FEBEANET
Palpiteiros criminosos regem mercado
mundial
Um
dos mentores deste Febeanet, o famoso animador de televisão Abelardo
Barbosa, o Chacrinha, já dizia que "quem não se comunica,
se trumbica". Mas também, não vamos exagerar. Depois da multinacional
estadunidense Enron enrolar todo mundo com suas contas malucas, com a especial
contribuição da empresa de auditoria Andersen Consulting
- que acabou enrolada por completo nessa malha contábil, praticamente
falindo junto com sua cliente -, agora é a vez da MCI WorldCom,
multinacional das telecomunicações, ser comunicada pelo governo
dos Estados Unidos de que terá de comunicar muito, para tentar convencer
os investidores e as autoridades de que 2+2=5.
E a Embratel tem
de se virar para dizer que não depende da controladora MCI-Worldcom
para sobreviver, como no comunicado que emitiu logo após estourar
o escândalo nos EUA.
E a Agência
Nacional de Telecomunicações (Anatel) - que deveria ter analisado
muito bem os números apresentados na época por aquela multinacional
concorrente à compra da Embratel - vai ter de pular miudinho
para provar que - pelo menos agora - está acompanhando atentamente
o que ocorre no mundo que pode afetar profundamente o setor sob sua responsabilidade.
Pois, o que a
MCI foi apanhada fazendo é algo que nem o português padeiro
da anedota, lápis preso na orelha, faria enquanto retorce seus fartos
bigodes: lançar débito como crédito. Seu exército
de contadores - decerto recrutados entre os melhores maquiadores dos estúdios
de Hollywood - aplicaram um golpe cinematográfico, durante anos,
lançando as despesas normais de manutenção das linhas
de telecomunicação como se fossem investimentos na estrutura,
o que permitia apresentar um soberbo balanço, como se a MCI estivesse
fazendo grandes investimentos e portanto aumentando seu patrimônio
- quando, na verdade, estava se atolando em dívidas que agora fazem
o preço de suas ações ir direto para o brejo - para
fazer decerto companhia às ações da Enron.
Incompetentes
- Os analistas da Rua do Muro (Wall Street), em New York, devem estar batendo
com a cabeça no muro, de vergonha por não terem detectado
a trapaça, tão óbvia para quem mergulhe nos números
da MCI como eles têm obrigação de fazer.
O curioso é
que são esses mesmos incompetentes que deram como ótimos
os papéis da Enron e da MCI nas bolsas de valores, mas se consideram
em condições de avaliar o risco de investir no Brasil ou
em qualquer outro país. Não enxergam o que acontece no próprio
quintal e querem ser gurus palpitando no que se passa no resto do mundo.
Seria divertido
acompanhar suas mancadas, se não houvesse tanto em jogo,
pois os palpites desses irresponsáveis é que definem se todo
o trabalho dos brasileiros tem ou não valor: ao piorarem o chamado
Risco Brasil, fazem com que os investimentos em nossas empresas sejam paralisados
ou reduzidos, com que os produtos brasileiros percam valor no mercado internacional,
com que aumente o desemprego no Brasil em razão direta da redução
do menor giro de capital no Brasil.
Agora, o mais
grave é que meia dúzia de incensados consultores divulgam
pelos meios de comunicação que o risco do Brasil é
pior que o da Nigéria, mas ao pé do ouvido de alguns seletos
clientes eles recomendam investir no Brasil, o que prova sua má
fé, além da irresponsabilidade. Como aconteceu com representantes
em Wall Street do banco estadunidense Merrill Lynch, descobertos em meio
a essa manobra fraudulenta, e que deveriam ser processados pelo governo
brasileiro pelos prejuízos que causaram ao Brasil.
Junto com eles,
também deveriam ser processados pelo governo brasileiro o banco
holandês ABN Amro e o banco estadunidense Morgan Stanley, pela irresponsabilidade
demonstrada perante o sistema financeiro internacional e pelas perdas que
causaram ao Brasil. No mínimo, como lição para que
outros aventureiros não se atrevam a brincar de novo dessa forma
criminosa com a economia brasileira.
Pelo conjunto
de trapaças e incompetências demonstradas na análise
da economia estadunidense e mundial, esses analistas financeiros travestidos
de gurus da Economia merecem não só processo judicial como
um lugar de destaque na galeria dos candidatos ao título de Besteira
do Ano, neste Festival de Besteiras que Assola a Internet (Febeanet).
P.S.:
registrem-se, por oportunos, dois comentários divulgados via Internet
sobre o tema das adulterações contábeis em companhias
estadunidenses:
Rio
de Janeiro - 01/07/2002 - Artigos - Número 165
A FRAUDE TEM DIVERSOS
SABORES
Paul Krugman
(*)
Então
você é o gerente de uma sorveteria. O negócio não
é muito lucrativo, então como enriquecer? Cada um dos grandes
escândalos corporativos revelados até agora sugere uma estratégia
diferente para tirar proveito dos negócios.
Em primeiro
lugar, há a estratégia da Enron. Você fecha contratos
para fornecer aos clientes um sorvete de casquinha por dia nos próximos
30 anos. Você deliberadamente subestima o custo do fornecimento de
cada casquinha; então contabiliza todos os lucros projetados para
essas vendas futuras no balanço do ano corrente. De repente, parece
que o seu negócio é extremamente lucrativo, e você
pode vender ações da sua loja a um preço inflacionado.
Há a
estratégia da Dynegy. As vendas de sorvete não são
lucrativas, mas você convence os investidores de que elas o serão
no futuro. Então você fecha um acordo com a outra sorveteria
da sua rua: cada um vai comprar centenas de casquinas do outro todos os
dias. Ou melhor, fingir que compram. O resultado é que você
se transforma em um grande competidor num negócio em expansão
e pode vender ações a preços inflacionados.
Ou então
a estratégia da Adelphia. Você assina contratos e chama a
atenção dos investidores para o volume dos contratos, em
vez da lucratividade deles. Dessa vez você não apela para
transações imaginárias: simplesmente inventa pencas
de clientes imaginários. Com o aumento da sua base de assinantes,
os analistas de crédito lhe dão boas notas, e você
consegue vender ações a preços inflacionados.
Finalmente,
há a estratégia da WorldCom. Aqui não há vendas
imaginárias; você desaparece com os custos, fingindo que despesas
operacionais — creme de leite, açúcar, calda de chocolate
— fazem parte do preço de compra de um novo congelador. De forma
que seu negócio parece, no papel, ser altamente lucrativo, só
precisando de empréstimos para financiar a compra de novos equipamentos.
E você pode vender ações a preços inflados.
Ah, quase esqueci:
como enriquecer? A maneira mais fácil é dar a si próprio
inúmeras opções de compra de ações,
assim você se beneficia dos preços inflacionados. Mas você
também pode apelar para a criação de afiliadas, ao
estilo Enron; para empréstimos pessoais, à Adelphia, e por
aí vai. É bom ser diretor-executivo.
Há duas
coisas preocupantes sobre este cardápio de tramóias. A primeira
é que cada um dos escândalos revelados até agora usou
um ardil diferente. Então não se pode nem dizer que poucas
empresas teriam usado os mesmos truques da Enron ou da WorldCom — com certeza,
outras companhias descobriram outros truques.
A segunda é
que não era assim tão difícil perceber os esquemas
fraudulentos. Por exemplo, a WorldCom diz agora que 40% de seus investimentos
ano passado eram de araque, na verdade eram despesas operacionais. Como
as pessoas que deveriam estar atentas à possibilidade de fraude
— auditores, banqueiros e governo — não viram algo tão grande?
A resposta, claro, é que eles não queriam ver ou foram impedidos
de tomar uma providência.
Não
estou dizendo que todas as empresas americanas são corruptas. Mas
os executivos que querem ser corruptos encontram poucos obstáculos.
Os auditores não estavam interessados em dificultar a vida das empresas
que lhes garantiam uma gorda renda em consultoria; o mesmo em relação
aos banqueiros, que, como no caso Enron, se beneficiavam dos lucrativos
acordos.
E os políticos,
mantidos na linha com contribuições de campanha, impediam
as autoridades reguladoras de trabalhar, reduzindo o orçamento das
agências e criando “buracos negros” na legislação.
Há seis meses, eu disse em um artigo que o escândalo Enron
seria um marco para os EUA mais importante que 11 de setembro. Isso hoje
soa implausível?
(*)
Paul Krugman é colunista do jornal estadunidense
The New York Times |
e:
Mário
Persona (*)
O recente escândalo
de mais uma empresa, uma gigante das telecomunicações nos
EUA, me deu uma idéia. Comecei a lançar, no canhoto do talão
de cheques, os meus investimentos. O cheque para pagamento de água
e luz entrou como investimento em infra-estrutura. Telefone e Internet,
investimentos em telecomunicações. Gasolina? Investimento
em transportes. O supermercado entrou como investimento em barriga. O departamento
que mais cresce hoje, sem nenhum sinal de recessão em curto prazo.
Infelizmente
o banco parece não entender minha contabilidade moderna, e enquanto
as ações de minha empresa crescem em valor, meu saldo no
banco diminui. Talvez seja apenas um problema de comunicação
entre as diferentes empresas de consultoria que eu e o banco contratamos.
Um problema que poderá confundir meus investidores. Se o banco contratar
os consultores certos, tudo estará resolvido. Não é
um problema de números, mas de ponto de vista ou, falando mais bonito,
do método de análise adotado. E tem gente que ainda chama
isso de capitalismo selvagem. Eu chamo de criativo.
Numa visita
a um site para entender como foram feitos os efeitos de "Senhor dos Anéis",
fiquei impressionado com o número de pessoas envolvidas com miniaturas.
Que miniaturas? Seriam os anéis? Ou os baixinhos? Não eram.
Todas aquelas construções imensas podem ser medidas em palmos.
Sem contar as que são medidas em bits. O que parece grande nem sempre
é. A arte está em parecer que é, não em ser.
Ou parecer que tem, quando o que se tem são números apenas.
Muitos com valor nominal, porém poucos em essência real.
O problema
começa quando quem trabalha demais na construção dos
cenários acaba acreditando que eles existam de verdade.
(*)
Mário
Persona é consultor, escritor e palestrante. |
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