O que pode vir depois
O Bug do Milênio Revisitado
Mário Persona (*)
Colaborador
O Bug
do Milênio parece andar em círculos. Depois de termos lido
tudo sobre o assunto, alguém se lembra de cantar "Começar
de Novo" e lá vamos nós, embarcados em mais uma rodada de
prognósticos do que pode e não pode acontecer na virada do
ano. Fazendo de conta que ninguém ainda explicou isso, o Bug do
Milênio é causado por uma economia de espaço em programas
mais antigos, quando os programadores utilizavam apenas dois dígitos
para expressar o ano. Isso levará muitos sistemas a interpretarem
o ano 00 como 1900 e não como 2000. A este
bug foi dado o
nome de Y2K ("Y" de year, "2K" de 2000). A sigla é pequena, mas
o problema é grande.
Todo final de século é
prato cheio para previsões alarmistas, e estamos nos aproximando
de um final de século que coincide com um final de milênio.
Sim, eu sei que isso só irá ocorrer na passagem de 2000 para
2001, mas todo mundo decretou que a comemoração deve acontecer
um ano antes da data tecnicamente correta. E para o bug do milênio
a data para ele revelar se é pulga ou escorpião está
correta. Em 31 de dezembro de 1999 alguns sistemas de computador simplesmente
cruzarão os braços.
Tem muita gente envolvida na solução
do problema. Programadores e analistas de sistemas correm contra o tempo
procurando corrigir milhões de linhas de programa e evitar que o
final do ano traga surpresas maiores que a usual visita da sogra e do cunhado.
Batalhões de reservistas, veteranos de linguagens emboloradas, voltaram
à ativa ganhando honestamente salários de quatro ou mais
dígitos por conta dos dois dígitos economizados nos primórdios
da computação.
Boa parte das medidas parece estar
resolvendo o grosso do problema. Um técnico responsável pelo
ensaio feito em todos os aeroportos canadenses comentou que foi até
chato - não aconteceu nada de mais. Muitos bancos e outros sistemas
críticos já estão com tudo funcionando em conformidade
com a mudança de data. E pessoas que antes soavam o alarme de colisão
iminente, hoje consideram o problema do bug como, no máximo,
um solavanco na viagem. Vamos sentir sua passagem, mas ninguém deverá
ser jogado fora do carro.
Conjunção -
Acredito que o problema mais grave seja o pânico causado pela conjunção
do bug com uma data que por si só já tinha todos os
ingredientes necessários para criar um clima de fogo no cinema.
Tudo indica que o bug que mais devemos temer é a histeria
em massa, a qual pode causar mais danos que o colapso dos sistemas informatizados.
É a vaca correndo o risco de morrer de enfarte por medo do carrapato.
Enquanto muita gente séria
trabalha para eliminar o problema, uma horda de mercadores oportunistas
aposta no caos. Especialistas de última hora escrevem livros alarmistas
e vendem kits de sobrevivência querendo tirar o máximo
proveito da situação. No primeiro dia do ano 2000 eles poderão
ser aclamados salvadores da pátria ou vigaristas, dependendo de
como as coisas ocorrerem. Os que apostaram no bug todas as suas
cartas estão torcendo para que tudo dê errado. Para que, para
eles, tudo dê certo.
Gary North, que nos Estados Unidos
assumiu o papel de porta-voz do desastre, prevê o colapso de bancos
e usinas atômicas, e a ruína do padrão de vida americano
com setenta porcento da população caindo no desemprego. Tudo
isso com direito a um clima de anarquia total. Não é à
toa que já existam americanos adotando medidas absurdas como comprar
carros velhos por precaução. Na passagem do ano pretendem
incendiar os carros na frente de suas garagens para que grupos de vândalos
pensem que o local já foi previamente saqueado!
Se os bugs humanos não
conseguirem detonar o que nem o bug cibernético seria capaz,
vejo uma luz no fim do túnel e não é o trem em sentido
contrário. O pós-bug promete ser promissor para a
informática em geral e a Internet em particular. Hoje a fatia maior
do orçamento de tecnologia da informação das empresas
está comprometida na temporada de caça ao bug, mas
no próximo ano estará disponível para a modernização
de equipamentos e desenvolvimento de novos sistemas.
Estes estarão cada vez mais
voltados para a Web, tanto para a geração de novos negócios
como na gestão dos já existentes. Mesmo porque logo será
inconcebível que uma empresa permaneça ilhada, sem participar
dos negócios que começam a acontecer a nível global.
Então, do mesmo modo como as empresas que não resolveram
o problema do bug terão um péssimo reveillon,
outras serão vítimas da ressaca pós-bug - o
prejuízo da demora em adotar uma visão voltada para a Web.
(*) Mário
Persona é consultor, escritor e palestrante. Esta crônica
faz parte dos temas apresentados em suas palestras. Edita o boletim eletrônico
Crônicas
de Negócios e mantém endereço
próprio na Web, onde seus textos estão disponíveis. |