Quem tem medo do lobo mau?
Mário Persona (*)
Colaborador
O porquinho
friorento e o lobo faminto se encontraram. O porquinho armou a espingarda,
fez pontaria e ia puxar o gatilho, garantindo um casaco de peles, quando
foi interrompido. "Espere!" - gritou o lobo. "Você tem frio e eu
tenho fome; espere mais um pouco que eu tenho a solução para
nós dois." E o porquinho esperou. O resto da história você
conhece: o porquinho ganhou um casaco de peles e o lobo encheu a pança.
Embora minha história não
mereça um prêmio de originalidade, ela ilustra bem o que acontece
com o pequeno empresário e o comércio convencional diante
dos grandes lobos corporativos que dominam cada vez mais o mercado. Estamos
vivendo uma época de grandes mudanças, alimentadas por um
novo ingrediente que é a Internet, e nenhum empresário pode
se dar ao luxo de esperar as coisas acontecerem. Se o fizer, certamente
será engolido.
Reforço - O comércio
convencional não deixará de existir com a entrada em cena
da Internet, mas suas paredes - sejam elas de palha, tábuas ou tijolos
- precisam ser reforçadas para agüentar o sopro do lobo. Do
contrário é melhor o comerciante convencional ir aprendendo
a cantar a música da outra história: "Eu vou, eu vou, prá
casa agora eu vou!"
Uma agência de viagens de Nova
Iorque levou treze anos para virar um negócio rentável. E
apenas dois anos para reduzir seu quadro a apenas uma funcionária
de meio período. Enquanto isso o proprietário tenta montar
outro negócio. Neste caso a Internet ajudou a solapar o alicerce
do empreendimento que perdeu seus clientes para a compra de passagens on-line,
diretamente das empresas aéreas. Mas a verdadeira razão de
sua agonia e morte se deve à inércia e falta de visão
do proprietário. Assim como o porquinho, ele esperou o lobo tomar
a iniciativa para ver se esse negócio de Internet iria dar certo.
E deu.
Uma pesquisa feita pela OECD, sigla
da Organização para O Desenvolvimento e Cooperação
Econômica, e publicada em http://www.thestandard.com,
revelou que a distribuição de bens e serviços utilizando
a Internet gerou uma enorme redução nos custos de alguns
segmentos. Passagens aéreas tiveram o seu custo de distribuição
reduzidos em nada menos que 87% quando a transação passou
a ser feita diretamente pela companhia aérea usando seu próprio
site na Internet. Diante de números assim, o lobo nem precisa ser
mau para querer entrar nesse negócio de venda de seus produtos e
serviços via Internet.
Até o observador menos atento
irá concluir que o comércio on-line não está
apenas criando novas vendas, mas roubando uma fatia das vendas do comércio
convencional. Hoje é possível encontrar e comprar rapidamente
pela Internet um livro ou CD, enviar flores ou um presente para alguém
sem precisar tirar o carro da garagem. Mas será que essa nova realidade
irá abocanhar e engolir de vez o comércio convencional? Não,
se este formar sua própria matilha na Internet, criando sistemas
cooperativos que fortaleçam sua atuação.
Bicicleta - James Punteney,
do Multimedia Marketing Group, uma empresa
especializada em marketing para a Internet, conta sua experiência
na compra de uma bicicleta. Ele deu preferência a uma loja convencional,
pois queria experimentar antes de comprar, e foi só na segunda tentativa
que encontrou uma bicicleta de acordo com a sua estatura. A menos que ele
fosse alguém como eu, que só pedala em bikes de videogame,
sua compra teria sido inviável em uma loja virtual.
Todavia, é interessante observar
como neste caso as duas modalidades de comércio se complementaram.
Uma loja virtual pode muito bem trabalhar em parceria com lojas convencionais
espalhadas por todo o mundo, em um processo de cooperação
mútua e usando um sistema de comissões. Um empreendimento
assim, além de se tornar forte no segmento que explora e expandir
sua área de atuação, permite que os clientes conheçam
melhor produtos que precisam ser experimentados antes da compra.
James só podia experimentar
a bicicleta nas dependências da própria loja, mas como era
uma mountain bike, ele precisava conhecer sua performance em trilhas
de terreno ruim. É óbvio que o vendedor não iria deixar
James enfiar a bicicleta no barro antes de efetuar a compra, portanto levou-o
até um computador conectado à Internet e à loja virtual
com a qual tinha parceria, para que ele pudesse ler os comentários
de usuários daquele modelo.
James entrou ainda em uma área
de chat ou bate-papo de ciclistas na loja virtual e perguntou se
alguém conhecia aquela marca. Os compradores passaram a fazer o
papel de vendedores, desfilando na tela as virtudes daquele modelo e levando
James a concluir ser aquela sua melhor opção. Se errasse
na compra, pelo menos não estaria sozinho.
Sem suco - Mas a compra ainda
não estava consumada. Saindo da virtual para cair na real, James
descobriu que a loja convencional só tinha em estoque o modelo na
cor laranja, e a última coisa que James queria era uma bicicleta
que lembrasse suco. A solução veio alguns cliques depois.
O vendedor levou James de volta ao mundo virtual, onde pôde escolher
a cor verde que desejava e a própria loja se incumbiu de fazer a
encomenda on-line.
Dois dias depois uma bike
verde brilhante, montada e ajustada, estava na loja à espera de
James. Entusiasmado, ele ainda comprou alguns acessórios, como capacete,
bomba para encher pneus e uma trava. Todo mundo ganhou no processo. A loja
virtual vendeu uma bicicleta que não venderia sem a ajuda da loja
convencional. Esta, por sua vez, só veio a satisfazer o desejo do
cliente graças à sua parceria com a loja virtual, de quem
recebeu uma comissão pela venda.
A experiência demonstra que
existe lugar para o comércio convencional na nova realidade de negócios.
Mas deve haver uma adaptação e em todos os casos a Internet
terá um papel indispensável. Dificilmente haverá um
setor que não venha a necessitar da Internet se quiser crescer -
ou simplesmente não desaparecer.
Mas não é preciso ter
medo do lobo mau. O importante é não esperar mais, achando
que seja possível crescer fora da sociedade da informação.
Se ainda assim conseguir crescer, provavelmente será apenas para
adiar o destino que será o mesmo daquele porquinho do antigo comercial
de TV, quando lhe perguntavam: "O que você vai ser quando crescer?".
(*) Mário
Persona é consultor, escritor e palestrante. Esta crônica
faz parte dos temas apresentados em suas palestras. Edita o boletim eletrônico
Crônicas
de Negócios e mantém endereço
próprio na Web, onde seus textos estão disponíveis. |