Clique aqui para voltar à página inicial  http://www.novomilenio.inf.br/ano01/0107b006.htm
Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 07/17/01 20:01:44
Palavras são palavras. Nada mais? 

Mário Persona (*)
Colaborador

Palavras. São elas que sustentam os negócios. Nas trocas, nas vendas, no diálogo para dentro e para fora. São elas que garantem um lugar no mercado. Ou fora dele, quando equivocadas. As empresas sobre elas saltitam perigosamente, como em caminho de pedras em meio à escuma dos inquietos meandros de uma economia falaz.
Palavras fazem toda a diferença. Somos dirigidos por sua corrente. De pais, filhos, amigos ou inimigos elas nos vêm. E é por meio delas que eles nos vêem. Mesmo no silêncio, não param de nos inquietar. Sussurradas pela memória de uma experiência gratificante, são renovadoras de negócios. Gritadas pela consciência traída, são devastadoras.

Palavras são meus anzóis. Pequenos e imperceptíveis, vão fundo e chegam longe. Consegui fisgar três minutos de seu precioso tempo só para ler meu texto. Multiplicados pelo número de pessoas alcançadas pela tiragem estimada dos sites, jornais, revistas e boletins que me publicam, podem passar de setenta mil horas. Uns oito anos para quem só pediu três minutos de atenção.

Ao vento... - Palavras são como o vento que areja com o frescor de uma solução a mente de seu cliente. Ou transporta um cisco indesejado para seu olho. Muito depende de quem as articula. Daí o cuidado de só soprar as palavras certas na corneta de sua publicidade. Elas podem abrir carteiras para sua mensagem. Ou fechar ouvidos para sua marca.

São escribas e locutores os malabaristas das letras. Manipulam fluidos cerebrais articulados em impulsos audíveis ou códigos legíveis. Com habilidade as lançam no ar, na quantia adequada e cadência controlada, fazendo desaparecer a mão para deixar visível só a sensação. Que mesmeriza uma platéia ávida por emoções.

Você contrata palestrantes que derramam palavras de levantar o moral de seu pessoal. Ou fazem descer a guarda de seu cliente, que precisa entender antes de comprar o que você vende. Você investe em profissionais de consulta, para diagnosticar as doenças de seus negócios. E dizer o que você já desconfiava, mas não verbalizava por falta de talento. Ou coragem.

Palavras do Roberto Carlos - O Roberto estava certo quando cantou que "palavras são palavras, e a gente nem percebe o que disse sem querer, e o que deixou pra depois". Uma comunicação mal feita pode deixar você sem achar um jeito para explicar, e esperando que o cliente possa aceitar. Mas a concorrência é implacável demais. Não deixará você explicar a seu cliente que tem "um jeito meio estúpido de ser, mas é assim que eu sei te amar."

A erupção que palavras mal colocadas provocam pode ser devastadora para qualquer negócio. Até para a escola secundária onde lecionei quando jovem. Para resolver o problema da indiferença dos alunos para com os estudos, convidamos os pais para uma palestra na presença da delegada de ensino. Eram, em sua maioria, pequenos agricultores e criadores de gado.

A idéia era mostrar que eles foram bem sucedidos numa época em que estudar não era uma prioridade. Porém, seus filhos precisavam estar preparados para um mundo diferente daquele que garantiu o sustento de seus pais. Com o crescente êxodo rural, fatalmente teriam de enfrentar uma concorrência acirrada na cidade. Erramos ao convidar o menos diplomático dos professores para fazer a palestra.

"Ilustríssima senhora delegada de ensino", começou ele, entregando a única porção bem sucedida de seu discurso. E numa passada de braço que abrangia toda a platéia, qual espada ceifando na altura dos pescoços, continuou: "Como sabe, as pessoas nesta sala têm um nível de escolaridade baixíssimo!". Mal teve tempo de colocar o ponto de exclamação e já tinha pai com punhos cerrados e bocas escancaradas. Incêndio de paixões que os bombeiros do deixa-disso extinguiram de imediato. Só com palavras, nada mais.

(*) Mário Persona é consultor, escritor e palestrante. Esta crônica faz parte dos temas apresentados em suas palestras. Edita o boletim eletrônico Crônicas de Negócios e mantém endereço próprio na Web, onde seus textos estão disponíveis. 

Até julho/2001, Mário atuou como diretor de comunicação da Widesoft, editor da Widebiz Week e moderador da lista de debates Widebiz. Essa transição para uma nova atividade e as origens do artigo acima são explicadas por ele, em um texto que, na opinião de Novo Milênio, vale por uma crônica à parte:
 

"Crônicas de Negócios" é o novo veículo que leva até você minha crônica semanal. Como já deve saber, deixei minha posição de diretor de comunicação da Widesoft para exercer uma nova carreira. Como qualquer mortal, ainda sinto aquele frio na barriga, ao deixar a segurança de um emprego para decolar em vôo solo.

Mas já passei por um vôo solo quando tinha dezessete anos. Era para ser um vôo usual de treinamento num Paulistinha, com meus movimentos acompanhados, no comando duplo, pelo instrutor espremido no banco de trás. Mas quando pousamos, ele desceu e ordenou: "Pode decolar. Agora você voa solo!"

Arrisquei decolar, mesmo sem fraldas ou banheiro a bordo. A terra foi ficando para trás, e o azul de um céu de brigadeiro pintou meu pára-brisa. Atrás de mim o banco do instrutor sentia o mesmo que meu estômago: um vazio. Que eu conferia a cada minuto, só para ter certeza de que era eu e a brisa, naquela bossa que para mim era nova. Sozinho no ar.

Meu vôo agora é solo, mas não solitário. Decolo como parte de uma imensa esquadrilha de profissionais on-line, para os quais posso transferir missões além de minha área de ação. Identificá-los e supervisionar projetos faz parte de meu plano de vôo, sintetizado por minha amiga e jornalista Rachel Regis em um e-mail:

"Você tem três expertises que se destacam sobre as demais. Uma é a de fazer conexões. A formação de comunidades. Outra expertise que você deveria explorar melhor é a imensa capacidade de escrever. Não é bajulação, é a constatação de alguém que só o que sabe fazer na vida é escrever e tem algum conhecimento do assunto. A terceira expertise que se destaca é a sua capacidade de dar palestras. Você se lembra que, no dia mesmo que te conheci, brinquei (meio seriamente) a respeito, dizendo que você deveria abrir uma empresa de palestras? Pois é, amigo, acho que chegou a hora. Bom, amigo, continuando a me meter na sua vida, embora sem ser convidada, acho que há uma outra atividade que você teria condições de fazer com muito sucesso: a de consultor em comunicação."

Se ela estiver certa, e for esta também a percepção do mercado sobre o meu trabalho, o frio na barriga deve passar. E estarei ajudando empresas a desenvolver projetos com os pés no chão. Algo importante, num momento em que o piloto nos diz para apertar os cintos, porque vem turbulência. Algo ruim para os famosos pássaros argentinos, ou pássaros de prata, numa linguagem mais popular.

Hoje, um projeto bem feito garante a sobrevivência da marca, esta imagem que só permanece no cérebro dos clientes quando tatuada com a indelével tinta de uma química bem feita de PALAVRAS. Justamente o tema de nossa crônica de hoje.

Mário, Novo Milênio lhe deseja bom vôo, em céu de brigadeiro!