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Artigo escrito em 1999
Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 01/15/02 13:33:30
Atropelado pela Internet 

Mário Persona (*)
Colaborador

Ao contrário do que se pensava, a onda de artigos e notícias sobre segurança na Internet, hackers, roubo de cartões e coisas do tipo tem servido de propaganda para o comércio eletrônico. Do mesmo modo como as notícias de assaltos levam você a se prevenir com medidas de segurança mais sofisticadas, todo esse alarde sobre a Internet está fazendo dela um meio cada vez mais seguro de negócios.

Se o uso da Internet para negócios não fosse viável e confiável, os bancos jamais teriam entrado nessa mídia. Porém eles estão todos se acotovelando para conquistar seus clientes na Rede e, como dizia um amigo meu, se os banqueiros resolverem pular do décimo andar, pule atrás que é bom negócio. Do mesmo modo como o noticiário diário de atropelamentos, assaltos e homicídios nas ruas comerciais de nossas cidades não conseguiu acabar com o comércio tradicional, não será a imprensa marrom do ciberespaço que conseguirá acabar com o comércio do futuro. Os negócios pela Rede estão crescendo e expandindo sua área de ação.

Interligação - O sistema todo irá se tornar uma gigantesca cadeia comercial, muito diferente das lojas isoladas que encontramos hoje. E não podia ser diferente, já que a própria Internet, o meio usado pelo e-commerce, é avessa a qualquer idéia de isolamento. Não faz muito tempo que o microcomputador era considerado o grande responsável por sensíveis mudanças no mundo dos negócios. 

Logo veio o impacto da popularização das redes internas, fazendo das empresas um grande arquipélago de ilhas de informação espalhadas por mares e canais intransponíveis para pequenos navegantes. A navegação, cara por sinal, ficava por conta dos grandes galeões corporativos que tivessem lastro suficiente para criar suas próprias redes externas. Hoje é a Internet, e não o microcomputador, a grande responsável pelas mudanças que estão ocorrendo no mundo dos negócios. A rede mundial construiu as pontes que faltavam para interligar as ilhas de informação, formando uma malha praticamente à prova de bloqueios no tráfego. 

O próximo passo foi colocar as empresas em contato direto com seus clientes, popularizando o comércio eletrônico. Mas o impacto da Rede não parou aí. Do mesmo modo como a Internet surpreende por sua rapidez e capacidade de se ramificar, as empresas de Internet não pararam para contar a féria do primeiro espetáculo que foi colocar todo mundo conectado. Passaram à busca de soluções inovadoras que utilizassem o pleno potencial dessa cadeia de transferência de informação. E o comércio eletrônico, que parecia limitado à comunicação vendedor-comprador, passou a ser um elo de uma cadeia maior envolvendo fornecedores, fabricantes, comerciantes e clientes. 

Entrada - Pense em uma indústria qualquer. De um lado ela tem seus fornecedores, com os quais quer manter uma relação de entregas programadas a intervalos reduzidos para evitar estoques. Da enorme quantidade de itens que ela comprava por mês, agora os fornecedores deverão entregar apenas o que a fábrica vai consumir em, digamos, dois ou três dias. 

O trabalho envolvido na verificação diária dos estoques, digitação de pedidos, ligações telefônicas e envio de pedidos por fax poderia inviabilizar o projeto. Multiplique isto pelo número de insumos provenientes de diferentes fornecedores e o resultado será um exército de secretárias consumindo a lucratividade da empresa. 

Em uma economia alheia à Rede seria impraticável pensar em algo assim. Mas a Internet tornou isto possível e eu mesmo estou em contato diário com empresas que utilizam um sistema assim. Elas disponibilizam a cada um de seus fornecedores sua posição de estoque dos itens envolvidos na transação e gera pedidos de compra quando esses níveis atingem valores mínimos. 

Nada de fax ou telefonemas. A fábrica e os fornecedores se comunicam quase em tempo real utilizando um browser comum de navegação na Internet, consultando na tela ou imprimindo as tabelas com as informações de compra, dentro de um ambiente seguro controlado por senha. Tudo isso sem problemas de horário ou distância e sem precisar ligar para perguntar se o fax chegou legível. 

Saída - Agora vamos olhar para o outro lado dessa mesma fábrica, a saída do produto acabado. Seu canal de distribuição depende do vendedor da empresa que visita os revendedores uma vez por mês, expõe os catálogos e mostruários com os novos lançamentos, procura despertar neles o desejo de compra e anotar o pedido. Uma vez de posse das informações, o vendedor irá ligar para a fábrica, passar um fax ou, se estiver um pouco mais informatizado, transmitir os dados via modem. 

Este processo apresenta alguns problemas, a maioria deles ligados à perda de tempo. É comum o pedido só chegar na fábrica quando não há mais tempo para incluí-lo na programação de produção ou de expedição. Isto sem falar na possibilidade do vendedor tirar um pedido daquilo que teve sua produção descontinuada, ou cuja quantidade seja insuficiente. E serão necessários alguns interurbanos de um lado para o outro para confirmar, verificar o andamento do pedido, conferir se o cliente é idôneo etc. Enquanto isso, o cliente já terá descoberto que encomendou pouco, o que pode coincidir com uma visita providencial (para ele) do vendedor da empresa concorrente. 

Tudo isso acaba quando a empresa passa a utilizar a Internet para que os pedidos sejam colocados pelos revendedores diretamente em seu sistema de produção. Tudo sem erros de digitação, telefonemas ou fax. Os dados do pedido que chegam à empresa via Internet são automaticamente convertidos para um formato que possa ser lido pelo sistema utilizado dentro da própria empresa, checando a idoneidade do cliente, existência de estoque e capacidade de produção. Enquanto isso, o próprio revendedor pode acompanhar o andamento do pedido pela Internet para saber se o mesmo já foi faturado ou como e quando foi expedido. 

Consumidor - Sobrou o consumidor final, aquele que pode não querer ir até a loja, procurar uma vaga para estacionar e correr o risco de tomar chuva, ser atropelado ou assaltado e morto. (Antes que você me considere drástico demais, analise se estas situações são estranhas a algum ser humano). Para ele, existe a opção do comércio eletrônico que já está mais popularizado, a loja na Internet onde ele pode escolher o que deseja e comprar quando quiser.

Mas não existem riscos em se comprar pela Internet? Bem, das situações que mencionei acima, pelo menos quatro delas o comprador não vai encontrar na Internet: falta de vaga para estacionar, chuva, atropelamentos e morte. Em qualquer uma das fases da cadeia de negócios que a Internet possibilita, o ganho para todos os envolvidos é evidente. 

O cliente, seja ele revendedor ou consumidor final, passa a ter um canal de comunicação mais direto, rápido e eficiente com a empresa que, por sua vez, também fica conectada aos seus fornecedores e clientes, ganhando assim em poder de compra, economizando com estoques e adquirindo informações valiosas sobre sua clientela. O recebimento de insumos para a fabricação e o atendimento ao cliente têm seus prazos reduzidos, baixando custos e aumentando a competitividade da empresa. 

Evidentemente, tudo isso tem o preço da inovação, a ser pago por aqueles que acreditarem e investirem em algo que é irreversível: a revolução no comércio mundial via Rede. Embora não exista nesse mundo virtual de negócios via Internet o perigo de falta de vagas para estacionar, chuva ou homicídios, ainda iremos ouvir falar de muitos casos em que a Internet causou atropelamento e morte. Das empresas que ficaram paradas no meio da pista da informação.

(*) Mário Persona é consultor, escritor e palestrante. Esta crônica faz parte dos temas apresentados em suas palestras. Edita o boletim eletrônico Crônicas de Negócios e mantém endereço próprio na Web, onde seus textos estão disponíveis.