Rosilma Roldan (*)
A maior preocupação social, hoje, é a violência. O medo
instalou-se, definitivamente, em todos os estamentos, e a rota de fuga ainda não está traçada. Os fatores determinantes desse verdadeiro pânico coletivo que grassa, assustadoramente, sobre a sociedade
brasileira são complexos, variados, muitos nem descobertos. Mas, sem dúvida alguma, o desemprego em massa a que vimos
assistindo, inermes, há muito é protagonista, nessa ópera de horrores.
O conceito de educação imposto, há algumas décadas, aos cidadãos brasileiros converge para
um modelo que visa a formar um número cada vez maior de meros repetidores, que saibam toscamente "as quatro operações" e "ler
e escrever", pouco exigentes, portanto, intelectual e financeiramente.
Quando percebemos, no panorama internacional, que o conceito de emprego mudou; que, no
Brasil, discutem-se mudanças profundas na legislação trabalhista, com o fito de abrir novas oportunidades de emprego, embora
saibamos que grande parte do País esteja não só fora do mercado de trabalho, como da própria C.L.T.; que os programas
governamentais enfatizam a necessidade premente da preparação de geradores de riqueza e de renda; que é impossível aplicar o
mesmo modelo educacional, com objetivos tão díspares: de um lado, a formação de comandados e, de outro, de pessoas criativas,
empresários; perplexos, indagamos: quem está de má-fé?
Este mês, a Casa Civil da Presidência da República abriu concurso público para Analista de
Finanças e Controle, cargo que exige curso superior e oferece um bom salário. Dentre as disciplinas exigidas, constam a Língua
Portuguesa, com peso 2, Raciocínio Lógico, com peso 1,5, ao lado de Direito, Contabilidade e Finanças Públicas, todas com peso
2. Note-se que Língua Inglesa e Administração têm peso 1.
Uma das formas de ascensão social é o concurso público. Em tempos modernos, o corte de
custos implica, necessariamente, corte de postos de trabalho. O absurdo índice de desemprego que atinge, principalmente, os
jovens do País tem levado verdadeiras multidões aos concursos públicos. Só que os cidadãos brasileiros, que pagam altíssimos
impostos, estão sendo enganados! Como o próprio Governo exige, para formar seus quadros, um retorno que não proporcionou?
O ensino público tem-se tornado um dos mais perfeitos instrumentos governamentais para
consolidar as inamovíveis diferenças sociais.
Em um País que ficou em último lugar na qualidade de ensino (pesquisa do Programa
Internacional de Avaliação de Alunos - PISA, iniciativa da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico - OCDE,
que mediu desempenho e capacidade de leitura de estudantes com 15 anos, nas redes pública e particular, em 32 países) e que
apenas 26% da população entende o que lê; que os pais têm de socorrer-se do Poder Judiciário, para que seus filhos,
analfabetos na 5.ª série, não passem de ano; onde acontecem Congressos Científicos em que é proibido falar e apresentar teses
em Língua Portuguesa; que nossos mitos, valores e cultura são bem menos conhecidos do que aqueles do país vizinho; qual
patrimônio e que investimento estão reservados pelo Estado ao cidadão para que consiga atender às exigências do cada vez mais
sofisticado e excludente mercado de trabalho?
E o Presidente, que já nos alertou para o fato nada abonador de que somos irremediavelmente
inempregáveis, ainda faz beicinho quando o Imperador nos trata como analfabetos...
(*)
Rosilma Roldan, advogada e graduada em Letras, é
presidente do Movimento Nacional em Defesa da Língua Portuguesa (MNDLP). Publicado nos jornais A Tribuna de Santos em 5/4/2002 (página A6) e Gazeta Mercantil em 12/4/2002 (página 2). |