Olhando pela fresta do tapume
Mário Persona (*)
Colaborador
Em conversa
com o dono de um restaurante, sugeri a ele que seria um bom negócio
vender pizza por meio da Internet. Ele estava familiarizado com o processo
de venda por telefone e, portanto, a idéia seria apenas uma expansão
na forma como os pedidos chegariam até o seu restaurante. Não
haveria a necessidade de qualquer mudança estrutural em seu negócio
ou a contratação de novos funcionários. E o investimento
seria pequeno, bem dentro do que ele poderia suportar. Haveria, isto sim,
uma nova porta de entrada para a sua pizzaria e até mesmo conveniências
impossíveis ao telefone, como permitir ao cliente montar sua própria
pizza na tela do micro.
Ele olhou para mim com uma expressão
que tinha algo de desdém e perguntou: "Mas Internet não é
esse negócio que a garotada usa?" Expliquei que a Internet era uma
ferramenta fantástica para negócios e que eu mesmo trabalhava
em uma empresa especializada em Internet. Enquanto ele procurava amenizar
sua opinião sobre a Internet para não ser indelicado, eu
podia ler seus pensamentos pela expressão de seu rosto. Ele bem
podia estar pensando: "Bom, um dia ele ainda vai arranjar um emprego normal
como todo mundo".
Pesquisa - O comportamento
daquele comerciante expressa bem como a maioria das empresas no Brasil
ainda enxerga a Internet. Mas não é só aqui que muitas
empresas estão ficando atrás da concorrência nesta
área. Uma pesquisa recente feita pelo Yankee Group nos Estados Unidos
demonstrou que 60% das pequenas empresas (2-99 funcionários) e 82%
das médias (100-499) já utilizam alguma forma de acesso à
Internet. Em termos de máquinas, 50% dos micros em pequenas empresas,
e 31% nas médias, estão equipadas com acesso à Internet.
Chris Gwynn, analista de Estratégias
de Marketing do Yankee Group, identifica um processo de três
fases nas empresas - conexão com a Internet, conectividade com clientes
e comércio eletrônico. Mais de dois terços das empresas
pesquisadas ainda não haviam dado o passo em direção
à segunda fase, de conectividade com seus clientes.
O problema, porém, é
mais de ordem cultural e estratégica do que tecnológica.
As soluções existem e a tecnologia caminha a passos largos
para melhorar cada vez mais a velocidade de acesso e navegação
na Internet. Paralelamente, muitas empresas com visão de negócio
já estão há algum tempo utilizando a Internet como
forma de reduzir seus custos operacionais e aumentar a sua lucratividade.
O tapume - O cenário
se assemelha mais a um enorme tapume, desses que escondem a construção
de um moderno shopping center. Se olharmos por uma fresta, veremos
uma atividade febril do outro lado. Empresas de visão que nesta
guinada de século constróem rapidamente uma estrutura de
tecnologia da informação que as coloca na arena da competitividade,
equipadas com os novos conceitos e formas de se trabalhar, comunicar e
negociar. Os que se dão conta de que a Internet é uma realidade,
deixam de ser meros observadores de fresta de tapume. Esses arregaçam
as mangas e direcionam seus esforços no sentido de abocanhar uma
fatia generosa desse novo mercado.
Todavia, a reação de
muitos empresários brasileiros ainda se assemelha à do dono
do restaurante. Uma sobrancelha levantada, um meio sorriso no canto da
boca e a incredulidade de quem diz: "Negócios pela Internet? Ele
deve estar brincando!" Mas não será uma reação
nova. Ela já foi encontrada em um passado recente entre aqueles
que encaravam os primeiros microcomputadores como meros videogames.
Coisas da garotada, que não eram para ser levadas a sério.
O mesmo se dá com os meros
espectadores de Internet que, quando muito, assistem com um olho só
pela fresta do tapume a revolução que está ocorrendo
no mundo dos negócios. Para estes, restará a surpresa de
descobrirem um dia que o tapume foi retirado e que toda a paisagem empresarial
mudou de uma hora para outra. Um novo cenário de negócios
estará consolidado e todo o terreno da oportunidade já terá
sido ocupado por outros. O tempo perdido como espectador poderá
custar caro então para aquele empresário que não quis
participar da empreitada. Para ele, restará apenas um prêmio
de consolação: o conforto de poder encomendar sua próxima
pizza pela Internet.
(*) Mário
Persona é consultor, escritor e palestrante. Esta crônica
faz parte dos temas apresentados em suas palestras. Edita o boletim eletrônico
Crônicas
de Negócios e mantém endereço
próprio na Web, onde seus textos estão disponíveis. |