Hollywood sem palavras para se expressar
Mário Persona (*)
Colaborador
Hollywood
pode parar. Era esta a manchete que chamava minha atenção
no noticiário. Uma parada que, segundo o prefeito de Los Angeles,
poderia custar à economia da cidade mais de oitenta mil empregos
e quase sete bilhões de dólares. Verdadeira tragédia
hollywoodiana.
A ameaça não vinha de
astros ou estrelas, mas de quem traça o caminho que conduz ao Oscar.
Não estou falando daquele tapete vermelho, campo de batalha onde
fotógrafos disputam os despojos do mau gosto. Falo dos onze mil
escritores responsáveis pela criação que cria ação.
É da pena - hoje tecla - deles que saem as imagens que enchem nossos
olhos. São os mestres da palavra.
Abordo o ditado pelo avesso, só
para mostrar a importância dos autores que movem os atores. Suas
mil palavras valem por cada imagem. Qualquer comunicação
que comunique ação começa pela palavra. No século
em que mapeamos o genoma, procurando o fim a partir do código da
gênese, descobrimos na palavra o poder do fazer. O código
e a expressão ativa do criar.
Uma sabedoria, diga-se de passagem,
disponível há milênios. Minha Bíblia diz que
os mundos foram criados pela palavra de Deus, de maneira que aquilo que
se vê não foi feito do que é aparente. Ele falou, e
foi feito; mandou, e logo apareceu. É, portanto, a articulação
do abstrato que precede o concreto, percebido pelos sentidos. Enquanto
o fazer é humano, o criar é divino.
Antes que me considerem filosófico
demais, desço à prática. É com a palavra que
o faço, para dar moção ao pensamento. Transformo em
ação verbal a expressão do pensamento para gerar uma
conseqüência concreta. Ainda vago? Então segura este
exemplo. Terminei de compilar um livro com minhas crônicas e parti
para a Internet em busca de uma editora distraída o suficiente para
publicá-lo. Queria endereços para enviar o original para
análise. Já plantei várias árvores e tive filhos.
É natural que deseje publicar um livro.
O vínculo - Foi uma
surpresa descobrir que a maioria das editoras exibe um convidativo link
do tipo "Seja um Autor". E uma decepção descobrir que pedem
apenas um projeto, e não o manuscrito, para começar. Uma
precaução contra a perda de tempo. De ler algo como esta
crônica ou um livro da genealogia de algum italiano orgulhoso da
cidadania obtida a duras penas. Antes de conhecer a criação,
querem conhecer a idéia criadora.
Se ainda não entendeu o que
isto tem a ver com negócios, tenha paciência. Ainda vou descobrir.
O fato é que, seja nas juras de amor, na produção
de um livro, no estímulo às vendas ou na exposição
de um produto, tudo começa com a palavra e seu poder de gerar uma
ação que leve à concretização. Ela faz
rir, faz chorar, ordena a guerra e alinhava a paz. A palavra é o
que leva a energia criadora às vias de fato da criação.
Mas não serve qualquer articulação
verborrágica. A palavra precisa ser precisa. Ainda mais quando temos
uma rede mundial de cordas vocais para ecoá-la. Que vibram em uníssono,
quando estimuladas na freqüência ideal. Uma infovia cuja velocidade
não é medida em quilômetros por hora, mas em fótons
por nanosegundo. Mas onde ainda ocorrem desengavetamentos. Os formatos
tirados da gaveta das mídias intrusivas e despejados na goela de
milhões.
Uma insanidade como a que eu próprio
estava prestes a cometer com meu pretenso livro. Uma carta hipnótica
com duas laudas iria apresentar às editoras o meu primeiro filho
editorial. E meu volume zipado, penteado e perfumado, seguiria anexo. Isto
foi antes de eu descobrir que os formulários nos sites das editoras
permitem uma breve apresentação de quarenta linhas. E nenhum
anexo.
Com o rabo devidamente recolhido
entre as pernas, submeti meu trabalho nas condições regulamentadas
por quem publica. Sem chiliques, protestos ou ameaças de greve.
Porque o que escrevo, ou deixo de escrever, ainda não é capaz
de parar Hollywood..
(*) Mário
Persona é diretor de comunicação da Widesoft,
que desenvolve sistemas para facilitar a gestão da cadeia de suprimentos
via Internet, editor da Widebiz
Week e moderador da lista de debates
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