NOTÍCIAS 2002
Gestão do Conhecimento não é o fim da picada
Mário Persona (*)
Colaborador
Conto, se você prometer não rir. Nos livros, criar abelhas era
a glória. Na vida real, foi outra história. Cansei de vagar pelo pasto levando uma bacia com água açucarada. A abelha vinha beber,
eu marcava suas costas com um pingo de tinta e observava o rumo da decolagem. Cada uma ganhava uma cor e seu tempo de viagem era
cronometrado. Foi assim que descobri a direção da colméia, se eu estava longe, perto, ou já tinha passado por ela. Você prometeu não
rir.
Apicultura não é coletar mel e gestão do conhecimento não é coletar informação. "Mais de 90%
do conhecimento da empresa está na cabeça das pessoas, e mudando o tempo todo", disse Robert Buckman, que não é nenhum abelhudo em
gestão. O que documentamos é só 10% do conhecimento, o chamado explícito. O resto é administrar o tácito, a cabeça das operárias.
Marcar quem é quem, identificar seus casulos e mapear suas rotas é a tarefa de quem gerencia a densa fluidez do saber. Mapa na mão,
fica mais fácil para qualquer um encontrar o mel sempre que precisar. Boy que é boy não toma mel, chupa abelha.
Encontrei a colméia num velho e sublocado cupim. Se pensa que é fácil adquirir conhecimento,
experimente quebrar um cupim e tirar uma colméia de dentro. Levei até o livro que ensinava como transferir as abelhas para minha
bela caixa de madeira azul, mas nenhuma delas leu. Fumaça nos olhos, talvez. Com a habilidade de um rinoceronte, destruí o cupim e
os favos, mas não a colméia. As abelhas que não morreram de rir enxamearam num galho próximo, formando uma bola ali. Protegiam a
rainha.
Caldeirão - Identificar e proteger as fontes de conhecimento na empresa é uma questão
de sobrevivência. Numa época em que os negócios, produtos e mercados não param de mudar, só o conhecimento garante a continuidade
das empresas, que Sidney Winter descreveu como "organizações que sabem fazer as coisas". Eu, por exemplo, nem imaginava como fazer.
Para quem teve a idéia da bacia, o lógico seria esperar que meu próximo arrojo fosse um caldeirão.
Vestido num ridículo escafandro de pano, me aproximei com o enorme caldeirão de alumínio
balançando na ponta de uma vara. Com uma mão tentava encestar o enxame. Com a outra, sacudia o galho, sem luvas para não perder o
tato. Planejava colocar a tampa no caldeirão, quando a bola caísse. Ela caiu, mas levou o caldeirão junto para o chão. Não tão
rápido como devia, coloquei a tampa com a mão nua. E já podia ver meus negócios crescerem, a começar pela mão. Ficou com o dobro do
tamanho.
Gestão do fluxo - Deixar as operárias tocarem as antenas é adoçar a troca de
conhecimento. É esta a sacada: a gestão do fluxo das abelhas, não do mel. Só mesmo uma vespa quadrada irá tolher o livre intercâmbio
de conhecimento numa empresa. Antes o berro era "Parem de conversar e voltem a trabalhar!". Alan Webber, autor de What's So New
About the New Economy?, agora sugere que seja "Voltem a conversar e não parem de trabalhar!".
Ao contrário do que pensam os zangões, que gostam de resultados rápidos e têm vida curta, é
preciso dar tempo para o aprendizado informal. Incentivar a cultura mestre-aprendiz num lay-out de vasos comunicantes aumenta
a portabilidade do conhecimento. Os limites devem ser maleáveis como a cera, que mantém sextavados e unidos os alvéolos dos favos e
não permite que o conhecimento escorra pela porta. Dá trabalho? Claro! Ignorar isto pode ser o fim da picada. Mais cômodo e indolor,
porém não evita o reumatismo.
Um ditado que inventei agora diz que aonde a rainha vai, a colméia vai atrás. Portanto, com
a frestinha da entrada devidamente reduzida para a rainha não fugir, agora só faltava despejar as abelhas na caixa de madeira. Só
faltava? Você já tentou despejar um caldeirão de abelhas em um caixote e colocar sobre ele uma tampa de madeira um número menor? É
claro que eu ainda tinha a outra mão intacta. Era a minha chance de fazer com que as duas ficassem do mesmo tamanho. Foi o que fiz,
e com tamanha presteza, que só escapou uma abelha. A rainha.
(*)
Mário Persona é consultor, escritor e
palestrante, além de autor dos livros Crônicas de uma Internet de verão,
Receitas de grandes negócios e Gestão de mudanças em tempos de oportunidades. Esta crônica faz parte dos temas
apresentados em suas palestras. Edita o boletim eletrônico Crônicas de Negócios e mantém
endereço próprio na Web, onde seus textos estão disponíveis. |