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HUMOR
Um gênio consultor

Mais uma história para você rir e depois refletir e comparar com a vida real. Foi postada por Manoel Meirelles na lista de debates sobre negócios Widebiz, em 14/8/2001:

Mello tinha mandado derrubar uma parede do escritório, e atrás dela descobriu uma garrafa velha, com uma forma estranhíssima. Quando ele tentava tirar a poeira da garrafa, ela fez "puf!" e um sujeito apareceu do nada.

Executivo experimentado e acostumado a avaliar pessoas num relance, o Mello percebeu logo de cara que o "aparecido" era suspeito, porque não estava usando o crachá de visitante. Mas, fora isso, era até uma figura normal: terno e gravata, sapato combinando com o cinto, abotoaduras douradas, turbante, meias da cor da camisa... Opa, turbante?!??

* Eu sou o gênio da garrafa, e vou atender a um desejo seu.

Se não estivesse sonhando, o Mello acharia que aquilo era alguma gozação do pessoal do quinto andar. Mas, como pesadelo tem dessas licenças poéticas, o Mello respondeu:

* Um desejo? Mas não são três?

* Costumavam ser três - o gênio desengarrafado explicou. Mas a direção da empresa dele havia feito um downsizing no quadro de gênios para melhorar a produtividade sistêmica. Então o serviço acumulou, e alguns desejos estavam com o prazo de entrega estourado. Por isso, só ia dar para atender a um.

* Então tá - o Mello falou. - Eu quero 1 milhão de dólares.

* Não é uma boa idéia... - o gênio ponderou.

* Peraí, que raio de gênio é você? Nunca vi gênio discutir desejo...

* Sou um gênio consultivo. Meu cartão. E, antes de mais nada, você precisa assinar este contrato de "Prestação de Serviços Geniais". Todas as cinco vias, por gentileza. Um gênio consultivo - o Mello ficou sabendo enquanto assinava o contrato, era diferente desses gênios mambembes que andam por aí e que viram fumaça depois de atender ao desejo. Gênios consultivos são comprometidos com os resultados, e por isso têm de primeiro entender as necessidades do cliente, para depois desenvolver e apresentar uma proposta que maximize a solução mais viável para cada caso específico.

* Como você alocaria o milhão de dólares? - o gênio perguntou para o Mello.

* E eu sei lá? Com todo esse dinheiro, eu nunca mais vou me preocupar com alocações.

* Engano seu. Antes de atender a seu desejo, precisamos elaborar um cronograma de investimentos e um cash flow descontado para os próximos 20 anos. Você está pensando em aplicações de alto ou de baixo risco? Local ou offshore?

* Offsh... Escuta, não dá para você me dar logo o meu milhãozinho, e depois eu resolvo?

* De jeito nenhum. Temos um nome a zelar no mercado. Posso lhe fazer uma sugestão?

* Bom, o gênio aqui é você!

* Não peça dinheiro. Peça debêntures conversíveis em ações. Tenho aqui uma dica de uma empresa cujas projeções de médio prazo indicam que o Ebitda...

* Hã?

* Ebitda. Earnings Before Income...

* Eu sei o que é Ebitda! Não é esse o ponto!

* Claro que não. O ponto é se as projeções irão se materializar após o turnaround.

* Não! O ponto é que você está complicando meu desejo! O que eu quero é simples. Uma milha! Uma verdinha em cima da outra, e pronto!

* Você teve muita sorte de eu ser um gênio consultivo, e não um gênio picareta, como há muitos no mercado atualmente. Você tem idéia de quanto é 1 milhão em cash? Mesmo descontando os impostos...

* O quê? Eu ainda vou ter de pagar imposto?

* Claro. Mas não se preocupe. Um gênio associado lhe dará todas as coordenadas para o recolhimento. E ainda há a nossa comissão. Dezoito por cento. Sobre o valor bruto.

* Mas ai não sobra nem metade do dinheiro!

* Correto. E do valor líquido serão deduzidas as despesas extraordinárias, abatidas em parcela única.

* Despesa? E gênio tem despesa?

* Gênio consultivo tem. Você não leu o contrato antes de assinar?

* Não! São quase 100 páginas! Só me diz: no fim das contas, quanto vai me sobrar?

* É difícil calcular antes de comprarmos o sistema de informática e instalarmos o software tailor-made. Mas eu estimaria algo entre 70.000 e 100.000 dólares.

* Mas eu não preciso de sistema, nem de software!

* Sinto, mas está no contrato. Página 49. É inegociável. Além, lógico, dos custos para acompanhamento posterior ao atendimento do desejo, que nós chamamos de "pós-venda in loco". Designaremos um GJ, Gênio Júnior, para lhe dar toda a assistência técnica e jurídica necessária. Os detalhes estão na página 74.

* Mas isso vai torrar o resto do dinheiro. Nesse caso, aumenta aí meu pedido para 2 milhões!

* Hmmm... Ok, tudo bem. Nosso gênio especializado em webdesign havia mesmo
solicitado um reforço na verba, para turbinar o site.

* Que site?

* O seu. Mello Dias ponto-com. Imprescindível para a venda de violinos via
Internet.

* Eu não quero vender violino pela Internet!

* Ai, meu São Eugênio, padroeiro dos gênios! Você tem de diversificar, entende? Abrir novas perspectivas. Avaliar cenários. Assumir que seu portifólio atual vai ficar obsoleto.

* Mas eu não tenho portifólio nenhum. Sou um diretor de uma empresa que vende xampu! Olha, quer saber, esquece o milhão! Me dá só um cafezinho, volta pra garrafa e estamos conversados!

* Açúcar ou adoçante?

* Açúcar!!

* Não é uma boa idéia...

Moral: só tem uma coisa pior que sonhar com gênio que pensa que é consultor. É ter de conviver com consultor que pensa que é gênio...