FEBEANET
Tapando os buracos do governo
Dois
absurdos simultâneos estão acontecendo há anos neste
país: verbas oficiais para construção ou reparação
de estradas (chamada de Operação Tapa-Buraco), que somem
no meio do caminho, e empresas particulares terem de usar seus próprios
recursos humanos e de infra-estrutura para executar um serviço pelo
qual já pagam ao governo - via impostos - para que fosse feito.
Contamos esta história com
base em matéria apresentada pelo noticiário Jornal Nacional,
apresentado em 4/12/2001 (às 20h47) pela Rede Globo de Televisão,
do qual são as imagens que ilustram esta página. Embora os
problemas com as estradas existentes apenas no papel ou sem qualquer conservação
existam em todo o País, a matéria centrou o foco no trecho
Boa Vista/Bonfim da BR-401, em Roraima, e também no trecho desse
estado da BR-174, que atravessa o Amazonas verticalmente em direção
ao Sul.
Mostrando o documento intitulado
"O Assalto", a reportagem explica que mediante assinaturas falsas em planilhas
de custo, foi ajeitado para que o Departamento de Estradas de Rodagem (DER)
em Roraima assumisse os custos de execução de serviços
de reparos em trechos de estradas, enquanto as empresas contratadas nunca
compraram um quilo de asfalto, não possuem usinas para fabricar
o composto aplicado às estradas, sequer têm equipamentos básicos
como vibro-acabadoras para fazer a aplicação desses produtos.
Ainda segundo denúncia gravada pela Globo, o dinheiro arrecadado
na operação era entregue ao diretor do DER em Roraima.
Se apenas essa história já
merecia a inscrição no Febeanet, o complemento lhe assegura
lugar de destaque entre as histórias concorrentes. Pois não
é que uma empresa de transprote de carga teve de usar seus funcionários
e equipamentos para reparar as estradas esburacadas, mesmo pagando os tributos
devidos para que tais estradas sejam mantidas em boas condições?
A empresa desistiu de esperar que
as autoridades cumprissem suas obrigações. Fazendo as contas,
descobriu que ainda ficaria mais barato reparar as estradas do que suportar
todos os prejuízos causados aos seus veículos e às
cargas transportadas pelas más condições das rodovias.
Temos assim a surreal situação de o governo fingir que paga
para empresas fingirem que arrumam as estradas, enquanto a empresa que
realmente paga a conta ainda tem de pagá-la uma segunda vez, executando
ela própria o serviço que caberia ao governo e às
empreiteiras...
É por conta de situações
como essa que 30% da produção agrícola brasileira
é perdida entre a porta da fazenda e o porto (com a inestimável
contribuição da falta de armazenagem). Também por
isso é que certas estradas, ditas asfaltadas nos mapas oficiais,
estão em terra pura, sem ao menos o cheirinho da lama asfáltica
ralinha que alguns aplicam para dizer que asfaltaram.
Como se já não bastasse
a besteira maior que é a completa inversão da matriz de transportes
no Brasil: enquanto nos países mais desenvolvidos a prioridade é
para o transporte fluvial, seguido pelo ferroviário e só
depois pelo rodoviário e aéreo, no Brasil
o caro transporte rodoviário representa a quase totalidade, com
apenas traços estatísticos para o aéreo, o ferroviário
e o hidroviário. Não se estranhe, portanto, que o chamado
Custo Brasil seja tão alto.
E a denúncia - mostrando em
termos práticos como funciona a promiscuidade nas relações
entre o setor público e a (iniciativa) privada - ajuda a entender
por quê no Brasil viraram de ponta-cabeça a matriz dos transportes.
Está bem azeitada a máquina da bitributação,
que alinha a Taxa Rodoviária Única à cobrança
de pedágios. Quem é que está, efetivamente, interessado
em tornar os produtos brasileiros competitivos no duro mercado internacional?
Está portanto mais do que
justificada a inclusão desse conjunto de histórias no Festival
de Besteiras que Assola a Internet (Febeanet)...
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