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Edição 088 - AGO/2000 

Especial

Muralha, a obra que uniu a China

Wan-Li Ch’ang-Ch’eng, a Muralha de 10.000 Li, mais conhecida como a Grande Muralha da China, é um dos maiores projetos de construção de todos os tempos

Helô Coimbra

Percorrendo aproximadamente 7.300 quilômetros de território chinês, no sentido leste-oeste, a Grande Muralha é a única obra feita pelo homem, visível da Lua a olho nu. Erguida no decorrer de séculos, ela estende-se do desfiladeiro de Shan-hai, perto de Po Hai (Golfo de Chihli) ao desfiladeiro de Chia-yü (na atual província de Kansu), freqüentemente serpenteando ao longo do topo das colinas e montanhas da zona rural chinesa. 

Embora seções prolongadas da muralha estejam hoje em ruínas ou tenham desaparecido completamente, ela ainda é uma das estruturas mais notáveis da Terra. A Grande Muralha foi considerada Patrimônio da Humanidade, pela Unesco, em 1987. 

A Grande Muralha nasceu de fortificações de fronteira dispersas e de castelos de reinos chineses individuais. Durante vários séculos, esses reinos provavelmente preocuparam-se tanto em proteger-se de seus vizinhos próximos, quanto das invasões dos bárbaros. 

Embora restaurada em vários trechos, a Grande Muralha ainda tem vastas áreas deterioradas pelo abandono
Tradição e conservação - Há muito incorporada à mitologia chinesa e ao simbolismo popular, no Século XX a Grande Muralha veio a ser considerada um símbolo nacional. Sobre o Portão Oriental (Tung-men), na Passagem de Shan-hai, há uma inscrição atribuída ao historiador medieval Hsiao Hsien que foi traduzida como “Primeira Passagem Sob o Céu”, referindo-se à tradicional separação entre a civilização chinesa e as terras “bárbaras”do norte. 

Apesar da importância cultural da parede, ela foi cortada por estradas em vários pontos e vastas seções sofreram com séculos de negligência. Na década de 70, um segmento próximo de Ssu-ma-t’ai (110 km nordeste de Pequim) foi desmantelado para se retirar material de construção, mas acabou sendo subseqüentemente reconstruído. Outras áreas foram também restauradas. A seção mais conhecida é a de Pa-ta-ling (70 km a noroeste de Pequim), que foi reconstruída na década de 50 e que hoje atrai milhares de turistas do mundo todo. 

Uma frente de defesa - Verdadeiro colosso da arquitetura militar, a Grande Muralha contava com um complexo sistema de administração. Cada uma das principais praças fortes da linha de defesa era hierarquicamente ligada a uma rede de comandos militares e administrativos. Durante o reinado de Shih huang-ti, 12 divisões administrativas foram estabelecidas ao longo da Muralha e na dinastia Ming a fortificação inteira foi dividida em 9 áreas ou zonas de defesa. Um Chefe de Posto (chung-ping-kuang) foi nomeado para cada zona. Juntas elas eram conhecidas como as Nove Guarnições de Fronteira. 

Também chamadas de guias, as torres de sinalização eram usadas para enviar comunicações militares durante a noite, através de sinais com fogo ou lanternas ou através de sinais de fumaça, durante o dia. Outros métodos empregados eram as bandeiras, os badalos e os tiros de armas de fogo. As torres geralmente ocupavam o topo das elevações naturais para permitir o máximo de visibilidade. Nos níveis mais baixos havia alojamentos para os soldados, além de estábulos, currais e áreas de armazenamento. 

As paredes da muralha em si eram a parte fundamental do sistema defensivo. Normalmente a largura era de 6,5 metros na base e de 5,8 metros no topo e a altura média ficava entre 7 e 8 metros, sendo mais baixa nas colinas íngremes. A estrutura da parede variava de lugar para lugar, conforme a disponibilidade dos materiais de construção. Foram feitas paredes de terra socada intercalada entre tábuas de madeira, de tijolos de argila, de uma mistura de tijolos e pedra, apenas de pedras e de estacas e pranchas de madeira. Em algumas áreas foram aproveitados diques já existentes e em outras os acidentes naturais como os precipícios e gargantas. 

Portas - Nos desertos ocidentais, as paredes eram freqüentemente estruturas simples de terra batida e argila. Muitas das plataformas das áreas orientais, como as que ficam próximas de Pa-ta-ling, tinham um revestimento de pedra e incluíam várias estruturas secundárias e dispositivos. No lado interno dessas paredes, a intervalos pequenos, havia portas em arco chamadas portas chüan, feitas de tijolos ou pedras.

Dentro de cada chüan havia degraus de pedra ou de tijolos que levavam às ameias. No topo, no lado que enfrentaria o inimigo, havia ameias de 2 metros de altura, chamadas to-k’ou. A parte superior dos to-k’ou eram grandes aberturas usadas para vigiar e atirar nos atacantes. Na parte baixa havia pequenas aberturas através das quais os defensores também poderiam atirar. 

A intervalos de 200 ou 300 metros, havia uma plataforma com ameias que avançava ligeiramente no lado que enfrentava os atacantes. Durante a batalha, essa plataforma propiciava uma visão privilegiada e a conveniência de atirar lateralmente contra os atacantes, à medida que eles tentavam escalar a parede. Em várias plataformas havia cabanas simples p’u-fang que serviam de abrigo para os guardas durante as tempestades. Algumas plataformas, bem como as torres de sinalização, tinham dois ou três pavimentos e podiam ser usadas para guardar armas e munições. As paredes tinham ainda sistemas de drenagem como proteção contra o excesso de água da chuva. 

O parapeito externo foi provido de ameias e o interior foi construído com perto de 1 metro de altura, para pessoas e cavalos não caírem
Passagens - As passagens eram as principais praças fortes ao longo da muralha e normalmente ficavam em pontos chaves como as interseções com rotas de comércio. As plataformas de várias passagens foram erguidas com tijolos enormes e pedras usando terra e pedras moídas como enchimento. Os bastiões tinham cerca de 10 metros de altura e de 4 a 5 metros de largura no topo. 

Dentro de cada passagem havia rampas de acesso para os cavalos e escadas para os soldados. O parapeito externo era provido de ameias, e o parapeito interior, ou yü-ch’iang (nu-ch’iang), era uma parede baixa de aproximadamente 1 metro de altura, para evitar que as pessoas e os cavalos caíssem. 

O portão interno da passagem era usado como uma saída para a guarnição contra-atacar invasores ou enviar patrulhas, além de servir como ponto de acesso para os comerciantes e outros civis. Debaixo do arco do portão, normalmente havia uma enorme porta dupla de madeira. Os painéis internos das portas tinham parafusos e anéis de aperto. 

Em cima de cada portão havia uma torre que funcionava como atalaia e posto de comando. Normalmente a torre tinha três níveis e era feita ou só de madeira ou de madeira e tijolos. Do lado de fora do portão, onde um ataque inimigo seria provável, havia um weng-ch’eng, ou parapeito semicircular ou poligonal que protegia o portão de uma agressão direta. 

Estendendo-se dos weng-ch’engs mais estratégicos, havia uma linha adicional de proteção, o luo-ch’eng que contava freqüentemente com uma torre para vigiar a área além da muralha, além de dirigir os movimentos das tropas nas batalhas. Ao redor da entrada do portão havia freqüentemente um fosso formado no processo de cavar terra para construir as fortificações.