Primeira página do jornal A Tribuna de Santos, de 26 de fevereiro de 1984
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Tragédia
Vila Socó ainda recolhe os seus mortos
Centenas de mortos e desaparecidos. Esse é o resultado da tragédia ocorrida, na madrugada de ontem, em Cubatão. Um vazamento
de 700 mil litros de gasolina do oleoduto da Petrobrás, junto à Vila São José, ou Vila Socó, destruiu metade do núcleo habitacional, erguido sobre mangue. Durante sete horas de combate ao fogo, a principal preocupação do Corpo de Bombeiros e da
Petrobrás era em controlar o acidente, que poderia se estender a outras regiões da Baixada.
Até ontem à noite já haviam sido resgatados 67 corpos, enquanto os hospitais registravam 33 internamentos, muitos com risco de vida. O incêndio teria causa acidental, mas diversos moradores das palafitas revelaram que durante todo o dia anterior
foi observada a presença de gasolina no mangue. Muitos populares chegaram a recolher o produto com latas, enquanto técnicos da refinaria, apesar de visitarem o local, não tomaram qualquer atitude.
O presidente da Petrobrás, Shigeaki Ueki, ao visitar a área admitiu a possibilidade de culpa da empresa. Dois inquéritos, um administrativo e outro policial, foram abertos para apurar as circunstâncias e responsabilidades da tragédia. Também o
governador Franco Montoro esteve na Vila Socó, quando pediu a punição dos culpados e considerou previsível o acidente.
Ontem mesmo vários corpos foram enterrados durante a tarde, quando o prefeito José Osvaldo Passarelli decretou luto oficial em Cubatão e estado de calamidade na área atingida.
O incêndio teve início por volta de meia-noite, estendendo-se até as 7 horas da manhã de ontem. Guarnições do Corpo de Bombeiros da Baixada, ABC e da Capital lutaram contra o fogo que em pouco tempo destruiu mais de dois mil barracos. Milhares de
pessoas abandonaram a vila, enquanto dezenas ou centenas transformavam-se em tochas humanas para tombarem nas vielas e dentro do mangue. Ao amanhecer, a área totalmente calcinada exibia corpos por todos os lados. Em alguns casos, eram achados em
grupos, indicando tratarem-se de famílias mortas dentro dos cômodos.
O risco do acidente era denunciado há tempos, sem que houvesse qualquer decisão dos poderes públicos. Vila Socó tornava-se conhecida como barril de pólvora, dentro de uma cidade-bomba.
As chamas, em sua marcha avassaladora, destruíram tudo o que encontravam pela frente, semeando a morte e o pânico entre os moradores (Fotos: Anésio Borges e Carlos Marques)
Em poucas horas, mais de dois mil barracos foram consumidos pelo fogo e, ao amanhecer, só restava começar a recolher os corpos espalhados pelo mangue e no meio das ruínas (Foto: Walter Albuquerque) |