Dona Teodorinha
Aos quarenta e cinco anos, fatigado de sua vida monótona de
solteiro - à qual algumas noites dormidas fora de casa davam maior tristeza -, Guedes resolveu encontrar uma criatura amável para viver como casado. Era um homem discreto, recolhido, melancólico talvez. Da sua obscura carreira de funcionário
público constavam alguns elogios na fé de ofício e uma reputação impecável de confiança.
- Homem de confiança, o Guedes.
Estava agora como chefe de seção. Ainda tinha pretos os cabelos. Um pouco de calvície, uma calvície insinuante e vagarosa, lhe invadia a fronte. No
bigode caído, despretensioso, que ele por hábito alisava sem torcer, brilhava às vezes um fio de prata.
Guedes sentia-se envelhecer.
Não lhe era fácil encontrar no Rio de Janeiro uma mulher a seu gosto para a vida em comum. Seria preciso uma que, mais moça do que ele, tivesse no
entanto a mesma alma cansada e fria.
Guedes não gostava de relações. Dava-se apenas com duas ou três famílias, cerimoniosamente, visitando-as de vez em quando em dias marcados. Assim, o
problema do seu ménage estava dificílimo de resolver. Não só não dispunha de conhecimentos que lhe favorecessem o encontro desejado, como a criatura devia ter o seu temperamento especial.
Entretanto, Guedes encontrou d. Teodorinha.
Guedes morava na Rua do Riachuelo, numa casa de cômodos. Uma casa respeitável e asseada, em que os moradores ficavam, em geral, quatro, cinco, seis
anos a seguir. Ele estava há onze, por exemplo.
Aconteceu que, tendo morrido um italiano velho, seu vizinho da esquerda, o quarto naturalmente ficou vago e veio para ele, dias depois, d. Teodorinha.
Era uma senhora de trinta anos, mais ou menos, um tanto baixa, um tanto gorda, silenciosa, grave.
Na mesma manhã da mudança, quando Guedes saía para a repartição, ela apareceu de súbito à porda, tomando uma atitude de reserva:
- O cavalheiro vai perdoar-me. Pode dizer-me as horas:
- Pois não, minha senhora.
E Guedes puxou de seu enorme relógio de ouro:
- Nove horas e quarenta e cinco minutos.
- Muito obrigada.
E ia retirar-se. Então Guedes, tendo simpatizado com a aquele misto de franqueza e reserva, tirou o chapéu e perguntou respeitosíssimo:
- Vossa Excelência é a nova moradora?
- Sim, senhor.
- Eu sou Guedes, um seu criado, morador aqui há onze anos. Às suas ordens, minha senhora.
E saiu com uma agradável impressão de esquisito alvoroço.
No dia seguinte a arrumadeira o informou de que a vizinha se chamava d. Teodorinha.
Durante toda aquela semana não tornou a vê-la. Apenas, pela manhã e à tarde, ouvia rumor de passos, ou de uma cadeira arrastada, ou de uma janela que
se fechava no quarto de d. Teodorinha.
Guedes começou a sonhar com d. Teodorinha. Via-a em camisa, ao deitar-se, o cabelo solto, olhando-se pela última vez no espelho...
No domingo - Guedes era católico praticante - foi, como de costume, à sua missa das 9 horas na igreja de Nossa Senhora da Lapa. Ajoelhou-se, rezou.
Olhou de pois a multidão, distraidamente. E quando, por último, se voltou para o lado, viu ali junto dele, quase a roçar-lhe o fraque preto, d. Teodorinha. Fez um leve movimento com a cabeça, a que ela correspondeu em silêncio, continuando a
oração. Aí pôs-se a observá-la: era fresca, bonita, uma pele aristocrática. Um tanto baixa, um tanto gorda, porém com um porte distinto. Uma senhora fina.
De então por diante, Guedes ficou considerando d. Teodorinha a criatura ideal para o seu ménage sonhado. No entanto, o caso se apresentava com
obstáculos. Ela não oferecia a menor oportunidade para uma palestra. Ele por sua vez ignorava a situação dela. Casada? Viúva? Solteira? Com família? Sem família? Em que se ocupava? Professora? Talvez professora.
À proporção que o tempo corria, Guedes, de ordinário tão tranquilo e pausado, sentia crescer dentro dele uma impaciência. Agora forçava os encontros
com a vizinha: espiava as suas horas de sair (e ela saía pouco); punha-se à janela; aos domingos ia postar-se perto de d. Teodorinha na igreja. E d. Teodorinha, sempre distraída e severa, parecia ignorar completamente a existência dele.
Uma noite Guedes estava à janela fumando, a olhar o morro de Santa Teresa. D. Teodorinha apareceu. Ele cumprimentou:
- Boa noite.
- Boa noite.
Tremeu. A ocasião era admirável para uma palestra.
- Linda noite não?
- Um pouco abafada.
Excelente. D. Teodorinha estava com boas disposições.
- Entretanto, temos o ar do morro, que é agradável.
- É o que nos vale.
Então discretearam sobre vários assuntos, devagar, docemente. D. Teodorinha ficou sabendo que Guedes era chefe de seção no Ministério da Justiça; que
era solteiro, que não tinha parentes no Rio; e que à falta de vida mais interessante, deixava os dias correrem naquela monotonia sem ideais. Apreciava o seu teatro, o seu cinema, o seu passeio à Tijuca, ao Silvestre, ao Corcovado. Era feliz.
De d. Teodorinha, porém, não soube nada a não ser que tinha parentes no Paraná. A impressão que ela lhe dera fora a de que um drama lhe desmanchara a vida. Um mistério a
cercava.
Daí por diante foram-se tornando mais íntimos. D. Teodorinha via que ele era um homem digno, educado, de confiança. Começou a aceitar pequenos presentes: frutas, doces,
flores. Três ou quatro meses se tinham passado depois de sua chegada à casa e era perfeitamente natural manter relações amáveis com um vizinho tão considerado como o sr. Guedes.
De fato, Guedes era muito considerado naquela casa asseada e respeitável da Rua do Riachuelo. Não só por ser o mais antigo morador, como também pela sua conhecida posição
no Ministério da Justiça. Ninguém poria reparo ou malícia nas suas relações com d. Teodorinha.
E acabaram combinando morarem juntos.
***
Foi numa noite em que ele disse para d. Teodorinha, cada um na sua janela, conforme o hábito:
- estou sentindo umas dores de estômago.
Passados uns momentos, tornou a queixar-se:
- Estou sentindo umas dores de estômago, d. Teodorinha.
D. Teodorinha inquietou-se:
- Muito fortes?
- Alguma coisa.
- O senhor aceita um chá de macela?
Guedes hesitou, até que se decidiu:
- Aceito, d. Teodorinha.
- Eu vou fazer. Com licença.
E retirou-se da janela. Guedes ficou ali sentindo a poesia da noite de luar. No morro de Santa Teresa havia palacetes iluminados. De umas casas pobres embaixo, vinha a
música sacudida e langorosa de um choro. E exclamações malandras, amortecidas na distância:
- Aí, meu nêgo!
- É agora!
- Tô só tirando uma linha...
Guedes não gostava da alegria popular. Também não apreciava aquela música plebeia. Era insensível ao característico e ao pitoresco. Ficou a relembrar, então, enquanto
esperava o chá de macela na noite de luar, um concerto a que fora no mês anterior. Guedes adorava os concertos, que frequentava escondido, a dissimular-se no fim da sala.
D. Teodorinha apareceu de novo à janela.
- Está quase pronto. Quer vir tomar aqui?
Guedes teve um escrúpulo que o seu silêncio confessava.
D. Teodorinha mostrou energia:
- Ora, seu Guedes, venha. Sou uma senhora independente e não preciso dar satisfações a ninguém. Venha. Só lhe peço que não repare na pobreza dos móveis.
Entrando no quarto de d. Teodorinha, sentiu-se passar para um outro mundo; aspirou com disfarçada volúpia o indefinível aroma da intimidade feminina. Pensou em como seria
bom sentir sempre aquele aroma, todos os dias: pela manhã, ao sair de casa para o trabalho; à tardinha, voltando para o jantar...
- Sente-se. Não repare em nada.
Ao fundo, o leito estava separado do resto do quarto por um biombo. O guarda-vestidos e o toucador, dos lados, faziam daquele canto como que um aposento separado.
Perto da entrada estava a mesa pequena das refeições, encostada à parede, e coberta com um pano verde, e móveis leves, de bambu japonês: uma mesinha redonda e cadeiras.
Via-se que d. Todorinha era pobre, mas procurava dar um ar gracioso à sua modéstia. Vasinhos de flores não faltavam, nem aquarelas pelas paredes.
Tudo isso abrangeu o olhar feliz do Guedes, ao sentar-se à mesinha redonda sobre a qual d. Teodorinha pusera a sua fumegante xícara de chá. Confirmava-se a impressão: os
vasinhos de cristal, as aquarelas, as mesinhas e as cadeiras de bambu japonês ao centro do quarto eram os restos de uma vida desfeita, a destoar do tom amarelo e intruso dos móveis de aluguel.
E só depois de levar à boca os bordos quentes da xícara de porcelana, Guedes percebeu o motivo de um certo bem-estar, que não era dos móveis, nem do cheiro de intimidade
feminina, nem do bom gosto com que d. Teodorinha sabia arrumar o aposento: à meia altura do teto, o abajur verde coava uma quase penumbra deliciosa.
Guedes elogiou d. Teodorinha. Ela era de natural reservada, mas não tímida. Ouviu os elogios em silêncio, como se estivesse convicta de os merecer. Guedes falou-lhe,
principalmente, que sempre lhe agradaram muito os olhos dela.
Conversaram. Houve um momento em que não se conteve e disse:
- A senhora tem na sua vida uma grande dor.
Ela respondeu simplesmente:
- Tenho. Infelizmente não posso, como era de meu desejo, contar-lhe qual é.
Isso acabou de seduzir Guedes, que então, respeitoso, propôs:
- Vamos casar-nos, d. Teodorinha?
Disse e sentiu o sangue parar. O seu projeto não era propriamente casar. Queria apenas uma moça discreta para com ela viver em boa paz, com doçura. Mas d. Teodorinha
surgia-lhe com uma sedução tão profunda e grave, que ele não se atreveria a propor-lhe uma união, simplesmente, nuamente.
D. Teodorinha olhara-o com naturalidade, sem surpresa. Guedes sentiu-se um tanto desapontado. Ela deixou passar uns minutos, movendo a colher dentro do açucareiro,
distraída. Por fim, respondeu:
- Sou casada.
E um silêncio alargou-se pelo quarto.
Guedes talvez já esperasse por aquela resposta. A certeza, porém, de que existia um homem que podia entrar ali naquele momento e dizer: "Teodorinha, quem é esse
sujeito?", produziu-lhe uma sensação de coisa ilícita.
No silêncio que se fizera, as vozes do choro, nos cortiços de Santa Teresa, cresceram nítidas:
- Aí, seu Barros!
- Tô firme, cabôco!
Guedes bebeu o resto do chá de macela, já frio. Tomou coragem:
- Podíamos esconder-nos aí num canto da cidade, em Paula Matos, ou na Gávea.
- Não seria preciso isso. Meu marido não tem o menor direito sobre mim, nem eu sobre ele. Estamos separados há oito anos. Nem sequer nos queremos mal. Somos dois
estranhos. Esquecemo-nos.
Então Guedes, sentindo que achara a felicidade, com a comoção dos homens quando acham a felicidade, abaixou a cabeça sobre a mesa e beijou a mão branca de d. Teodorinha.
***
No Ministério da Justiça, Guedes tinha apenas três amigos: o Pires, primeiro oficial, inteiramente calvo, bilioso, carregado de filhos; o Sousa Júnior, rapaz fino,
discreto, boa pessoa; e o Caldas, um velho agressivo.
Só um mês depois da sua nova instalação é que fez constar que se casara. Apenas aos três comunicara a verdadeira situação, secamente, sem pormenores:
- Estimo-a como se fosse minha esposa.
Guedes era feliz. Teodorinha mostrava em todas as situações o tato das mulheres que sofreram. Nunca falava do seu passado. Guedes também não tocava nesse ponto. Assim,
viviam tranquilos. Moravam na Avenida Mem de Sá, numa casa nova e pequena perto da Rua do Senado. Teodorinha arranjara tudo com o seu bom gosto encantador. Guedes pensava às vezes, com tristeza, no conforto que perdera não encontrando há mais tempo
aquela mulher.
Depois da repartição, voltava para casa com embrulhos. Gozava, intimamente, a sensação do homem que tem o seu ninho secreto.
À noite, quase sempre, iam ao teatro, ou ao cinema.
- Meu bem, para onde nos atiramos hoje?
Teodorinha respondia:
- Para onde você quiser.
Depois, lembrando-se de alguma coisa que lhe dissera a propósito, de manhã:
- Você não falou que tem vontade de ver a peça que estão levando no Trianon?
- Mas acho melhor deixarmos para amanhã. No Central há uma fita alemã muito boa.
Apesar de serem felizes assim, começaram, depois de alguns meses a sentir necessidade de relações. Haviam combinado, de começo, nunca receber ninguém. Agora verificavam
que era necessário abrir a porta a um ou ouro amigo muito íntimo, para distraí-los. Então Guedes propôs experimentar o Caldas.
Caldas, áspero, foi lá jantar um dia. Mas Teodorinha não gostou.
- Não sabe nem tomar a sopa. Pinga-me toda a toalha. Depois espalha cinza de cigarro pelo chão.
Guedes achou razoável aquele escrúpulo, embora considerasse o Caldas interessante justamente por causa da sua inadaptabilidade às boas maneiras.
- No fundo, é um sujeito excelente.
- Mas não tem educação.
Guedes levou depois o Pires com o Sousa Júnior. Dissera-lhes na véspera:
- Amanhã, tenho lá em casa uma peixada para vocês.
Esse amanhã era um domingo. Pires propôs logo comparecer com a mulher e alguns filhos. Sousa Júnior, fino, sorriu da ideia. Guedes opôs-se:
- Minha mulher não está avisada. Além disso, a casa é pequena.
Tratava Teodorinha de "minha mulher", mesmo entre eles, que sabiam da espécie da ligação. E o Caldas sentia naquilo uma vaga ofensa à sua pessoa de homem casado no civil
e no religioso.
Foram à peixada.
Pires portou-se de um modo admirável: comeu exageradamente, o que lisonjeou d. Teodorinha; Sousa Júnior, porém, agradou pelos modos discretos. Sabia ouvir as pessoas
sorrindo, com simpatia, atento, mostrando prazer.
- Traga sempre o Sousa. Parece ser um bom rapaz.
- Eu não lhe dizia?
Sousa Júnior ficou sendo o amigo habitual. Estava quase sempre lá. Saíam juntos para o teatro. Pediam-lhe pequenos favores, que trouxesse um livro, ou descobrisse uma
receita de doces. E só quando havia peixada convidavam o Caldas ou o Pires.
***
Um sábado, à hora do jantar, o Guedes, entrando na Casa Carvalho para comprar uns doces, escutou uma voz:
- É o Guedes?
Voltou-se: Peregrino Pereira, seu velho, seu único amigo do colégio, estendia-lhe os braços. Não se viam há muito tempo.
- Há quinze anos, Peregrino?
- Há dezessete, Guedes!
Peregrino chegara do Norte. Era fiscal do Imposto de Consumo. Andava sempre pelos Estados, transferido daqui para lá. Viera ao Rio para apresentar-se ao ministro.
Sentaram-se ali mesmo para o aperitivo. E Guedes, num extraordinário entusiasmo, convidou-o:
- Vai jantar comigo.
- Com prazer, meu velho.
- Sabes que eu casei?
Peregrino estendeu-lhe a mão:
- Toque. É a melhor coisa que um homem pode fazer na vida.
E, em seguida:
- Vou telefonar a minha mulher avisando-a de que não me espere para jantar.
Daí a pouco Peregrino voltava. Tipo simpático. Apenas um pouco ridículo com aquele passinho miúdo, rápido, por causa da sua figura roliça de velho obeso.
- Essa eterna mocidade, hein, Peregrino?
Guedes também foi telefonar a Teodorinha: ia levar um amigo que chegara do Norte.
Depois, tomaram um táxi.
Peregrino, na sala de visitas, gabou imediatamente o bom gosto que havia em tudo.
- Dou-te os meus parabéns. Tens uma esposa de mão cheia.
E, como Teodorinha chegasse, Guedes apresentou:
- Minha mulher, a quem deves fazer os elogios pessoalmente. O meu amigo Peregrino Pereira.
Peregrino riu-se de um modo franco e caminhou para d. Teodorinha com a mão estendida:
- Meus parabéns pelo seu fino gosto, minha senhora.
Teodorinha pareceu não gostar daquela maneira desembaraçada, porque custou um pouco em levantar a mão, olhando Peregrino com um indisfarçável pesar na fisionomia.
Guedes interveio:
- Agradeça, Teorodinha.
Peregrino pôs-se a contar casos do Norte. "No sertão da Bahia..." Era um conversador. Guedes sabia que Teodorinha não apreciava aquele gênero de criaturas - e que não era
mulher para dissimular a sua impressão. Mas não pudera furtar-se à grande alegria de levar o Peregrino a casa. o Peregrino era para ele o ideal do homem: despreocupado, sadio, alegre, expansivo, sempre jovem. Guedes, recolhido, severo, desejava
secretamente ser assim. Por isso, desde o tempo do colégio se estimavam. Porque, por seu lado, Peregrino invejava a natureza fechada e silenciosa do Guedes.
Acabado o jantar, em que só Peregrino falou, contando intermináveis acontecimentos do Norte, Guedes quis retê-lo para irem os três a um teatro:
- Não posso. Vocês me desculpem eu sair em seguida ao jantar. Minha mulher me espera.
E, lembrando-se:
- Onde é o telefone aqui?
Guedes apontou o aparelho e Peregrino correu para ele. Pediu ligação para o hotel e chamou a mulher:
- Olha, meu bem, dentro de meia hora eu estou aí.
E, voltando à mesa, onde o café fumegava, aceitou o charuto que o Guedes lhe estendia. Contou ainda um ataque de cangaceiros a uma vila de Alagoas e só depois é que se
retirou, com grandes curvaturas para d. Teodorinha.
Então, o Guedes, que o acompanhara até à porta, perguntou a Teodorinha, regressando à sala de jantar:
- Que tal?
Teodorinha deu de ombros. Guedes insistiu:
- Alma excelente. Há trinta anos que nos damos. Desde a escola. Sempre assim, magnífico.
Peregrino não fizera impressão sobre Teodorinha - notara Guedes durante o jantar. Nem agradável, nem mesmo desagradável, como seria de prever por causa daquele gênio
expansivo que o tornava um pouco vertiginoso.
Mas Guedes queria que Teodorinha partilhasse de seu velho afeto e de sua admiração pelo amigo.
- Olha, convidou-nos para almoçar amanhã com ele e a senhora, no hotel.
Nessa altura Teodorinha explodiu:
- Estás doido!
Guedes ficou espantado. E ela concluiu, raivosa, mostrando pela primeira vez uma vibração que Guedes nunca lhe descobrira:
- Esse homem é que é o meu marido! Arre!
Então Guedes arriou todo o peso do corpo na cadeira mais próxima e apoiou a cabeça sobre a mão direita, com o cotovelo fincado na perna. Esteve não sabia quanto tempo
naquela posição, enquanto Teodorinha tirava a mesa. Por acaso, ela deixou cair um prato, que se partiu no chão com um confuso tilintar de cacos. Esse ruído ficou ecoando nos ouvidos de Guedes, longamente... |