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NOTÍCIAS 2002

Fechando portas e janelas de comunicação

Mário Persona (*)
Colaborador

Meu amigo estava atrapalhado. Perdido no trânsito de São Paulo, desligou o rádio para se concentrar no endereço que procurava. A cada esquina, dezenas de placas, sinais, outdoors e faixas coloridas competiam por sua atenção. Mas só o que ele queria era encontrar uma placa com o nome da rua que procurava. Nada mais. Se ao menos o motorista de trás parasse de buzinar! O suor descia pelo rosto. A ansiedade parava na garganta.

Foram décadas de acúmulo de poluição visual e sonora até chegarmos ao atual estágio de saturação de mensagens na mídia e na cidade. Todas falando ao mesmo tempo, para dizer que é o seu produto que está com a razão. Meu cérebro perdeu a visão periférica. Há muito deixou de processar o ruído para se concentrar no que interessa. Mas, o que é mesmo que interessa?

Assim como o mergulhador não sente o peso de toneladas de água sobre si, por estar imerso nela, nadamos indiferentes às mensagens em um rio de patrocínios. Campanhas publicitárias e campanhas de vacinação têm cada vez mais um efeito comum. Imunizam. Tudo grita para atrair minha atenção. Eu fico na minha. Não quero ouvir.

Mas quero falar, e ninguém quer escutar. Então a única mensagem que chama minha atenção é a que fomenta o diálogo. Com o emissor ou com meus botões. Se não me faz falar, me faz pensar. Concluo que chamar à conversação é o que hoje chama a atenção de quem está disposto a pagar. O resto é ruído. Para quem tem tempo, e não dinheiro para gastar.

Meio e audiência - Mc Luhan escreveu que "o meio é a mensagem e a audiência o conteúdo". Fica mais claro saber que ele também escreveu que "o meio é a massagem". Mais do que transportar a mensagem, o meio molda. Talvez hoje escrevesse que "o meio é o silicone". Comunicação de massa é a que imprime sua forma nas massas. Nos molda, até aplainar nossa individualidade por um mínimo denominador comum. Ligue a TV e verá que o mínimo prometido não é o cumprido.

Está ficando difícil resgatar a audiência benfazeja que a própria mídia mercadeja pela sincronização dos pensamentos. O que a TV vende? Gente. Homens interessados na cerveja que lembra mulheres. Mulheres interessadas em facas que cortem carne e aparelhos abdominais que cortem gordura. Qualquer perfil serve como audiência vendável, desde que exista uma programação para chamar e prender a atenção.

Prender no sentido de encarcerar. Não de cativar, mas de concentrar todos num mesmo campo. Massificar. De tal modo que destrua a identidade, condição essencial à interatividade que os mesmos meios agora tentam resgatar. Nesse ínterim a Internet surgiu, como meio conversacional de duas vias. E pensaram que fosse a mesma coisa.

Para quem escapa dos fornos catódicos que cremam a individualidade, mensagem eficaz é a que belisca a atenção para um diálogo que crie interação. Um exemplo prático: O que está escrito em seu cartão de visita? O blá-blá-blá de sempre ou algo que leve ao diálogo? No de Joe Vitale, um publicitário norte-americano, está: "Pergunte-me sobre o macaco". As pessoas perguntam e ele explica que sua especialidade é atrair a atenção, que leva à conversação.

Não conheço o Joe nem seu macaco, mas a frase tem o poder de instigar o diálogo. Após uma palestra em Salvador, recebi um cartão que trazia, entre predicados como Administrador, Professor e Tradutor, a função "Herói". Foi o "Herói" que chamou minha atenção e iniciou um diálogo. "Todo profissional precisa ser herói para sobreviver", explicou ele. Seu cartão foi além de chamar atenção. Convidou ao diálogo.

Já não basta competir pela atenção. É preciso conversar para evitar fechar portas e janelas aos nossos apelos de comunicação. No caso de meu amigo perdido no trânsito, o problema foi a janela. Em meio à confusão de placas, buzinas, apitos e gritos, sua garganta se entupiu dum nervosismo catarral. Olho fixo no semáforo, acionou a manivela do vidro, pigarreou, virou e cuspiu. No vidro, que tinha acabado de fechar.

(*) Mário Persona é consultor, escritor e palestrante, além de autor dos livros Crônicas de uma Internet de verão, Receitas de grandes negócios e Gestão de mudanças em tempos de oportunidades. Esta crônica faz parte dos temas apresentados em suas palestras. Edita o boletim eletrônico Crônicas de Negócios e mantém endereço próprio na Web, onde seus textos estão disponíveis.