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Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 09/20/01 09:58:28
Conflito: registro de domínios 
e Direito Marcário 

Ângela Bittencourt Brasil (*)
Colaboradora

Ângela Bittencourt BrasilA Resolução nº 1 do Comitê Gestor Nacional, logo em seu artigo 1º, estampa a seguinte diretriz: "Art. 1º. O Registro de Nome de Domínio adotará como critério o princípio de que o direito ao nome do domínio será conferido ao primeiro requerente que satisfizer, quando do requerimento, as exigências para o registro do nome, conforme as condições descritas nessa resolução e seus anexos".

Vê-se que o legislador administrativo adotou o princípio do "first to file" onde o primeiro que registrar será o possuidor do domínio requerido.

Porém, a postura da instituição delegada - Fapesp - em não registrar determinados domínios, tendo como espelho a Lei de Propriedade Industrial, veio em decorrência da mesma Resolução 1/88 do Comitê Gestor, que em seu art. 2º, inciso III do Anexo I, relaciona domínios irregistráveis e entre eles, palavras que possam induzir terceiros a erro, como marcas de alto renome ou notoriamente conhecidas. Somente para argumentar, queremos lembrar que trata-se de uma norma administrativa que não está imune à apreciação judicial.

Como toda Resolução, a do Comitê Gestor tem a natureza dos atos administrativos cuja abrangência se dá em relação aos administrados e é espécie do gênero ato jurídico que tem como escopo a aquisição, o resguardo, a transferência, a modificação ou extinção de direitos em matéria administrativa.

Inferior à lei em hierarquia, o ato administrativo emana, via de regra, do Executivo e, no caso a Resolução Administrativa, é um ato administrativo formal e que não pode se contrapor às normas legais vigentes.

Lei e regulamento - Bandeira de Mello ensina que, "se o regulamento não pode criar direitos ou restrições à liberdade, propriedade e atividades dos indivíduos que já não estejam estabelecidos e restringidos na lei, menos ainda poderão fazê-lo instruções, portarias ou resoluções. Se o regulamento não pode ser instrumento para regular matéria que, por ser legislativa, é insuscetível de delegação, menos ainda poderão fazê-lo atos de estirpe inferior, quais instruções, portarias ou resoluções. Se o chefe do Poder Executivo não pode assenhorear-se de funções legislativas nem recebê-las para isso por complacência irregular do Poder Legislativo, menos ainda poderão outros órgãos ou entidades da Administração direta ou indireta." (Curso de Direito Administrativo, Malheiros, 10ª ed., p. 224).

Como se percebe, a Resolução do Comitê Gestor, ao criar direitos de registro de domínio, não observou a prescrição legal insculpida no Direito Marcário, que dá ao dono da marca poderes exclusivos sobre o uso do nome. E não se fale em marca notória ou desconhecida do público, já que a Lei de Propriedade Industrial e a de Direito Autorais não restringe o poder do dono, dando-lhe completos direitos sobre a marca e o nome resgistrados, respectivamente.
 

"...ousamos perguntar se o INPI registraria as marcas Coca Cola ou Microsoft como uma griffe de roupas..."

Nulo - Se o ato administrativo não observa a lei, e com ela se conflita, está eivado de nulidade, já que estamos vivendo um estado de direito, onde a hierarquia das normas há que ser observada.

Assim, mesmo que a marca não seja notória ou de alto renome, basta que ela esteja registrada para dar ao seu proprietário o direito de impedir que qualquer pessoa o use para exploração comercial ou mesmo com fins de divulgação, eis que a lei, como falamos, não pode ser derrogada por um ato administrativo.

E quanto ao limite de aplicação da marca, ousamos perguntar se o INPI registraria as marcas Coca Cola ou Microsoft como uma griffe de roupas ou marca de calçados, por exemplo, já que estas atividades nada têm a ver com as citadas. Podemos apostar que não!

Assim também deve se portar quanto às marcas registradas de uma maneira geral, já que não podemos tratar com desigualdade as pessoas iguais. O que vale mais: o nome já registrado ou a notoriedade da marca? O direito marcário não faz diferença entre eles e assim deve seguir os atos administrativos, sob pena de estarem subvertendo a ordem jurídica e criando um campo jurídico onde ele não existe.

Portanto, seguindo o ensinamento do Prof. Bandeira de Mello, se o regulamento não pode criar direitos ou restrições à liberdade, propriedade e atividades dos indivíduos que já não estejam estabelecidos e restringidos na lei, menos ainda poderão fazê-lo instruções, portarias ou resoluções, como é o caso da Resolução do Comitê Gestor do Brasil.

(*) Ângela Bittencourt Brasil é especializada em Direito de Informática, membro do Ministério Público do Rio de Janeiro e editora do site Ciberlex.