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Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 12/05/01 16:39:42
Eliminando intermediários 
no contato com o cliente 

Mário Persona (*)
Colaborador

Nem sei como descrever aquela sala de espera. Era tão escura que demorei a perceber que estava só. Na janela, grossas cortinas de veludo só viam a luz do sol pelas costas. Do lado de dentro, uma lâmpada prisioneira tentava em vão esticar seus raios por entre as barras da cela formada por seu lustre. Uma masmorra de vidro cuja cor ia do verde-petróleo ao breu. Com pingentes cor de asa de graúna.

O cenário dantesco não estaria completo sem as duas enormes caixas de som vomitando rock. Talvez para abafar os gemidos da sala ao lado. Se aquela era a sala de espera, a próxima era a de torturas, a julgar pelo que vi. Ou não vi, por absoluta falta de luz. Universitário e desconhecido em terra estranha, fui parar no dentista barato do casarão no centro de Santos por sugestão de alguém que o conhecera criança. Provavelmente não viu no que deu depois que cresceu.

E como cresceu. Se existia um ser humano atrás daquela barriga, estava em total desvantagem. Frestas numa camisa branco escuro com botões desesperadamente agarrados às casas, deixava entrever uma amostra das redondezas do seu ventre. A única parte da anatomia que apareceu na porta quando ele grunhiu "Próximo!". Tremi.

Em minhas crônicas e palestras sobre atendimento ao cliente, uso histórias reais para ilustrar algo de positivo. Mas esta é negativa demais até para isso. Vou limitar-me a contá-la, esperando que você consiga extrair dela um grama de aprendizado de como tratar seus clientes. Ou uma tonelada de como não tratá-lo.

Impressão - No atendimento ao cliente, a primeira impressão é a que fica. A segunda, a que vai embora. Nesse caso, não fui e me arrependo. Sua sala de espera, seu site, show-room ou call center criam a primeira impressão. Se você conseguir imprimir logo no cliente a sensação de que todo o suor gasto em seu negócio foi para tornar a vida mais fácil para ele, terá cumprido boa parte de sua missão.

Justiça seja feita, suor era o que não faltava naquele dentista. Empapava a camisa, com direito a bônus extra nas axilas. A não ser pela caveira sobre a mesa desarrumada, seu consultório parecia normal a qualquer pessoa que tivesse vivido um século antes. Ou assistido "Família Adams". Não vi uma secretária ou auxiliar, mas evitei associar o fato à presença da caveira sobre a mesa.

Minha estupidez fez com que eu voltasse outras vezes para completar o tratamento, se é que podemos chamá-lo assim. Nunca vi outro cliente. Quando ele abria a porta e chamava "Próximo!", eu nem imaginava o que teria sido feito do anterior. Antes que você me interprete mal, a caveira na mesa era sempre a mesma.

Pressão - Aguardei com ansiedade a vez que seria a última. Apenas para colocar o bloco no que havia sobrado de meu dente. Numa tentativa prévia, com a perícia da pata de um mastodonte, a criatura havia quebrado parte do dente ao tentar encaixar o bloco usando um martelo desses que o médico usa para bater no joelho. Se fosse no joelho, teria chutado, por reflexo ou não. Ele fora obrigado a refazer a peça e nem pensei em reclamar, já que o resultado ficava cada vez mais valioso. Menos dente e mais ouro.

Com o esforço para encaixar o segundo bloco, a criatura começou a suar mais. Sim, havia mais suor guardado naquele barril para ocasiões assim. Por alguns momentos ele saiu de meu campo de visão, abandonando-me na cadeira. Teria ido buscar um novo instrumento de tortura? Voltou mais à vontade, com os movimentos mais soltos. Em poucos minutos encaixou o bloco no lugar, enquanto eu tentava me esquivar das gotas de suor.

Mas era impossível me mover. Sua mão esquerda mantinha minha cabeça devidamente imobilizada com a bochecha espremida contra sua barriga, enquanto a outra mão manobrava sob o céu de minha boca. Não, eu não estava com minha bochecha em contato com sua camisa empapada de suor. Pior. Ele eliminou qualquer intermediário no contato com o cliente. Já havia tirado a camisa no parágrafo anterior.

(*) Mário Persona é consultor, escritor e palestrante. Esta crônica faz parte dos temas apresentados em suas palestras. Edita o boletim eletrônico Crônicas de Negócios e mantém endereço próprio na Web, onde seus textos estão disponíveis.

N.E.: o atendimento ao cliente, na maioria dos consultórios odontológicos de Santos, melhorou consideravalmente nas últimas décadas...