FEBEANET
Minervino me enerva...
"Quem conta um conto aumenta
um ponto..." (ditado popular)
Brasília
continua postulando o título de capital do besteirol nacional, para
não dizer coisa pior. É tanta besteira junta que elas já
começam a colidir e se misturar na Internet: a mãe de um
índio queimado vivo em 1997 por parentes ricos e desocupados de
juízes federais vira homem, na pele de um juiz que beneficia irregularmente
seu filho com um alto cargo público em 2001 (justamente na mesma
época em que o caso do índio massacrado foi julgado). E a
história embolada sai circulando pela Internet, vira lenda e, de
tanto repetida, quase vira verdade, sendo repassada por pessoas indignadas
e de boa fé. Eis a prova, na forma de uma mensagem que circula em
diversas listas de debates na Internet (com o detalhe de que nas versões
recebidas por Novo Milênio até 29/1/2002 ainda não
aparecia a caracterização de Bruno como ligado à morte
do índio pataxó):
----- Original Message -----
From: Marcelo Gatti <mpgatti.rlk@terra.com.br>
To: <photosynthesis@centroin.com.br>
Sent: Monday, February 11, 2002
12:36 PM
Subject: [photosynt] NOMEADO COM
LOUVOR
Um dos abastados jovens que tocou
fogo no pataxó Galdino poucos anos atrás já ganha
salário de gente bem grande no Tribunal de Justiça do Distrito
Federal, coincidentemente presidido por seu papai...
"NOMEADO COM LOUVOR"
Este foi o título da reportagem
do Correio Braziliense do dia 22/12/01 a respeito da seguinte situação:
O filho do presidente do TJDF, Bruno (aquele marginalzinho que pôs
fogo no índio pataxó), fez concurso público para o
cargo de segurança (12 vagas disponíveis; salário
de R$ 1.300,00; nível exigido 2º grau) e ficou em 65º
lugar.
Depois do resultado do concurso,
o número de vagas aumentou para 70! Após 12 dias no cargo,
ele foi promovido a dentista do TJDF para ganhar R$ 6.600,00. O presidente
do TJDF, Edmundo Minervino, ainda teve a cara-de-pau de afirmar na entrevista:
"Não houve ato ilegal nenhum."
Algumas questões que nós,
cidadãos, perguntamos:
- Se Bruno é tão bom
assim, por que não fez concurso para o cargo de dentista?
- Por que aumentar o número
de vagas exatamente para 70? Poderia ter aumentado para 66, que o Bruno
entraria...
- Como estão se sentindo as
outras pessoas que foram mais bem colocadas que Bruno no concurso? Será
que, algum dia na vida, estas pessoas vão ganhar R$ 6.600,00? E
os outros profissionais que já estão trabalhando há
mais tempo no TJDF?
Enquanto a marca Minerva limpa as
nossas roupas, o sr. Minervino suja nosso país com muita lama...
O objetivo deste e-mail é
tentar alcançar o maior número de pessoas possível
para mostrar como o coronelismo e paternalismo ainda existem fortemente
no serviço público brasileiro. Tomara que este e-mail
chegue até o sr. Minervino ou ao Bruno ou a algum promotor de Justiça
para impedir essa baixaria...
Quem quiser repassar para frente,
será um favor para o País...
M.Gatti |
Agora, começa
a investigação de Novo Milênio:
Conforme os
termos do processo 17.901/97, o índio pataxó Galdino Jesus
dos Santos foi morto quando dormia em um ponto de parada de ônibus
em Brasília, por um grupo de jovens da alta sociedade local, na
madrugada de 20/4/1997. Agindo com requintes
de perversidade, eles jogaram dois litros de álcool combustível
sobre a pessoa adormecida e ao redor e atearam fogo, deixando em seguida
o local sem socorrer a vítima de seu crime. Depois de presos, ainda
apresentaram o argumento de que não sabiam ser a vítima um
índio, pensando tratar-se de "apenas" um mendigo.
Devido à
elevada condição sócio-econômica dos acusados,
ocorreu intensa pressão das elites brasilienses para subtraí-los
ao rigor da lei, para que seu crime não fosse qualificado como hediondo,
o que levaria à condenação com penas maiores. Isso
talvez acontecesse, caso a vítima não fosse um índio,
massacrado justamente após o Dia do Índio, levando a história
às manchetes internacionais. Os autos do processo - disponíveis
no site Jus Naviganti - mostram os
argumentos usados pela defesa dos jovens, que quase tiveram sucesso: os
criminosos ainda foram condenados, em 10/11/2001, a 14 anos de prisão,
por homicídio qualificado. Pena bem mais longa do que teriam se
não houvesse a pressão popular nacional e internacional,
exigindo o rigor da Justiça contra os criminosos. Mesmo assim, com
os recursos para redução de pena, a previsão é
que estejam nas ruas apenas três anos após o julgamento.
Conforme relatou
a publicação Último Segundo em 29/12/2001 (em
página não mais disponível no site
original, mas recuperada via memória do serviço de buscas
Google), "(...) Os quatro jovens condenados a 14 anos de prisão
pelo homicídio qualificado do índio pataxó Galdino
Jesus dos Santos, em Brasília, também vão passar o
Ano Novo na prisão. Os primos Eron e Tomás de Oliveira, Antônio
Novély Vilanova e Max Rogério Alves. Antônio é
filho do juiz federal Novély Vilanova e Max é enteado do
ex-ministro Walter Medeiros, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Na madrugada de 20 de abril de 1997, os quatro atearam fogo no índio,
que dormia em uma parada de ônibus de uma das principais avenidas
de Brasília e morreu 24 horas depois, com a totalidade do corpo
queimado. Eles já cumpriram quatro anos de prisão, enquanto
aguardavam julgamento, e devem ficar mais três anos presos, pelos
cálculos dos advogados. (...)". (grifo nosso).
Verifica-se então a origem
do comentário sobre os filhos de juízes federais. A ligação
entre o caso do índio e o do filho de juiz beneficiado com cargo
público está no nome da mãe do índio massacrado:
a mãe do índio Galdino era Minervina de Jesus. Em poucas
semanas, uma falha de memória transformou o nome feminino Minervina
no sobrenome do juiz envolvido em outra besteira: Edmundo Minervino, presidente
do Tribunal de Justiça do Distrito Federal. Na verdade, não
consta em nenhum dos documentos relativos ao caso a presença
do jovem Bruno Minervino na história do índio massacrado.
Em toda a documentação pesquisada surgem apenas os nomes
de Max Rogério Alves, Antônio Novely Cardoso Vilanova, Tomás
Oliveira de Almeida e Eron Chaves de Oliveira, e ainda o então menor
de idade G.N.A.J., primo de Eron.
A outra besteira citada na nota espalhada
pela Internet se refere às manobras nepotistas de um juiz de Brasília.
Eis a notícia
original, publicada em jornal da capital federal:
Brasília, sábado,
22 de dezembro de 2001
Cidades
|
Serviço
público
Nomeado com louvor
Filho do presidente do Tribunal
de Justiça do Distrito Federal passa em concurso para segurança,
mas é promovido a dentista e conquista a mais alta gratificação
do fórum brasiliense
Da Redação
De
segurança, cujo salário é de R$ 1.300, para o cargo
de dentista do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF), ganhando
R$ 6.600. A promoção ocorreu apenas 12 dias após a
aprovação no concurso público. Graças a decisões
de colegas de trabalho do pai, Bruno Minervino conquistou assim a mais
alta gratificação do fórum brasiliense. Bruno é
filho do desembargador Edmundo Minervino, presidente do mesmo Tribunal
em que foi nomeado para a Função Comissionada (FC)-09.
Bruno foi aprovado em concurso público
para a vaga de técnico judiciário na área de Segurança
e Transporte em 10 de agosto. O filho do presidente do TJDF ficou entre
os últimos selecionados para preencher as 70 vagas disponíveis.
Ficou em 65º lugar no processo de seleção, realizado
pela Universidade de Brasília (UnB), que exigiu o 2º grau completo.
Mesmo sendo um dos últimos da fila dos novos servidores do TJDF,
Bruno conquistou a gratificação mais alta depois de contratado.
Menos de duas semanas depois de ser
nomeado como segurança do Tribunal, Bruno foi agraciado no Diário
Oficial com outra nomeação. No dia 20 de agosto, foi designado
a assumir função de assessor do Secretário-Geral,
Leodito Faria. A portaria nº 377, que o promoveu, não foi assinada
pelo pai, mas pelo vice-presidente do TJDF, desembargador José Campos
do Amaral, no exercício da presidência naquela data. Entretanto,
no mesmo dia, Edmundo Minervino, assinou outras portarias conforme está
divulgado no Diário da Justiça do dia 3 de setembro.
Depois de ser requisitado como assessor
do Secretário Geral, Bruno Minervino acabou remanejado para o Serviço
Odontológico. Bruno é dentista e tem mestrado em Ortodontia.
Antes da promoção, o filho do desembargador já tinha
sido beneficiado por outra medida administrativa. Ele só pôde
ser convocado pelo Tribunal porque foi ampliado o número de vagas
para seguranças.
O edital do concurso previa apenas
12 vagas para a área de Segurança e Transporte. Mas foram
ampliadas para 70 depois da realização do concurso. O Tribunal
alegou que teve de cancelar o contrato com a empresa particular de segurança
que prestava serviço ao Fórum e assim substituir os funcionários
terceirizados por concursados. Segundo o desembargador Edmundo Minervino,
o Tribunal de Contas da União proibiu o Fórum de contratar
empresas particulares de segurança.
Assim, Bruno Minervino conseguiu
retornar à função que já havia assumido no
Tribunal, mas teve de deixar exatamente por ser filho de desembargador.
Foi obrigado a largar o emprego em 1996 por causa da aprovação
da lei que proibiu o nepotismo no Judiciário. Na época, Minervino
trabalhava como dentista, ocupando cargo de confiança.
Ganho salarial
R$ 1.300 era o salário de
Bruno Minervino, filho do presidente do TJDF, quando ele ingressou no fórum
para trabalhar como segurança
R$ 6.600 passou a ser a remuneração
do dentista após ser remanejado por
meio de portaria do tribunal
Quatro vagas para dentista
Segundo a lei que proíbe
o nepotismo, parentes de juízes e desembargadores só podem
assumir cargos nos tribunais se forem aprovados em concurso público.
Para preencher a vaga no quadro de dentistas do TJDF, entretanto, Bruno
Minervino teria de passar em concurso específico para o setor, que
tem hoje quatro vagas em aberto. O exame seria mais difícil pois
exigiria nível superior. Com a nomeação pelo vice-presidente
do TJDF, Bruno não precisou fazer a prova.
O presidente do Tribunal, Edmundo
Minervino, informou por meio da sua assessoria de imprensa que vai manter
o filho no cargo em que está porque não houve irregularidade
alguma na sua nomeação. Também negou qualquer influência
junto ao vice-presidente do Tribunal para promover o filho. ‘‘Não
houve ato ilegal algum. Bruno é concursado. Não foi beneficiado
porque é filho do presidente, mas porque tem qualificação
profissional para estar assumindo a função’’, disse a assessora
de imprensa do Tribunal, Adriana Jobim.
O desembargador também sustentou
que a nomeação do filho para o cargo de dentista foi vantajosa
para o TJDF porque sairia mais caro pagar clínicas particulares
para atender os funcionários. |
Bem, já
foi devidamente ampliada a versão 2002 do Festival de Besteiras
que Assola a Internet (Febeanet) para incluir
a história do Bruno e seu meritíssimo papai. Que fique bem
claro, entretanto: "Não houve ato ilegal algum" na ampliação
deste festival, pois aquela besteira tem todas as qualificações
para participar do Febeanet, não só pelo nepotismo "legal"
como pela própria confusão armada na Internet pelos que indevidamente
ligaram essa besteira ao massacre do índio pataxó...
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