Internet Udigrudi
Ana Maria Gonçalves (*)
Colaboradora
"Quando
a gente não pode fazer nada, a gente esculhamba".
(Paulo
Villaça, em O Bandido da Luz Vermelha, 1967, filme de Rogério
Sganzerla)
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A frase
acima é extraída de um dos filmes mais representativos do
Cinema Maldito, ou Cinema Udigrudi, como preferia Glauber Rocha ao "tupinizar"
a palavra underground. Grande parte do conteúdo disponibilizado
na Internet hoje também está nesta fase udigrudi.
Na década de 60, fez grande
sucesso, inclusive internacional, o Cinema Novo, com filmes como Terra
em Transe, Brasil Ano 2000 e O Bravo Guerreiro. Tinham
um forte apelo nacionalista, buscando desvendar e entender a cara do País,
suas mazelas, seu povo, suas privações, tradições
e contradições. Veio então a repressão militar,
com o AI-5, institucionalizando a censura e uma sensação
de grande impotência e derrota. Então, diante da impossibilidade
de se continuar fazendo um cinema de alerta e conteúdo, parte-se
para a "esculhambação", com o Cinema Udigrudi.
Não a esculhambação
no sentido pejorativo, mas como experimentação de uma nova
linguagem, de uma nova maneira, até subentendida, de se contar uma
história. É o artesanato do desespero, sem grandes verbas
ou pretensões, mas sim para dar continuidade à produção
nacional. É o cinema de autor, que não se importa em utilizar
clichês, metáforas, frases feitas, e até o deboche
masoquista.
A história, às vezes,
era uma série de colagens e fragmentos, sem muita profundidade ou
continuidade de tema e ação. Muitas produções
baratas, auto-sustentáveis e com forte apelo comercial (sexo e aventura).
Como os filmes nascidos na Boca do Lixo, em São Paulo, que na década
de 70 evoluíram para a pornochanchada. Era o cinema das massas,
buscando atingir o maior número de pessoas, não importando
muito como ou com que.
Com a sétima arte era proposital,
consciente e circunstancial. E com a Internet, esta oitava arte? Será
também proposital?
Já vimos o filtro dos negócios
eletrônicos mandar para o ralo muita pontocom despreparada,
sem conteúdo, sem planejamento, caída de pára-quedas
num mercado novo e ascendente. E, acredito que agora poderemos ver muitos
sites ou portais udigrudi indo pelo mesmo caminho.
A Internet é um meio extremamente
interessante de propagação e democratização
da informação. Aqui, as idéias e opiniões se
multiplicam na velocidade de, não quadros por segundo, mas bits
por segundo. O que nos faz estar muito mais atentos à rapidez com
que estas informações envelhecem. Quando o tema é
conteúdo, não há clássicos.
Novo meio - Já vimos
acontecer aqui a grande corrida, onde a empresa "precisava" estar na Internet
a qualquer custo. E, rapidamente, passava para a telinha as informações
constantes em seus folhetos e catálogos, sem se tocar que estava
lidando com um novo meio de comunicação, com linguagem e
dinâmica completamente diferentes. Hoje, a maioria destes sites está
esquecida, desatualizada, com promoções do mês anterior,
propagando uma novidade de um ano atrás, ou, pior ainda, com uma
última atualização datando de dois ou três anos.
Em situações como estas,
não há quem volte algum tempo depois procurando novidades.
Outra grave situação
é o site de autor. Aquele na qual a empresa não percebe a
necessidade de interagir com seu público, de produzir e veicular
uma informação pertinente com as suas necessidades e expectativas.
Na maioria das vezes, o internauta já sabe exatamente o que procura
quando entra em determinado site. Não encontrando, ou tendo dificuldade
em encontrar, parte para outro.
Seria bom que estes diretores de
sites udigrudi se esmerem um pouquinho mais na produção.
Antes que queimem o filme de uma vez por todas.
(*) Ana
Maria Gonçalves é publicitária e escritora em
Jundiaí/SP. |