O
que é bom permanece, o resto é modismo
Da Reportagem
Quem lida diariamente com o idioma também fala sobre a questão.
Autor do Manual de Redação e Estilo de O Estado de São
Paulo, o jornalista Eduardo Martins alerta para um problema, na opinião
dele, maior do que o simples uso de expressões em inglês:
a descaracterização da língua por meio da adaptação
do que não tem o mesmo sentido em Português e Inglês.
Ele se diz tranquilo quanto ao risco de uma eventual destruição
do idioma ou da cultura por causa da invasão dos termos em inglês.
‘‘Pelo que sei, nunca uma língua foi destruída por outra
sem que houvesse uma guerra, uma imposição do conquistador
sobre o conquistado. O que há são modismos passageiros, que
já foram franceses e agora são americanos. Só o que
é relevante permanece, no fim das contas’’.
Quer um exemplo? Hoje é moda usar ‘vamos estar ligando’
no lugar de ‘vamos ligar’, porque é a tradução mais
próxima da mesma frase em inglês, We Will be Calling. Não
há sentido neste tipo de coisa.
Outros: contraceptivo (que não quer dizer nada, é
uma simples tradução de contraceptive) substituiu anticoncepcional.
Startar tomou o lugar de iniciar, nos microcomputadores. As pessoas hoje
acessam uma rodovia, os traficantes do Rio deletam um inimigo
Eduardo, que também apresenta o programa De Palavra em
Palavra, na Rádio Eldorado de São Paulo, dá outro
exemplo, vindo diretamente da NBA: aqui no Brasil, traduzimos as divisões
do basquete americano como ‘conferências’ leste e oeste. Não
há, em nenhum dicionário, este significado para a palavra,
que só quer dizer reunião. O certo seria divisão ou
região.
Esta é a grande falha de ambos os Projetos de Lei: tanto
o de Aldo Rebello quanto o de Mariângela Duarte não prevêem
estas situações, para ele mais graves. Eduardo teve oportunidade
de discutir o assunto com o próprio Aldo Rebello em uma palestra
que proferiu na Câmara dos Deputados, em Brasília, este ano.
De toda forma, ele é contra a instituição
de multas ou quaisquer soluções de força para resolver
o problema da manutenção do idioma. Ele prefere uma campanha
que conscientize, primeiro, os professores.
Empréstimo
A Editora Local de A Tribuna, jornalista Lídia Maria de
Mello, é formada também pela Faculdade de Letras e está
produzindo uma dissertação de mestrado sobre neologismos
(surgimento de novas palavras) para a Escola de Comunicações
e Artes da USP.
Segundo ela, as novas palavras podem surgir de duas formas: a
partir de elementos da própria língua ou por empréstimo
(de outros idiomas). Antes, estes empréstimos vinham mais do Francês
(vitrô, chofer, abajur, reveillon) mas depois da 2ª Grande Guerra,
os Estados Unidos se tornaram a grande força econômica do
mundo e, a partir daí, passaram a influenciar todas as áreas.
Lídia acha difícil o controle da evolução
natural do idioma através de leis, sem uma fiscalização
eficaz. O ideal, para ela, é o fortalecimento do ensino do Português,
não com regrinhas e exercícios chatos, mas ensinar desde
crianças que a língua é a principal forma de expressão
de um povo.
Veja o caso dos índios: o primeiro passo de sua ruína
foi o aculturamento através do idioma e da religião. Hoje,
a maioria não tem cultura própria e vive do caricato, de
danças para turistas.
Mesmo assim, Lídia é otimista e não compartilha
das opiniões catastróficas sobre a influência de outros
idiomas no nosso. Quem aprova as novas palavras, segundo ela, são
os usuários.‘‘Algumas ficam, são assimiladas e aportuguesadas.
O resto cai em desuso, pois é apenas um modismo’’.
Influências
O publicitário Aristides de M. Brito Jr, professor da
Unisanta, diz que nossa influência cultural é americanizada
e isto acaba se refletindo na propaganda. Os jargões da área
são todos em inglês: marketing, briefing, brainstorm, layout.
Ele considera uma grande bobagem produzir anúncios em
inglês como forma de limitar os consumidores em potencial à
classe A. ‘‘Nem todos os que pertencem à classe A falam inglês
e o anúncio acaba falando para ninguém’’.
Ele considera importante o projeto apresentado pelo deputado
Aldo Rebello e pretende trazê-lo a Santos, ainda este ano, para um
debate com outros publicitários e alunos da faculdade. |