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Movimento Nacional em Defesa
da Língua Portuguesa
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NOSSO IDIOMA CURIOSO E DIVERTIDO
Você sabe escrever um bilhão?
Luiz Barco (*)
Fazendo compras num supermercado, recentemente, ouvi um jovem
pai que repreendia o filho traquinas: "Eu já disse um bilhão de vezes que não é para mexer nas coisas". É possível que, trinta anos
antes, o avô daquela criança repreendesse o pai, então criança também, com igual força: "Eu já disse um milhão de vezes..." Ambos
exageraram, é claro. Mesmo que admoestasse o filho sessenta vezes por dia, o avô levaria mais de 45 anos para falar um milhão de
vezes. E o pai da geração do bilhão, por mais que vivesse, jamais conseguiria fazer justiça à sua expressão irada.
O fato é que milhão, bilhão, trilhão, são expressões que entraram para o nosso dia-a-dia. A
gente fala, e muitos nem se dão conta do que estão dizendo. Você sabia que 1 bilhão de dólares é muito mais dinheiro nos Estados
Unidos e no Brasil, mas é muito, muito mais na Europa? O dinheiro vale a mesma coisa em toda parte, mas o número é diferente. Aqui e
nos Estados Unidos, 1 bilhão é o número 1 seguido de nove zeros; na Europa, é o número 1 seguido de doze zeros. Observe que não se
trata de uma diferença no sistema de numeração, mas no nome usado para designar os números.
O milhão, tanto para nós quanto para os europeus, é o resultado da multiplicação de mil por
mil. É representado pelo número 1 seguido de seis zeros. Esse milhão, multiplicado por mil, dá um número formado pelo 1 seguido de
nove zeros. Nós o chamamos 1 bilhão; os europeus o chamam mil milhões. Para eles, o bilhão é o 1 seguido de doze zeros, ou seja, o
resultado da multiplicação de 1 milhão por 1 milhão. Para nós, esse número é o trilhão.
A forma de determinar, sem ambigüidades, o tamanho real de um número, é simplesmente contar
os zeros que se seguem ao 1. Para que isso não seja demorado nem fastidioso, os cientistas escrevem o número como potência de 10.
Assim, o 100 é o resultado da multiplicação de 10 por 10, ou seja, 10² (10^2); o 1.000 é o resultado da multiplicação de 10 por 10
por 10, ou seja, 10³ (10^3); o milhão é a multiplicação de 10 por 10 por 10 por 10 por 10 por 10, ou 10^6. E assim por diante.
Observe que o expoente da potência é o número de zeros que acompanham o 1. Os cientistas escrevem 10^13, e sabem exatamente do que
estão falando, embora leigos brasileiros chamem esse número 10 trilhões e os leigos europeus 10 bilhões.
Observe a tabela:
|
Nome
|
Número escrito
|
Notação científica
|
Brasil
|
Europa
|
um |
um |
1 |
10^0
|
mil |
mil |
1.000 |
10^3
|
milhão |
milhão |
1.000.000 |
10^6
|
bilhão |
mil milhões |
1.000.000.000 |
10^9
|
trilhão |
bilhão |
1.000.000.000.000 |
10^12
|
quatrilhão |
mil bilhões |
1.000.000.000.000.000 |
10^15
|
quintilhão |
trilhão |
1.000.000.000.000.000.000 |
10^18
|
sextilhão |
mil trilhões |
1.000.000.000.000.000.000.000 |
10^21
|
setilhão |
quatrilhão |
1.000.000.000.000.000.000.000.000 |
10^24
|
Além dessa clareza, a notação exponencial tem outra vantagem: ela é muito prática para fazer
multiplicações de números muito grandes. Por exemplo: 1.000.000.000 vezes 10.000 dá um número imenso, 10.000.000.000.000. Usando a
notação exponencial, podemos escrever: 10^4 vezes 10^9 é igual a 10^13. Observe que, na multiplicação de duas potências que têm a
mesma base, basta repetir a base e somar os expoentes.
O astrônomo americano Carl Sagan escreveu num artigo recente: "Se em uma galáxia existem em
média 10^11 estrelas e se existem 10^11 galáxias no universo, então temos 10^22 estrelas". Seria muito salutar que a divulgação de
notícias envolvendo grandes números fosse feita utilizando-se somente a notação científica. Podemos imaginar quantos enganos a
respeito da dívida externa brasileira foram cometidos, conforme as informações procederam da Europa ou dos Estados Unidos. E isso é
apenas um exemplo. A História registra muitos outros exemplos interessantes de cálculos feitos com grandes números, que não podem
admitir ambigüidades na sua valoração. Vejamos alguns:
O número de palavras
impressas desde que Gutenberg imprimiu a sua Bíblia, em 1455, é da ordem de 10^16.
O matemático grego
Arquimedes estimava que seriam necessários 10^63 grãos de areia para encher todo o Universo.
O físico inglês
Arthur Stanley Eddington calculou, com base na Teoria da Relatividade de Albert Einstein, que o número de elétrons no Universo é da
ordem de 10^79.
(*) Luiz Barco é professor da Escola de Comunicações e
Artes da Universidade de São Paulo (USP). Artigo publicado em sua seção Dois Mais
Dois na revista SuperInteressante nº. 15, de dezembro de 1988 (Editora Abril, São Paulo/SP). |