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HISTÓRIAS E LENDAS DE CUBATÃO - Poluição
O vale da morte e da vida (20)

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Em meio a uma série de milhares de queimadas de florestas que resultaram numa nuvem de fumaça, levada pelos ventos a cobrir mais de 60% do território nacional, prejudicando fortissimamente a qualidade do ar (que chegou a ser considerado insalubre em lugares como a capital paulista, o portal G1 do grupo noticioso Globo registrou, em 14 de setembro de 2024:


Imagem: reprodução da página com a matéria

'Ex-Vale da Morte', Cubatão foi a única cidade em SP com ar considerado bom nas últimas horas

Na década de 1980, indústrias de Cubatão descarregavam aproximadamente mil toneladas de poluentes atmosféricos por dia. Hoje, a região é símbolo de recuperação ambiental, prova disso é que dados de qualidade do ar da Cetesb atestam a qualidade do ar na cidade.

Por g1 Santos
14/09/2024 13h06 Atualizado há 5 dias

Cubatão (SP) já foi conhecida como "Vale da Morte" e considerada a cidade mais poluída do mundo pela Organização das Nações Unidas (ONU). Mesmo com um polo industrial ativo, os desastres do passado, que causaram diversas mortes, fizeram com que ações fossem pensadas para promover a mudança no cenário. O resultado da recuperação ambiental, por exemplo, é comprovado em índices da Cetesb. Nos últimos dias, a cidade foi a única do estado a ter a qualidade do ar considerada boa.

Na tarde de sexta-feira (13) foi a única a ter o ar considerado bom, enquanto na manhã deste sábado (14) as cidades de Santos e São Sebastião também figuraram na lista.


Incêndio que atingiu uma unidade da Vale Fertilizantes, em Cubatão (SP), em 2017

Foto: Divulgação/Corpo de Bombeiros, publicada com a matéria

A análise é feita diariamente em diversas estações da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) tanto pela rede automática quanto manual. Os dados são calculados e disponibilizados no portal da empresa pública.

Para atestar a qualidade do ar, é crucial monitorar os valores diários e médios dos poluentes, como partículas inaláveis (MP10 e MP2,5), óxidos de nitrogênio (NO2 e NO), e ozônio (O3).

 MP10: Partículas com diâmetro de até 10 micrômetros. Elas incluem poeira, poluição de veículos e emissões industriais.

 MP2,5: Partículas com diâmetro de até 2,5 micrômetros. São menores e frequentemente originadas de combustão de combustíveis fósseis, como em veículos e indústrias.

 NO2: O dióxido de nitrogênio é um gás tóxico de cor marrom-avermelhada que resulta da queima de combustíveis fósseis em veículos e processos industriais. É um dos principais poluentes atmosféricos associados à formação de smog e ozônio troposférico (na camada mais baixa da atmosfera.

 NO: O monóxido de nitrogênio é um gás incolor e inodoro que é um subproduto da queima de combustíveis fósseis em veículos e processos industriais. Ele é produzido inicialmente durante a combustão e se transforma em dióxido de nitrogênio (NO2) na presença de oxigênio e luz solar.

 O3: O ozônio é um gás com um cheiro característico e é encontrado em duas camadas da atmosfera: a estratosfera, onde forma a camada de ozônio que protege a Terra dos raios UV, e a troposfera, onde é um poluente atmosférico. Na troposfera, o ozônio é formado através de reações químicas entre óxidos de nitrogênio e compostos orgânicos voláteis (COVs) na presença de luz solar.




Mudança na água do rio mostra a recuperação ambiental de Cubatão (SP). À esquerda, 1984. À direita, 2023

Fotos: Globo Repórter. Montagem: g1 - publicadas com a matéria

Mais poluída do mundo

A cidade ficou conhecida como Vale da Morte no começo dos anos 80, quando registrou mortes por problemas respiratórios, nascimento de crianças sem cérebro, céu amarelado e cheiro de enxofre.

O município tem 142,879 km², cortados por rios e mangues, que sofreram o impacto da poluição. Com a Rodovia Anchieta, a cidade tornou-se um grande centro de tráfego de veículos de passeio e de carga entre São Paulo e a região da Baixada Santista. Mas, seu destaque é o grande parque industrial que abriga 24 empresas.

De acordo com a Organização Mundial em Saúde (OMS), as indústrias estão entre os maiores poluidores atmosféricos -- o que foi e continua sendo o maior desafio da cidade, que trabalha para não voltar às condições da década de 80.

Mudanças

A situação, no entanto, mudou após 1984, depois de uma das maiores tragédias ambientais brasileiras, o incêndio da Vila Socó que matou 93 pessoas. Na ocasião, uma tubulação de combustível, que passava pela comunidade, rompeu e espalhou aproximadamente 700 mil litros do produto inflamável pelo mangue.

Isso fez com que as indústrias se unissem aos moradores e autoridades públicas para dar a volta por cima. O plano deu certo e Cubatão e conseguiu controlar 98% do nível de poluentes do ar, recebendo um novo título da ONU, desta vez, Cidade Símbolo da Recuperação Ambiental, em 1992.

Confira abaixo a história da cidade que transformou o 'Vale da Morte' em 'Vale da Vida'


Vila Parisi, em Cubatão (SP), no dia 3 de maio de 1985

Foto: João Vieira/Arquivo A Tribuna, publicada com a matéria

'Vale da Morte'?

O historiador Welington Ribeiro Borges, de 59, saiu de Minas Gerais (MG) e foi para Cubatão aos seis anos de idade. De acordo com ele, na década de 80 as indústrias lançavam aproximadamente mil toneladas de poluentes na atmosfera por dia.

A poluição da água, do solo e do ar, junto à falta de legislação ambiental da época, causou inúmeros casos de mortes por doenças respiratórias e anencefalia -- condição em que o cérebro e o crânio não se desenvolvem. Estes motivos fizeram a cidade ficar conhecida como 'Vale da Morte' e ser considerada a mais poluída do planeta pela ONU.


Problemas respiratórios eram comuns em Cubatão (SP), na década de 80

Foto: Reprodução/Globo Repórter, publicada com a matéria

Vila Parisi

A maioria destes casos, de acordo com Welington, foram registrados na Vila Parisi, um bairro situado no coração das indústrias, ou seja, a maior parte da carga de poluição ficava naquela região. A área deixou de ser habitada após o então prefeito José Oswaldo Passarelli decretar a extinção do bairro.

"Quando trabalhei no arquivo municipal tive contato com uma parte dos formulários de atendimento ambulatorial do antigo pronto-socorro da Vila Parisi. Eram milhares de fichas e, em uma rápida observação, a gente via que a maioria das pessoas era atendida por problemas do aparelho respiratório", lembrou.

Atualmente, boa parte dos moradores da Vila Parisi se concentra no bairro Jardim Nova República. A região que foi extinta, por sua vez, foi transformada em um centro logístico para caminhões.


Sete toneladas de peixes mortos no Rio Casqueiro, em Cubatão (SP)

Foto: Robynson Señoraes/g1, publicada com a matéria

Como os moradores se sentiam?

Welington explicou que a poluição prejudicava ainda mais as pessoas que já tinham problemas de saúde, principalmente, respiratórios. Elas eram obrigadas a se mudar para cidades vizinhas para conseguir sobreviver.

Segundo o historiador, alguns moradores usavam máscaras de proteção para conseguir circular pelo município sem sentir o cheiro de "óleo diesel e enxofre". Além disso, o especialista lembrou que o céu tinha uma camada escura e amarelada.


Dezenas de pessoas morreram durante incêndio na Vila Socó, em Cubatão

Foto: Arquivo A Tribuna, publicada com a matéria

"As pessoas conviviam da maneira como podiam [...]. O sentimento que todos tinham era de não dizer que era daqui [de Cubatão]. Geralmente, dizíamos que morávamos em Santos ou outra cidade da região", disse.


Dezenas de pessoas morreram durante incêndio na Vila Socó, em Cubatão

Foto: Arquivo A Tribuna, publicada com a matéria

Tragédia e recomeço

Uma das maiores tragédias ambientais brasileiras, de acordo com Welington, aconteceu em Cubatão e fez com que as autoridades iniciassem o projeto de recuperação ambiental da cidade. Em 24 de fevereiro de 1984, foram registradas 93 mortes no incêndio da Vila Socó.

O incêndio aconteceu após o vazamento de combustível de um duto que ligava a Refinaria Presidente Bernardes de Cubatão (RPBC) ao terminal portuário da Alemoa. A tubulação, que passava pela comunidade, rompeu e espalhou algo em torno de 700 mil litros do produto inflamável pelo mangue.

"Encerra nesse episódio a história triste da poluição", lamentou o historiador.

Clique na imagem para obter o vídeo
Incêndio da Vila Socó completa 40 anos: veja antes e depois

Foto: reprodução de tela

Mudança

O título de cidade mais poluída do mundo, além de impactar a saúde das pessoas e devastar o meio ambiente, deixou Cubatão com uma imagem negativa mundialmente. Isso só começou a mudar em 1985, um ano depois do incêndio da Vila Socó, quando o Programa de Controle de Poluição Ambiental foi implantado.

Em nota, a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) explicou que o plano de ação foi iniciado por decisão do então governador André Franco Montoro. O principal objetivo do projeto foi controlar as fontes de poluição do ar, água e solo.

Na época, segundo a Prefeitura de Cubatão, foram instalados nas indústrias filtros que conseguiram controlar a emissão de poluentes no ar, além de terem sido estabelecidas normas mais rígidas quanto à utilização de recursos hídricos e despejo de material na natureza.

Ainda de acordo com a administração municipal, foram investidos aproximadamente US$ 3 bilhões, o equivalente a R$ 163 bilhões, na cotação atual. Veja alguma das ações do plano:

??Filtros em chaminés
??Despoluição dos rios e córregos
??Gerenciamento de todos os resíduos produzidos
??Medições das emissões de gases no ar

??Recuperação da Mata Atlântica e replantio de árvores




Antes e depois da Serra do Mar de Cubatão (SP)

Fotos: Divulgação/Cetesb. Montagem: g1 - publicadas com a matéria

Resultado

O programa deu certo. A cidade conseguiu controlar 98% dos poluentes lançados no ambiente e foi reconhecida na Conferência sobre o Meio Ambiente da ONU, em 1992, como Exemplo Mundial de Recuperação Ambiental. Em 2012, na Rio+20, o resultado do plano foi apresentado aos representantes de outros países.

A Cetesb enviou à equipe de reportagem o controle, levantado à época, das fontes de poluição da cidade. Veja abaixo:

Controle de Poluição Ambiental, em Cubatão, entre a década de 80 e 90
Poluição
Fontes autuadas
Fontes controladas
Ar
230
207
Águas
44
44
Solo
46
46
Total
320
297
Fonte: Cetesb

Além dessas, 23 fontes foram desativadas. Atualmente, de acordo com a Cetesb, as fontes autuadas à época possuem controle. Algumas ações continuam sendo realizadas para manter o resultado do programa. Sendo elas:

 Fiscalizar as fontes já controladas

 Acompanhar obras de implantação de novos sistemas de controle

 Realização e acompanhamento de amostragens de sistemas de controle já implantados

 Avaliação de cargas poluidoras em fase de autuação

 Operação para evitar episódios críticos de poluição do ar

 Controle de fontes não prioritárias que passaram a ser significativas após o controle das fontes de maior impacto

 Monitoramento da qualidade dos rios da região

 Renovação das Licenças Ambientais das empresas prioritárias

 Remediação ambiental do complexo industrial

 Adequação dos sistemas de captação e tratamento de águas pluviais contaminadas

O g1 entrou em contato com a ONU para solicitar o ranking atualizado das cidades mais poluídas do mundo, mas não obteve retorno até a última atualização desta reportagem.

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