comprar nos estabelecimentos santistas...). Haveria
até um argumento em que os comerciantes ainda não pensaram:
ao comprar nas lojas locais, o consumidor estaria garantindo também
o giro do dinheiro e o mercado de trabalho na região. Seria o motivo
final para convencer o comprador, já satisfeito com o preço,
o prazo, a qualidade do produto e do atendimento nas lojas da região.
Argumento que vale tanto em relação a quem compra um parafuso
como para a construtora que precisa de materiais para um prédio
inteiro.
(*) Carlos
Pimentel Mendes é jornalista, editor do jornal eletrônico
Novo Milênio
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