Aves observadas no Rio Pouca Saúde
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Rio da Pouca Saúde
O que chamamos de rio, na verdade trata-se de uma gamboa. Esta designação, totalmente popular, é o
nome dado a um braço de rio de mangue, que não tem nascente e está sempre sob influência da maré. Tanto que na maré baixa uma gamboa pode ficar
completamente seca (ou mesmo o próprio rio).
O rio da Pouca Saúde, anteriormente denominado "gamboa do Juca", atinge uma região além da estrada da Conceiçãozinha, passando bem ao lado do
Hospital Santo Amaro, em Guarujá (SP). Não se pode dizer que o rio nasce ali, pois uma gamboa não tem nascente. Mas é garantido que ele "morre" ao
passar por ali pelas palafitas existentes ao longo de seu curso.
SURPRESAS NUM RIO ABANDONADO
Em visita ao chamado Rio da Pouca Saúde, constatamos o porquê deste nome.
Palafitas debruçam-se sobre a franja do manguezal, lançando ali toda a sorte de esgoto e lixo doméstico. Por todo o rio, pode-se ver sacos de lixo
boiando e uma fina película de óleo de embarcações recobre a superfície. Nossa visita deu-se num barco da Prefeitura de Guarujá
[1], e nos acompanhavam
dois funcionários da empresa Cargill.
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Entrando no rio Pouca Saúde pelo canal de Santos |
Uma pequena batuíra no meio dos sacos de plástico |
Fotos publicadas com a matéria
Entramos no rio tendo a Citrosuco à nossa direita, e um pequeno banco de lodo à
esquerda. Nele, pequenos caranguejos chama-maré (Uca sp.) moviam-se rapidamente e entravam em suas tocas com a aproximação do barco. Ao longo
das margens, avistamos bandos de socós-caranguejeiros (Nyctanassa violacea), um notável habitante dos manguezais, predador de caranguejos.
Alguns urubus (Coragyps atratus) empoleiravam-se nos galhos e caules-escora dos mangues-vermelhos (Rizophora mangle), de onde
observavam o rio à procura de peixes mortos. Para eles, alimento ali não era problema.
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Palafitas lançando esgoto e lixo doméstico no manguezal |
Casal de quero-queros |
Fotos publicadas com a matéria
Algumas garças-brancas-pequenas (Egretta thula) corriam nas margens lodosas,
pescando pequenos peixes. Sua bicada é certeira, e raramente erra o alvo. Um longo pescoço de repente emergiu da água escura, e então vimos um biguá
(Phalacrocorax brasilianus) que pescava mergulhando atrás de suas presas. É impressionante como o biguá consegue enxergar os peixes debaixo
das águas turvas, principalmente num rio como esse.
De repente, um bando de agitados passarinhos azuis cruza o rio voando, indo pousar numa alta árvore
de mangue-branco (Avicennia shaueriana). Eram os alegres figuinhas-do-mangue (Conirostrum bicolor), uma espécie extremamente adaptada
à vida nas árvores do manguezal. Eles cantavam sem parar enquanto procuravam por insetos nas folhas do mangue.
Em poucos segundos, um casal de
marrecas-toucinho (Anas bahamensis) sobrevoa a superfície do rio, passando ao lado do nosso barco, e logo desaparece na próxima curva.
Ficamos muito surpresos por encontrar aves vivendo num rio que, como o próprio nome já diz, não é dos mais saudáveis. Mas nós ainda nem imaginávamos
o que estava por vir...
Barco da Secretaria de Meio Ambiente de Guarujá para fiscalizar as áreas de preservação [1]
Foto publicada com a matéria
Diminuímos a velocidade do barco, pois o motor já estava quase encostando no leito. Aquele era um
trecho raso, onde era preciso tomar muito cuidado para não encalhar. Desligamos o motor e deixamos que a maré enchente nos levasse até uma margem
onde, ao invés de árvores de mangue, cresciam palafitas.
Nossa presença foi rapidamente anunciada por um casal de quero-quero (Vanellus chilensis)
que procurava alimento no lodo. Mas foi só chegar mais perto e vimos que eles não eram os únicos que se alimentavam ali. Pequenos batuíras-de-bando
(Charadrius semipalmatus) corriam velozmente, como se tivessem rodinhas nos pés.
Mais adiante, um grande bando de maçaricos-de-perna-amarela (Tringa flavipes) também se
alimentava, caminhando na beira da água com suas longas pernas amarelas. Ambas são espécies migratórias, que “fogem” do Canadá quando chega o
implacável inverno. Então, um bando de oito maçaricos-pintados (Acitis macularia) passa voando rente à água. Eis aí outra espécie vinda do
Hemisfério Norte.
Ficamos mais que contentes ao ver que aves migratórias ainda utilizam nossos agonizantes manguezais
como ponto de repouso e alimentação. Não há como não pensar na distância que estas aves percorrem para aproveitar o calor e a generosa abundância de
alimento dos trópicos.
É uma pena que nós não possamos oferecer uma hospedagem melhor, sem poluição. Rios mais limpos e
manguezais mais saudáveis atrairiam não só as aves de fora, mas também turistas interessados em observar e admirar a natureza.
[1]
Agradecemos o Secretario do Meio Ambiente de Guarujá, Elcio Maceió, pela apoio.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRETAS, E. & SIGRIST, T: Desenho Científico de Aves. Anais do V Congresso Brasileiro de
Ornitologia, UNICAMP, Campinas, 1996.
FRISCH, J.D. & FRISCH C.D. Aves Brasileiras e plantas que as atraem.
Dalgas Ecoltec, SP. 2005
HÖFLING, ELIZABETH-ALMEIDA DE CAMARGO, HÉLIO F: Aves no Campus – Edusp. São Paulo (3ª Edição), 1999.
MOORE, HOWARD R, A:. A complete checklist of te birds of the world. 2. ed. London, Academic Press. 622 p. 1991.
OLMOS, F & SILVA, R.S. Guará-Ambiente, Fauna e Flora dos Manguezais de Santos-Cubatão. Ed. Empresa das Artes, SP 2003
RUSCHI, AUGUSTO: Aves do Brasil – Editora Rios, São Paulo, 1981.
SCHAUENSEE, R.M: A Guide to the Birds of South America. ICBP, 498 p., 1982.
SICK, HELMUT: Ornitologia Brasileira. Ed. Nova Fronteira, 1997.
SOUZA, DEODATO: Todas as aves do Brasil. Editora DALL. 1998.
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BIGUÁ: Phalacocorax brasilianus
Ordem: PELICANIFORMES
Família: phalacrocoracidae
Comprimento: 33 cm
O Biguá é a maior das 29 espécies do seu grupo. É uma ave grande, de asas curtas, maxila superior curva e com os 4 dedos do pé ligados por uma
membrana. Ele nada e mergulha atrás de presas aquáticas, mas depois do banho, precisa abrir as asas para secá-las. Não desenvolveu, como outras
aves marinhas, o óleo protetor de penas. Em compensação, a ausência do óleo permite maior agilidade na hora do mergulho. Muitos biguás fazem
ninho em penhascos ou árvores, utilizando gravetos, algas e outros vegetais coletados no local. Fazem turnos para a incubação de seus três a
cinco ovos, durante um mês, até os filhotes saírem da casca. |
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GARÇA-BRANCA-GRANDE: Ardea alba
Ordem: CICONIFORMES
Família: Ardeidae
Comprimento: 90 cm
A garça é uma ave pernalta que vive na borda dos rios, nos mangues e estuários. Para pescar, corre nas margens atrás de cardumes ou move
rapidamente um dos pés sob a água para atrair suas presas. Durante a época de reprodução ambos os sexos vestem as plumas delicadas que se eriçam
durante a dança nupcial. Reproduz-se em colônias chamadas ninhais, nos quais podem ser encontradas centenas de ninhos. O casal se reveza na
incubação. Quando nascem os filhotes, fornece-lhes alimento regurgitado. |
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GARÇA-BRANCA-PEQUENA: Egretta thula
Ordem: CICONIFORMES
Família: Ardeidae
Comprimento: 55 cm
Este espécie distingue-se da garça-branca-grande, não só pelo tamanho mas também por apresentar as pernas e o bico negros e os dedos dos pés
amarelos. Nesta garça, durante o período de reprodução, as egretas aparecem em ambos os sexos no dorso, na cabeça e no peito. Alimenta-se de
peixes e invertebrados capturados comumente dentro d’água. Numa plataforma de galhos secos sobre uma árvore, a fêmea põe de 3ª 7 ovos. Durante
25 a 26 dias, o casal se reveza na incubação. Quando nascem os filhotes, fornece-lhes alimento regurgitado. |
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SOCÓ-CARANGUEJEIRO: Nyctanassa violácea
Ordem: CICONIFORMES
Família: Ardeidae
Comprimento: 43 cm.
Habitante do manguezal, o socó-caranguejeiro, como não poderia deixar de ser, é um especialista em caranguejos. Possui grandes olhos vermelhos
para enxergar à noite, hora em que a maioria dos caranguejos está em atividade. Para caçá-los, caminha lentamente em meio ao manguezal,
capturando-os de emboscada. Na época da reprodução, as pernas do socó-caranguejeiro ficam vermelhas e eles saem por aí exibindo suas belas
cristas uns para os outros. É uma espécie vulnerável, pois depende dos caranguejos que também são muito procurados pelo homem. |
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SOCÓ-DORMINHOCO: Nycticorax nycticorax
Ordem: CICONIFORMES
Família: Ardeidae
Comprimento: 60 cm
A sua posição preferida é a horizontal, estendendo o pescoço e a cabeça com frequência. Durante a pesca, fica parado equilibrando-se num galho e
inclina-se para frente até encostar o bico na água. Nos momentos de excitação, eriça as penas do topete e agita as retrizes para cima e para
baixo. O socó se alimenta de peixes, anfíbios, pequenos répteis e invertebrados capturados dentro d’água. Constroem uma plataforma de galhos
numa árvore. Nesse ninho, a fêmea põe 3 ou 4 ovos. O período de incubação é de 21 a 23 dias. |
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SOCOZINHO: Butorides striatus
Ordem: CICONIFORMES
Família: Ardeidae
Comprimento: 35 cm.
Este é um pássaro solitário que vive em qualquer área alagada. Quando voa, emite um grito parecido com um “tchau”, que chama a atenção para a
sua presença. O socozinho é famoso por jogar pão ou folhas na água para atrair os peixinhos. Aí, é só esperar para encher o papo! Ao contrário
das outras espécies da família não se agrupa em colônias durante a reprodução. O ninho, como uma plataforma, é construído com galhos secos e no
alto de árvores. |
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URUBU: Coragyps atratus
Ordem: CATHARTIFORMES
Família: Cathartidae
Comprimento: 60 cm
O urubu é o menor dos abutres americanos, todos eles aparentados com o condor dos Andes. Essa ave pode ser vista planando nos céus de todas as
Américas. Como um espectador indolente, ele paira lentamente por sobre os cumes das árvores. É comedor de cadáver e se não pode encontrar um
bicho morto, caça rãs, lagartos e pequenos roedores. Os filhotes nascem em ninhos construídos no chão ou em arbustos espinhosos. As penas da
cabeça e do pescoço caem após seis semanas, pondo à mostra uma pele enrugada e azul-escura. Possuem uma excelente visão, podendo enxergar um
animal do tamanho de um gato a uma distância de três quilômetros. |
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IRERÊ: Dendrocygna viduata
Ordem: ANSERIFORMES
Família: Anatidae
Comprimento: 45 cm.
Um dos patos mais comuns do Brasil, vive até mesmo em áreas urbanas. Passam o dia agrupados nos locais onde se alimentam. À noite deslocam-se
para a área onde dormem. Voam em grandes bandos, às vezes de milhares de aves, voando em forma de um grande "V". Enquanto fazem seu voo noturno,
é comum ouvir seus gritos: irerê...irerê. Encontramos um grupo de nove irerês descansando numa margem lodosa do brejo do CING em julho de 2005,
mas eles não foram mais vistos. |
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MARRECA-TOUCINHO: Anas bahamensis
Ordem: ANSERIFORMES
Família: Anatidae
Comprimento: 45 cm.
Esta bela espécie vive em ambientes alagados, estuários e manguezais. Suas penas são dispostas de uma forma muito compactada, evitando a
penetração de água. Em determinada época do ano, quando troca de plumagem, a marreca-toucinho fica impossibilitada de voar. Não se sabe de onde
vem seu nome popular. Talvez seja porque o gosto de sua carne lembra toucinho. A característica peculiar do bico é o seu formato achatado,
parecendo uma espátula. Há um bando de dezenas de marrecas-toucinho que utilizam o brejo do CING nos meses de inverno. |
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CARRAPATEIRO: Milvago chimachima
Ordem: FALCONIFORMES
Família: Falconídae
Comprimento: 40 cm.
É uma espécie muito comum, que vive em áreas abertas de quase todo o Brasil. Possui o hábito de pousar sobre o gado doméstico para se alimentar
de carrapatos, o que dá origem ao seu nome popular. Seu grito é um 'kiliá', parecido com o do gavião-carijó (Rupornis magnirostris),
porém mais rouco, emitido constantemente em vôo. Costuma patrulhar as estradas e praias atrás de animais mortos. |
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BATUIRA-DO-BANDO: Charadrius semipalmatus
Ordem: CHARADRIIFORMES
Família: Charadriidae
Comprimento: 15cm.
Esta espécie pode ser encontrada em bandos nos manguezais e bancos de lodo, onde se alimenta dos micro-crustáceos que encontra na lama. Pode-se
observar alguns bandos principalmente nos manguezais às margens do Rio Santo Amaro e no brejo do CING, onde sua cor faz com que se confundam com
o lodo. A batuíra-de-bando permanece na região até meados de agosto, quando voam para o Ártico para se reproduzir, retornando no começo de
setembro. Apesar disso, alguns exemplares permanecem na região o ano todo. |
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BATUIRUÇU: Pluvialis dominica
Ordem: CHARADRIIFORMES
Família: Charadriidae
Comprimento: 15 cm.
Esta espécie aparece em nossa região entre setembro e dezembro, quando vem do Ártico. Não é muito abundante, mas alguns exemplares podem ser
avistados no brejo do CING. Como é comum em muitas aves marinhas e aquáticas, possui uma plumagem no inverno e outra totalmente diferente no
verão. Vive à beira d’água e é bastante confiado, permitindo uma certa aproximação do homem. Faz o ninho nas distantes costas árticas, onde põe
normalmente de três a quatro ovos. É também chamado de batuíra-do-campo. |
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QUERO-QUERO: Vanellus chilensis
Ordem: CHARADRIIFORMES
Família: Charadriidae
Comprimento: 35 cm.
É uma espécie muito conhecida, podendo ser encontrada em qualquer área descampada, mesmo dentro das cidades. Sua voz é muito característica,
lembrando "quero-quero", o que originou o nome comum da espécie. Vive em casais, mas eventualmente pode formar grandes bandos. O ninho é uma
cavidade rasa no solo que o casal defende com bravura, atacando com voos rasantes quem quer que se aproxima, como cães ou até mesmo o homem.
Seus voos rasantes assustam mesmo. Além disso, possui em cada asa um esporão laranja usado como arma de defesa. |
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MAÇARICO-DE-PERNAS-AMARELAS: Tringa flavipes
Ordem: CHARADRIIFORMES
Família: Scolopacidae
Comprimento: 33 cm
Esta espécie se reproduz entre maio e agosto no ecossistema chamado taiga, no norte do Canadá e Alasca. Assim que os filhotes tornam-se
independentes, os maçaricos começam a migrar para o sul, fugindo do longo inverno boreal. Esses gringos chegam em nossa região entre agosto e
setembro, quando podem-se encontrar bandos que chegam a ter até cem indivíduos. Esses bandos permanecem nos manguezais da Baixada Santista,
enchendo a barriga e descansando da longa viagem – daí a importância de se preservar estes ecossistemas. No brejo do CING encontramos
maçaricos-de-perna-amarela mesmo durante a época de reprodução. |
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MARTIM-PESCADOR: Ceryle torquata
Ordem: Coraciiformes
Família: Alcedinidae
Comprimento: 40 cm
O martim-pescador se alimenta de peixes, capturados dentro d’água. Observa suas presas desde um alto poleiro. Na ausência de um poleiro de
observação, o martim-pescador pode pairar no ar peneirando, como fazem alguns gaviões. Constroem o ninho em barranco, escavando-o com auxílio
dos pés, um túnel horizontal, mede de 1 a 2 metros de comprimento onde são postos cerca de 4 ovos. Os membros do casal incubam os ovos; eles se
revezam nesta tarefa a cada 24 horas. |
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