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Publicado originalmente pelo editor de Novo Milênio no caderno Informática do jornal A Tribuna de Santos, em 24/8/1999.
Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 01/05/00 11:04:58
LITERATURA
Internet homenageia Borges com a babel e o labirinto 

Centenário do escritor argentino é destacado hoje (24/8/1999) em todo o mundo

Carlos Pimentel Mendes
Editor

Imagine uma grande biblioteca. Lá no canto de uma prateleira, há um livro muito especial: cada vez que se lê uma página, ela se transforma, e quando se volta a ler esse livro, a página mudou e o livro já é uma obra muito diferente. Bem, será a Internet esse livro infinito, sempre renovado, que o escritor argentino Jorge Luís Borges citou em sua Biblioteca de Babel? Bom tema para os estudiosos de literatura debaterem - e esse debate está na Net, junto com muitos outros textos em que pesquisadores de vários países analisam esse escritor, cujo centenário de nascimento é comemorado hoje (24/8/1999)

Concepção da Biblioteca de Babel, do universo ficional borgiano
Mesmo que você não possa ir ao Café del Este, na rua Maipú de Buenos Aires, para sentir o ambiente que o escritor freqüentava, nem tenha conhecido como eu El Viejo Almacén em seus tempos melhores (onde se apresentava Estela Canto, à qual foi dedicado O Aleph) pode - para usar uma das figuras mais recorrentes no universo borgiano - entrar no labirinto da Internet para encontrar seu Minotauro: as imagens, as biografias, textos comentados e debates, muitos debates. Pois Borges conseguiu o paradoxo de ser ao mesmo tempo unanimidade e fonte de profundas divergências.

Vamos ajudá-lo a entrar no labirinto. Como o personagem Lönnrot (La muerte y la brújula), abra diversas janelas em seu navegador, para conhecer o escritor desde várias alturas e vários ângulos. Sair desse labirinto, porém, é problema seu, como diria o autor de Elogio da Sombra, Fervor de Buenos Aires, História Universal da Infâmia, Outras Inquisições e tantas outras obras em verso e prosa. 

Página com 'O Minotauro em seu Labirinto, de Borges
Labirinto –  A convivência de Borges com os labirintos começa na infância, com um livro da biblioteca de seu pai, ilustrado com a imagem de uma espécie de anfiteatro, alto e cheio de divisões. Ele imaginava que, se tivesse uma lupa, poderia ver nesse labirinto o mitológico touro Minotauro, como descreve Waldemar Dante, em "O Minotauro em seu Labirinto" (primeira parte do texto disponível na Internet).

Depois desse primeiro contato, dobre à esquerda e prossiga até a página da Coleção Jorge Luis Borges da Fundação San Telmo. Uma bibliografia ilustrada, uma resenha biográfica e até uma enciclopédia sobre o escritor estão disponíveis, servindo como boa fonte de consulta.

Página argentina com a Coleção Jorge Luis Borges
Prossiga na rede argentina de computadores para uma rápida passagem pelas páginas do jornal La Nacion, onde o escritor publicou mais de 170 textos, e que no dia 19/8/1999 noticiava a chegada a Buenos Aires de uma exposição itinerante, realizada pela Fundação Internacional Jorge Luis Borges, em homenagem ao centenário do escritor. 

Essa mostra foi inaugurada há oito meses em Veneza e está percorrendo o mundo, chegando a Tóquio no final de 1999. Embora, segundo a viúva Maria Kodama, não seja uma exposição de grandes quadros e estátuas, sendo "mais voltada para os que possam dar valor à leitura e aos pequenos objetos da vida cotidiana", já foi vista por mais de 12 mil pessoas em Veneza e Paris. Talvez os visitantes tenham querido contradizer Borges, para quem "a mente humana é permeável ao esquecimento"...

Se o leitor é numismata, fique ligado: segundo o jornal portenho, o Banco Central argentino lançará hoje (24/8/1999) uma coleção de moedas de ouro, prata e cobre/níquel em homenagem ao escritor.

Leituras – Agora, continue seguindo o conselho dado a Yu Tsun no conto O jardim de caminhos que se bifurcam: "(...) a casa fica longe daqui, mas você não se perderá se tomar esse caminho à esquerda e em cada encruzilhada do caminho dobrar à esquerda".

Mais uma virada à esquerda, até a universidade dinamarquesa de Aarhus, que desde 1994 mantém o Centro de Estudos e Documentação Jorge Luis Borges (com páginas também em espanhol), analisando sua obra em relação à filosofia (epistemologias transversais), à semiótica e à literatura comparada. Em "Por quê Borges", faz um elogio rasgado daquele que é considerado o mais importante erudito deste século: "Ontologias fantásticas, etimologias transversais, genealogias sincrônicas, gramáticas utópicas, geografias novelescas, múltiplas histórias universais, bestiários lógicos, silogismos ornitológicos, éticas narrativas, matemáticas imaginárias, thrillers teológicos, nostálgicas geometrias e lembranças inventadas são parte da paisagem imensa que as obras de Borges oferecem (...)".

Porém, se voltar às páginas latino-americanas na Web, o leitor recordará que Borges não queria ser lembrado por seus escritos, mas por suas leituras ("Que outros se jactem das páginas que tenham escrito, eu me orgulho das que tenha lido"). Dobre então outra vez à esquerda, apontando por instantes o navegador para a página francesa "Homenagem a Borges", que anuncia para 12/1999 uma conferência sobre a faceta ensaísta do escritor, na sede da Unesco em Paris.

Site francês sobre o famoso escritor
Continue virando à esquerda, e siga em frente pelas páginas de "The Garden of Forking Paths", site francês (mas com texto em inglês) inspirado em livro com esse título. Nessas páginas Web, junto com imagens raras e/ou curiosas (a primeira biblioteca, Borges e o Aleph...), análises, vínculos para outros endereços e biografia, há também uma ampla análise das influências literárias que o escritor recebeu e transmitiu. Você sabia que até o proscrito Salman Rushdie, autor de Os Versos Satânicos, e o recém-descoberto José Saramago, foram bastante influenciados pelos textos do escritor argentino?

Em vez de escrever 500 páginas para desenvolver uma idéia que, numa conversa, poderia ser apresentada em poucos minutos, Borges gostaria de imaginar que todos os livros já estão escritos: ele apenas acrescentaria observações na contracapa. Então, aproveite para ver a resenha dos livros que Borges nunca leu, pois até os autores citados são imaginários. Está em The Crimson Hexagon.

Outras páginas – Adeus, Ariadne, o fio que conduzia o leitor vai se partir. Depois de ter dobrado essas quatro vezes à esquerda, perca-se no labirinto da biblioteca eletrônica mundial Internet, encontrando aqui e ali outras páginas sobre o escritor argentino, falecido em 14 de junho de 1986. Veja, por exemplo, dois de seus poemas.

E, em muitas das páginas - como nas das universidades brasileiras USP e Unicamp - encontrará decerto a citação: "Se eu pudesse viver novamente(..) correria mais riscos, viajaria mais. Contemplaria mais entardeceres, subiria mais montanhas, nadaria mais rios, iria a mais lugares onde nunca fui (..)".

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