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Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 07/16/01 00:58:24
Reflexões sobre a derrocada das ponto.com 

José Fernando Boucinhas (*)
Colaborador

A queda livre das ações das empresas da chamada nova economia leva a refletir sobre os mitos e as novas verdades que com ela se esvaíram em fumaça. Falava-se numa nova era do capitalismo, na economia de gravidade zero que inexoravelmente sucatearia as empresas tradicionais. No Fórum Econômico Mundial, de fevereiro de 2000, os executivos das empresas de Internet eram cortejados como os novos heróis do milênio e desfilavam arrogantemente entre os demais mortais, dando longas e definitivas entrevistas sobre o admirável mundo novo, sobre as redes mundiais de notícias. Eram as celebridades empresariais que a todos ensinavam como ficar milionários em poucos meses.

Hoje, a empáfia acabou e muitos deles sumiram, para não ter de explicar o inexplicável. O patrimônio das incubadoras que haviam, eufemisticamente, se transformado em aceleradoras, encolheu espetacularmente. E os analistas dos grandes bancos de investimentos, oráculos da nova economia, que em março de 2000 ainda previam grandes valorizações das empresas ponto.com, principalmente dos papéis que faziam parte da carteira de seus empregadores, hoje são objeto de comentários irônicos dos jornalistas que há bem pouco os incensavam. Os mesmos institutos de consultoria, que previam negócios na casa dos trilhões de dólares para o B2B (N.E.: negócios entre empresas), hoje prognosticam que nenhuma empresa estritamente virtual sobreviverá.

No Brasil não foi diferente: números mirabolantes, empreendimentos que iriam mudar definitivamente a cara da economia, todos fazem água. O acesso grátis à Internet, anunciado como o novo padrão, já virou coisa do passado. Uma importante revista de negócios chegou a decretar a obsolecência de todos os executivos de mais de quarenta anos! Aqui, então, o desastre é maior, seja porque na ampla parte dos casos foram copiados modelos americanos de negócio, ignorando as peculiaridades dos hábitos de compra dos consumidores brasileiros, as práticas de negócio e, principalmente, a baixa penetração da Internet. 

Na ausência de venture capital, os financiadores foram poucos bancos de investimento que aplicaram recursos em inúmeros projetos sem viabilidade. Muitos perderam dinheiro neste verdadeiro encilhamento. Em Esaú e Jacó, Machado de Assis comenta a euforia do encilhamento: "Cascatas de idéias, de invenções, de concessões rolavam todos os dias, sonoras e vistosas para se fazerem contos de réis, centenas de contos, milhares de milhares, milhares de milhares de milhares de contos de réis. Todos os papéis, aliás ações, saíam frescos e eternos do prelo.......". E depois, tudo acabou, como se não tivesse acontecido.

A primeira conclusão a tirar desta débâcle é que os velhos princípios econômicos continuam valendo. Mesmo nas empresas ponto.com. O valor das ações de uma empresa, por exemplo, mantém correlação direta com a sua capacidade de gerar lucros e fluxos de caixa e não com o número de acessos à sua página. Também ficou claro que, no meio competitivo, criar uma marca é uma árdua tarefa que não se resolve com uma milionária verba publicitária. A Internet, ninguém contesta, é uma evolução tecnológica que impactará fortemente o modo de fazer negócios, e as empresas tradicionais dela se beneficiam aumentando, em primeiro lugar, sua competitividade e, em seguida, ampliando seus mercados.

Mas, afinal de contas, quem ganhou com a onda da nova economia? Em artigo publicado na revista Fortune, denominado "Betrayal in Wall Street", Shawn Tully mostra que os grandes ganhadores foram os bancos de investimento, que faturaram 8 bilhões de dólares com a intermediação de IPOs no valor de 121 bilhões de dólares nos últimos dois anos. Estes ganhos chegam a 62 bilhões de dólares se se considerar que a valorização dos papéis no primeiro dia do lançamento foi de 71% em 1999 e de 57% em 2000.

Estes números colocam em xeque a credibilidade destas instituições perante seus clientes. Este processo, além de acabar com a fantasia de muitos jovens, envolveu milhares de investidores que, com as perdas patrimoniais que sofreram, passaram a consumir menos, podendo levar a economia americana à recessão, o que o Federal Reserve tenta evitar. Mas que é uma concreta ameaça ao crescimento da economia mundial.

(*) José Fernando Boucinhas é presidente da Boucinhas & Campos Consultores.