FEBEANET
Mulheres e crianças primeiro
O terrorista
capturado, em imagem da TV russa retransmitida para todo o mundo
Imagem: captura
de tela, Jornal Nacional, Rede Globo de Televisão em 6/9/2004
- 20h00
Em
nome dos mais variados interesses - e, por mais absurdo que pareça,
a religião sempre foi um dos motivos principais -, praticado por
todos os povos, o terrorismo sempre existiu. Seja para o vencedor de uma
guerra deixar bem claro seu poder, prevenindo o surgimento de resistências
localizadas entre os vencidos, seja como forma de guerra em que grupos
com pequenos recursos tentam colocar de joelhos um poderoso inimigo.
Tanques
russos presidem a retirada dos corpos das vítimas na escola
Captura de
tela, Cable News Network (TV CNN, Atlanta/EUA), noticiário em inglês,
6/9/2004, 20h04
Mas, no último século,
surgiram convençõe entre as nações - a civilização
chegando ao fulcro das guerras - pelas quais o inimigo vencido teria sua
dignidade respeitada pelo vencedor, a todo o custo seriam evitadas baixas
entre as populações civis (guerra é só entre
militares), mulheres e crianças seriam tanto quanto possível
protegidas, seriam evitadas armas químicas, biológicas e
atômicas.
Retirada
das crianças sobreviventes do ataque à escola
Captura de tela,
Cable News Network (TV CNN, Atlanta/EUA), noticiário em inglês,
6/9/2004, 20h04
No milênio que se esperava
já começar com a paz mundial e o fim de todas as guerras,
o que vemos é cada vez mais guerras, barbárie, regressão
a estágios bem primitivos da história da Humanidade. Não
há mais limites, nem os poucos que se havia conseguido estabelecer
no século XX. Genocídios, armas de todos os tipos, ataque
a populações civis indefesas, ataque a grupos internacionais
de voluntariado para auxílio às vítimas, tornaram-se
a regra, num grande vale-tudo em que a vida humana é o que menos
importa.
O presidente
russo lamenta e decreta dois dias de luto no país
Captura de
tela, TV CNN (Atlanta/EUA), noticiários em inglês/espanhol,
6/9/2004, 20h02 e 20h11
Esbravejam os internautas contra
esses absurdos, em mensagens que cruzam o planeta em segundos, mas os grupos
econômicos que fomentam as guerras já não se importam
com os protestos. Tem petróleo na região, ou é um
ponto estratégico de passagem, a ordem é dominar a qualquer
custo. Passando por cima da autodeterminação dos povos, e
de todos os itens da carta dos Direitos Humanos aprovada pelas nações.
Afinal, os poderosos descobriram que para eles não há mais
punições, tribunais como o de Nuremberg já não
assustam ninguém. E sempre se pode jogar a culpa num subordinado
que "não compreendeu bem as instruções".
Centenas
de vítimas fatais. No rodapé da tela, noticiário econômico,
bolsas de valores, negócios
Captura de
tela, Cable News Network (TV CNN, Atlanta/EUA), noticiário em inglês,
6/9/2004, 20h30
A tal ponto chegou a barbárie
que a nova ordem no terrorismo mundial é fazer exatamente o contrário
do que previam as antigas convenções. Como em Beslan, num
vilarejo da região separatista russa da Chechênia/Ossétia
do Norte, onde mais de 300 crianças foram mortas e 200 estavam
desaparecidas ou feridas em 4/9/2004, junto com seus professores, num ataque
terrorista com granadas.
A carnificina terrorista foi acompanhada
pelas emissoras de rádio e televisão, por jornais, revistas
e sites da Internet em todo o mundo. Apenas um "suspeito" foi preso, morador
na região, e estranhas explicações foram dadas, o
presidente russo Vladimir Putin lamentou o ocorrido, bandeiras foram hasteadas
a meio-pau e tudo ficou por isso mesmo. O foco do noticiário foi
desviado para a tragédia seguinte.
Pranto
pelos mortos: imagens para comover um mundo que não mais se comove
com isso
Captura de
tela, TV CNN (Atlanta/EUA), noticiários em inglês, 6/9/2004,
20h28
E com tantos meios de comunicação
registrando esses fatos, ainda assim ficou sem explicação
a morte de uma jornalista russa que seguia para o local, supostamente assassinada
pelo governo russo por saber mais do que a média sobre o que realmente
estava ocorrendo. E dizer isso a quem quisesse saber.
Decerto ela poderia explicar como
os mlitares russos agiram desastradamente no caso, talvez provocando boa
parte das mortes atribuídas aos terroristas, ao colocar as vítimas
sob fogo cruzado. Trapalhada que não seria a primeira, lembrando-se
que, num teatro de Moscou invadido por terroristas anos antes, as bombas
de gás lançadas pela tropa de choque mataram mais civis do
que os próprios terroristas, como se reportou na época.
A informação,
que se perdeu em meio ao noticiário da tragédia, passada
pelo site teuto-brasileiro ABKNet News em 4/9/2004:
O preço
da coragem
É por
demais conhecida a pressão a que são submetidos jornalistas
russos.
Não
raramente alguns deles são simples e misteriosamente executados.
A
tragédia
ocorrida ontem na Ossétia do Norte mais uma vez demonstrou como
a
informação
é manipulada pelas autoridades russas. Somente quando, nas ruas
de Beslan,
pais e familiares dos reféns resolveram protestar é que a
imprensa oficial
ampliou o número de reféns de 100 para "300 ou 400". Na
verdade eram
mais de 1200. Mais de 300 deles, maioria crianças, foram
vítimas
fatais do confronto entre tropas e terroristas dentro da escola.
Uma das vozes
do jornalismo independente russo era Anna Politkovskaia.
Formada em
jornalismo pela universidade de Moscou, ela destacou-se por suas
reportagens
independentes que contradiziam a imprensa oficial sobre o
conflito na
Chechênia. Politkovskaia dirigia-se ontem a Beslan para cobrir
os acontecimentos,
quando sentiu-se mal e foi hospitalizada, vindo a falecer
logo depois.
Os médicos haviam diagnosticado envenenamento. O último livro
de Politkovskaia
trazia o titulo: "A Rússia de Putin". |
Pressão
do público e da imprensa fez o governo informar a dimensão
real da tragédia
Imagem: captura
de tela, Jornal Nacional, Rede Globo de Televisão em 6/9/2004
- 20h00
Segue transcrita uma das notícias
que circularam na Europa sobre o cerceamento à imprensa por parte
do governo russo, no caso da escola de Beslan. É do jornal português
Público, edição
eletrônica de 18/9/2004:
OSCE
Acusa Governo Russo de Dificultar o Jornalismo
Por
CLARA RAIMUNDO
Sábado,
18 de Setembro de 2004
A OSCE (Organização para a Segurança e Cooperação
na Europa) denunciou inúmeros entraves colocados pelas autoridades
russas à cobertura jornalística da tragédia de Beslan,
num relatório divulgado ontem e disponível no site da organização
(www.osce.org).
"Ocorreram casos de detenção e hostilização
dos jornalistas, impedindo-os de fazer o seu trabalho. Mais importante
que isso, o Governo não forneceu atempadamente informações
fiáveis acerca da crise em curso", lamenta Miklós Haraszti,
representante da OSCE para a liberdade dos "media".
O relatório, baseado num inquérito realizado pela União
Russa de Jornalistas, considera que esta situação significa
"um retrocesso na democracia". O Governo é acusado de ter repetidamente
fornecido aos profissionais dos "media" dados incorrectos ou contraditórios,
tais como os relativos à nacionalidade dos terroristas e ao número
de reféns e mortos (ver página 20).
O assessor de imprensa do Presidente da Ossétia do Norte, Lev
Dzugaev, insistiu até ao dia 3 de Setembro (dois dias depois de
os terroristas terem entrado na escola) que havia apenas 354 reféns.
Foi só quando um grupo de pais anunciou que faria a sua própria
lista de reféns que o Presidente anunciou que seriam cerca de 900.
Na verdade, eram 1220.
O ministro do Interior, o FSB (ex-KGB) e o membros da Procuradoria-Geral
foram enviados a Beslan, encarregados de fornecer informações
aos "media" e organizar conferências de imprensa com os responsáveis
pela operação de libertação dos reféns.
Os correspondentes do jornal "Gazeta" contaram no entanto que eles não
chegaram a concretizar nenhuma daquelas tarefas.
As três estações televisivas russas, que constituem
as principais fontes de informação da população,
são acusadas pela OSCE de não terem fornecido "informações
fiáveis e actualizadas". Os residentes de Beslan reagiram mal ao
perceberem que os dados divulgados pelos "media" não eram verdadeiros,
e chegaram a maltratar os jornalistas, batendo-lhes e roubando-lhes as
cassetes com o material filmado.
O relatório da OSCE relembra ainda os casos de profissionais
dos "media" russos que viram cerceada a liberdade de imprensa, tendo alguns
deles sido impedidos de fazer a cobertura do atentado terrorista na escola
da Ossétia do Norte.
O jornalista Andrei Babitski, correspondente da Radio Liberty, foi detido
no aeroporto no dia 1 de Setembro, quando ia a caminho de Beslan, por suspeita
de transporte de explosivos, que não se confirmou. No mesmo dia,
Anna Politkovskaia, da "Novaya Gazeta", foi envenenada durante o voo para
Beslan, facto considerado suspeito por diversas organizações
de defesa da imprensa. No dia 6, na sequência das fortes críticas
do Governo à cobertura da tragédia feita pelo jornal russo
"Izvestia", o editor Raf Sharikov foi despedido.
Alguns jornalistas estrangeiros foram também alvo de restrições
ao seu trabalho. No dia 2 de Setembro, um grupo de repórteres dos
jornais "Gazeta Wyborcza", "Liberation" e "The Guardian" ficou detido durante
horas num aeroporto entre Moscovo e Beslan, sem motivo aparente. O mesmo
aconteceu, dias mais tarde, a um jornalista do canal por satélite
al-Arabya.
No dia 3, as equipas de televisão da ZDF, ARD (alemãs),
APTV (americana), e Rustavi 2 (da Geórgia), viram confiscadas as
cassetes com as imagens do que se seguiu às duas explosões
dentro da escola. No dia seguinte, uma repórter de uma estação
televisiva da Geórgia e o operador de câmara que a acompanhava
foram detidos pela polícia de Beslan, por alegadamente não
possuírem documentos para estar na Rússia.
"Disto, resultou uma tripla crise de confiança: entre o governos
e os 'media', entre os 'media' e os cidadãos e entre o governo e
o povo", conclui o relatório. |
As trapalhadas do governo russo,
e principalmente a censura à imprensas que vem promovendo, aparentemente
tentando esconder com uma peneira as cenas desta nova onda de barbárie
mundial, merecem lugar de destaque neste Festival
de Besteiras que Assola a Internet (Febeanet)...
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