|
Movimento Nacional em Defesa
da Língua Portuguesa
|
NOSSO
IDIOMA
Dinheiro público vale menos
Celso Raeder (*)
Uma das maiores redes de supermercado do país, interessada em
lançar produtos para comercialização exclusiva em suas lojas, encomendou a uma indústria de cosméticos a fabricação de uma linha de
tratamento capilar. Todo o processo de criação da marca - conceitos e valores agregados como diferenciais competitivos, além de
pesquisa de percepção do consumidor - ficou a cargo de uma pequena empresa de marketing, que cobrou por seus serviços módicos R$ 10
mil. Hoje, na gôndola, sem suporte de mídia e amparada apenas na estratégia de preço mais baixo, a linha deixa a rede varejista
satisfeita com o retorno comercial alcançado com tão baixo investimento.
Ainda não foram descobertas as propriedades terapêuticas do petróleo para a beleza dos
cabelos. Talvez seja por isso que a criação de uma logomarca e a troca de um "s" por um "x" custem R$ 700 mil à Petrobras, por
demandar maior esforço de criatividade para inserir uma empresa conceituada no mundo inteiro no cenário econômico globalizado.
É impressionante como tudo o que diz respeito a dinheiro público gravita na casa dos
milhões. As licitações servem apenas para dar uma fachada de lisura a um processo viciado na origem. O preço mais baixo, seja na
aquisição de merenda escolar, material hospitalar, quentinhas para presos ou qualquer tipo de prestação de serviços, sempre será
superior àqueles cobrados por fornecedores ou empresas de terceirização aos seus clientes privados.
Licitação há muito deixou de ser precaução necessária à preservação dos recursos públicos.
No auge do desenvolvimento brasileiro que enriqueceu empreiteiros, as empresas de construção firmavam acordos elevando seus preços à
estratosfera para que uma delas fosse contemplada com a obra. E nesse rodízio, todas ganharam. No caso da Petrobrás, nem mesmo a
informação da existência de um processo de licitação veio a público "justificando" a escolha da empresa que elaborou tão genial
logomarca.
Se estivesse na iniciativa privada, Henri Reichstul perderia o emprego. Os presidentes da
Shell e da Ipiranga jamais teriam autonomia para dispor de US$ 50 milhões sem dar satisfação aos seus acionistas, que exigem
resultados na aplicação dos investimentos. Pela irritação de Fernando Henrique, o governo - principal acionista da Petrobras - não
foi consultado sobre a mudança da marca da estatal brasileira.
A aprovação do Orçamento de 2001 pelo Congresso deveria ser precedida por uma nova
legislação para controle dos gastos dessas verbas. É preciso dar valor ao dinheiro público, que não tem paridade com aquilo que é
gasto em produtos ou serviços pagos pelo setor privado. Enquanto a liberação de recursos for feita com a despreocupação de quem não
tira dinheiro da própria carteira, figuras como Nicolau surgirão para desmoralizar e desrespeitar o contribuinte.
(*) Celso Raeder é jornalista do Jornal do Brasil. O texto foi
publicado nesse jornal, na edição de 31 de dezembro de 2000, página 9 (Opinião).
OBS.: O MNDLP manteve a forma utilizada pelo jornal, mas não concorda com a grafia de
"Petrobras", entendendo que a forma correta é "Petrobrás". |