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Artigo escrito em 1999
Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 04/09/02 18:13:51
Receita para um grande negócio 

Mário Persona (*)
Colaborador

Fiquei surpreso quando minha filha de dezenove anos chegou do supermercado. Nas sacolas, colheres e copinhos descartáveis com tampa, pacotes de gelatina e uma dúzia de maracujás. Uma geladeira de isopor completava o arsenal. "Vou vender mousse de maracujá na faculdade", anunciava ela radiante. Além do doce caos em que se transformou nossa cozinha, a vida de todos ganhou um sabor diferente.

Logo passou a ser uma rotina chegar em casa e encontrá-la pilotando o liqüidificador e o fogão no preparo de sua receita exclusiva. E toda a família começou a dar palpites, discutindo formas de aperfeiçoar a embalagem, ou as vantagens e desvantagens de se partir para o franchising. Evidentemente, neste caso estávamos nos referindo apenas a um sistema de comissão para as colegas que vendessem os copinhos de mousse nas outras classes.

Embora as pretensões de minha filha não fossem muito além de fazer o doce de que mais gosta e ainda ganhar algum dinheiro para pagar o almoço na cantina, muitos grandes negócios começaram assim. Não são poucas as grandes indústrias de alimentos que começaram com uma simples receita na cozinha de alguma dona de casa. De uma atividade paralela ou um hobby, muitas pessoas acabam criando um grande produto ou serviço. A informalidade parece ser um ingrediente chave no processo.

Prazer - Quando não existe a preocupação de se transformar algo em um grande negócio, tudo se resume ao prazer de se fazer aquilo cada vez melhor. Tom Petzinger, em seu livro "The New Pioneers", sugere que a inovação costuma ocorrer na periferia de um sistema, onde as pessoas têm mais espaço para explorar as possibilidades. A inovação precisa de liberdade para criar. Ali você está à vontade para testar todas as possibilidades, até encontrar uma que funcione. 

Por ser uma ocupação periférica à atividade principal, e não exigir o cumprimento de compromissos ou metas, a criatividade corre solta. Foi o que aconteceu com Estevam Varga. Quando a Internet ainda estava limitada ao meio acadêmico, Estevam instalou um link na AMC, sua fábrica de molas para a indústria automotiva, e começou a utilizar a Internet em pesquisas. 

Aquilo que começou como uma atividade paralela - quase um hobby - acabou virando um grande negócio. Ao enxergarem a possibilidade de se utilizar a Internet para a comunicação de dados entre empresas, Estevam e mais alguns visionários fundaram a Widesoft, na época a segunda empresa do estado de São Paulo a explorar comercialmente um link de Internet.

Não demorou para que a fábrica de molas fosse vendida e os recursos aplicados na nova empresa. Em pouco tempo a Widesoft estava colocando no ar um dos primeiros sistemas de Web EDI no País, utilizando a Internet para fazer o intercâmbio de dados entre a indústria Freios Varga e seus fornecedores. Outras empresas logo aderiram ao sistema, que passou a crescer à medida que novos desafios e necessidades iam surgindo. As palavras de Jennifer Bessye Sander, colunista do USA Today, ilustram bem esse tipo de processo: "Quanto mais eu trabalho, melhor eu trabalho, e no final lucro com isso".

Motivação - Abraham Maslow, pioneiro da teoria da motivação, escreveu que "a criatividade está relacionada à habilidade de se enfrentar a falta de estrutura, de futuro, de previsibilidade e de controle, e à tolerância pela ambigüidade e falta de planejamento". Por não estar preocupado com o futuro, o novo empreendedor mergulha no presente, dedicando-se totalmente àquilo que faz. 

Ao invés de um plano de ação bem definido, dá um passo de cada vez, corrigindo sua rota em um processo de ação, feedback e síntese. Assim ele vai obtendo o conhecimento necessário à próxima ação. É algo como andar à noite com uma lanterna. Você enxerga apenas o suficiente para o próximo passo, mas mesmo assim chega ao destino. Seja ele um mousse de maracujá ou o próximo grande negócio da Web.

(*) Mário Persona é consultor, escritor e palestrante. Esta crônica faz parte dos temas apresentados em suas palestras. Edita o boletim eletrônico Crônicas de Negócios e mantém endereço próprio na Web, onde seus textos estão disponíveis.

O autor incorporou esta crônica a um novo livro, "Receitas de Grandes Negócios - Para empresas que NÃO estão de regime" (lançamento previsto para 5/2002), com outro final:
 

A inovação precisa de liberdade para criar. É onde se fica à vontade para testar todas as possibilidades, até encontrar uma que funcione. Por ser uma ocupação periférica e não exigir o cumprimento de compromissos ou metas, a criatividade corre solta.

Talvez isto esteja acontecendo com você neste exato momento. Sua atividade usual, seu hobby ou passatempo pode acabar se transformando em seu próprio negócio. Fruto de um sonho antigo ou conseqüência da conjunção de fatores mais comuns, como instabilidade, insatisfação ou desemprego.

Mas que tipo de negócio montar? A resposta pode estar mais perto que lápis atrás da orelha e óculos sobre o nariz. Há basicamente três coisas que você pode vender: um produto, serviço ou conhecimento. Você pode vendê-los 
separadamente ou agregar tudo em um grande produto de sucesso: VOCÊ!

Quando o médico examina o paciente, está vendendo o conhecimento de anos de estudo e experiência. Embrulhado em uma boa reputação. Ao comprar um medicamento, o farmacêutico está lhe vendendo um produto, acompanhado do conhecimento que tem dele. E se um profissional for até sua casa aplicar uma injeção, você estará pagando por experiência embalada em conveniência, além de agulha e seringa. Os únicos itens descartáveis.

Conhecimento não é um produto tangível, nem descartável - ele permanece com você mesmo após vendê-lo. Por isso deve existir um bocado dele estocado aí nessa sua caixa craniana, que pode valer alguma coisa. Seja a receita para fazer um musse, ou a tecnologia para construir uma ponte.

Mas não basta ter o conhecimento. É preciso algumas xícaras de adversidade, uma boa colher de necessidade e alguns quilos de paixão. Tudo balançando perigosamente na instabilidade do momento que você pode estar vivendo. Abraham Maslow, pioneiro da teoria da motivação, escreveu que "a criatividade está relacionada à habilidade de se enfrentar a falta de estrutura, de futuro, de previsibilidade e de controle, e à tolerância pela ambigüidade e falta de planejamento".

Por faltar uma perspectiva mais clara do futuro, o novo empreendedor mergulha no presente, dedicando-se totalmente àquilo que faz. Ao invés de um plano de ação bem definido, dá um passo de cada vez, corrigindo sua rota em um processo de ação, feedback e síntese. Assim ele vai obtendo o conhecimento necessário à próxima ação.

É algo como andar à noite com uma lanterna. Você enxerga apenas o suficiente para o próximo passo, mas mesmo assim chega ao destino. Mas aí vem a parte do calafrio. Pois muitos dos que estão começando um pequeno negócio em casa ou abrindo uma loja ou pequena indústria, acabam descobrindo que estão competindo com mega-negócios que deixam pouco espaço para quem não pode investir. Será que você está entrando em uma gelada?

Este livro não pretende responder esta pergunta. Mas poderá ajudá-lo a responder por si mesmo. Longe de ser um prato feito, este é um volume de pequenas receitas, idéias, pensamentos e meditações de negócios. Tudo para ajudar você a pensar por si mesmo, porém de uma forma inovadora ou pouco usual.

A idéia é levar você a olhar para onde ninguém está olhando. A descobrir atalhos. Que o ajudem a cozinhar seu próximo grande negócio sem bater de frente com uma concorrência de gigantes. Você tem muito trabalho pela frente, alguns sucessos e fracassos. Por isso, antes de começar a empreender de verdade, sugiro que comece pela receita que vem a seguir. Do musse de maracujá. Pelo menos esta lhe dará a certeza de um resultado mais doce e mais rápido.

Musse de Maracujá

Ingredientes do Musse:
1 lata de creme de leite
1 lata de leite condensado
2 a 3 maracujás
1 pacotinho de gelatina em pó sem cor e sem sabor
Copinhos descartáveis com tampa

Ingredientes da Calda:
1 ou 2 maracujás
Açúcar
Água

Para fazer o Musse:
Bater um maracujá no liquidificador com água e coar o suco. Deve dar 1 copo. Dissolver a gelatina em 2 colheres de água quente. Bater o suco com creme de leite e leite condensado até ficar cremoso. Acrescentar a gelatina dissolvida e bater mais um pouco. Despejar nos copinhos e levar à geladeira para endurecer.

Para fazer a Calda:
Levar a fogo brando o maracujá com açúcar a gosto e um pouco de água para afinar a calda. As sementes fazem parte da calda. Ferver até engrossar um pouquinho.

Após o musse endurecer, jogar um pouco de calda sobre o musse de cada copinho. Agora, é só vender. Ou comer.