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Movimento Nacional em Defesa
da Língua Portuguesa
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NOSSO
IDIOMA
Freio no estrangeirismo
José Luiz Oliveira (*)
Há cerca de dois anos, o senador Ronaldo Cunha Lima (PMDB-PB),
violeiro e poeta popular, subiu à tribuna para atacar o estrangeirismo na Língua Portuguesa. Irônico e sarcástico, o parlamentar
paraibano descreveu uma manhã hipotética do seu cotidiano, usando quase que apenas palavras estrangeiras. A manhã terminava com ele
abrindo o freezer em busca de uma coke para combater a sede provocada pelo cooper.
Foi um discurso recheado de apartes brilhantes, alguns, como o do senador Arthur da Távola
(PSDB-RJ), dignos de serem levados às escolas. Os estudantes, como se sabe, adoram uma palavrinha estrangeira e não se importam em
colocar o vernáculo sob o pés.
O tema volta agora ao debate. A Comissão de Educação da Câmara acaba de aprovar projeto de
lei do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) que veta o uso de expressões estrangeiras em eventos públicos, nos meios de comunicação e em
estabelecimentos e produtos. São toleradas as palavras de origem estrangeira já integradas ao Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa.
Felizmente, desta vez a discussão está ganhando maior repercussão. Há aqueles que
argumentam, com razão, que certo tipo de estrangeirismo revigora a língua, tornando-a mais rica. Joga neste time Pasquale Cipro
Neto, colunista da Folha de S. Paulo e um dos mais badalados consultores de Português. São influências das quais não se pode
fugir neste mundo globalizado, mas existem casos de pura tolice, como lojas que preferem on sale no lugar de "liquidação".
Têm razão aqueles que acham inócuo o projeto de Aldo Rebelo. Não somos um bom exemplo na
hora de cumprir leis. Corre-se o risco de, depois de aprovado, as coisas continuarem do mesmo jeito. Pode-se até aportuguesar as
palavras, mas não se conseguirá fiscalizar diálogos, lojas e todas as mercadorias, como não se consegue policiar o trânsito para
impedir velocidade acima de 60 quilômetros, nem que o motorista respeite o pedestre, ou que o pedestre cumpra a lei atravessando
apenas na faixa, depois de sinalizar com a mão.
Mas a iniciativa do deputado é louvável. Mesmo que pareça exagero a opinião da relatora do
projeto na Comissão de Educação, Iara Bernardi, de que o estrangeirismo estaria provocando a desnacionalização da língua, é preciso
fazer algo para frear os abusos - e o Brasil não será a primeira nação a adotar medidas de proteção ao idioma nacional.
Na França, por exemplo, o governo indica palavras, com publicação de listas nos jornais, que
podem substituir os termos estrangeiros. Só o fato de ter suscitado o debate já faz do projeto algo salutar. Espera-se, agora, que
intelectuais, professores, formadores de opinião e políticos entrem na discussão.
Se toda a sociedade se envolver, certamente descobriremos o caminho para livrar a Língua
Portuguesa dos ataques nocivos. Já temos um esboço. As posições radicais, embora devam ser manifestadas e respeitadas, parecem fora
de questão. Vetar o estrangeirismo como caso particular de xenofobia é tão vesgo quanto adotá-lo indiscriminadamente em nome de um
mundo globalizado, sem fronteiras de língua, que é a condutora e protetora da cultura de um povo.
Há de se reconhecer a contribuição das palavras estrangeiras, devidamente aportuguesadas, ao
nosso idioma, mas é preciso rechaçar com toda força a inserção delas, em sua forma bruta, na publicidade e nos meios de comunicação,
como se não tivéssemos correspondentes na Língua Portuguesa. Tolices como dizer linkar em vez de "ligar" (no sentido de pôr
em comunicação) estão cada vez mais presentes no dia-a-dia do brasileiro.
O certo é que o Português precisa e deve ser protegido, mas não pode ficar imune às
influências enriquecedoras, venham elas do estrangeiro ou de um inventor de palavras como Guimarães Rosa. Afinal, é uma língua viva.
O escritor português José Saramago, que se recusa a pronunciar a palavra mouse (ele
chama a peça de rato mesmo), poderia contribuir e muito nessa discussão. Falando recentemente sobre a atração que as palavras
estrangeiras exercem sobre os brasileiros, ele afirmou não entender por que bradamos tanto contra a colonização se no fundo gostamos
de ser colonizados. Podemos partir daí.
(*) Artigo publicado na edição de 14 de agosto de 2000
do Jornal de Brasília.
N.E.: O MNDLP disponibiliza em suas páginas o citado
pronunciamento do senador Ronaldo Cunha Lima. |