Espere que está subindo um
piano
Mário Persona (*)
Colaborador
Não
sei quem inventou as expressões de Internet. Download e upload
são duas delas. Significam fazer descer os dados até seu
micro, e fazer subir seus dados até algum outro computador na rede.
A rigor, os dados não sobem nem descem. Só trafegam pela
rede. Portanto não adianta colocar seu micro no chão. O download
não ficará mais rápido.
Talvez "down" expresse nosso
estado de espírito, enquanto aguardamos o demorado "load"
da página. Se dependesse de mim, o download se chamaria upload.
Como a Terra é redonda, e a gente sempre acha que está no
topo do mundo, todos os outros computadores acabam ficando abaixo de nós.
A demora fica por conta do esforço que os dados fazem para subir
até nós. Um problema que não existia no passado, quando
a Terra era plana.
Como não acredito que você
tenha acreditado em minha explicação, vamos voltar à
realidade. O tempo que leva para aparecer algo na tela de seu computador
depende de seu micro, do modem, da linha telefônica, da fiação
nos postes, do provedor e de fatores semelhantes na outra ponta. Há
ainda causas de lentidão não explicadas. Por exemplo, as
páginas Web demoram mais para aparecer quando sua mãe está
ao seu lado esperando para poder usar o telefone.
O telefone! Quase ia me esquecendo
dele. Quem tem Internet em casa não tem telefone. É ilusão
dar o número para os outros. Está sempre ocupado. Lembro-me
de quando estava na rua e precisei ligar para casa. Vinte e um insucessos
seguidos. Acabei entrando em uma escola de línguas, pedi licença
para usar a Internet e enviei um e-mail para meu filho: "Sai da
Internet que preciso falar com sua mãe!". Depois liguei.
Cabalmente acabo a cabo -
Felizmente, já dá para acelerar a Internet. Quem tem a minha
idade não pode mais se dar ao luxo de perder tempo. Por isso decidi
pelo cabo. Não o da Boa Esperança, que devo dobrar em breve.
Refiro-me à Internet a cabo. Ao cabo de poucas semanas, minha TV
a cabo vira também Internet a cabo. Assim dou cabo do problema e
levo a cabo um plano antigo de acabar com a linha ocupada. De forma cabal.
Outros fatores me levaram a decidir.
Num cálculo rápido vi que o custo se equiparava. O que vou
pagar a mais com a Internet a cabo vou pagar a menos com a conta telefônica.
Na empresa tenho Internet 24 horas. Mas costumo voltar para casa antes
disso. É aí que sinto a diferença. Embora todos exaltem
o aumento da velocidade, acho que o mais importante está na mudança
de comportamento. Não precisar conectar para estar conectado.
Quando escrevo minhas crônicas,
uso a Internet exaustivamente para pesquisar. Na dúvida entre escrever,
por exemplo, "universidade" e "univercidade", grafia que recebi no e-mail
de um "univercitário", lanço as palavras em um site de busca.
A que tiver o maior número de ocorrências ganha. Segundo um
amigo, o método não é confiável. Se fosse,
deveríamos comer fezes. Cem trilhões de moscas não
podem estar erradas.
Não vou sentir saudade do
ruído do modem. Nem do dedilhar no tampo da escrivaninha, enquanto
esperava uma página carregar. Talvez eu sinta saudade do silêncio
do telefone. Porque sempre é chato navegar com o telefone tocando
e alguém querendo conversar. Se for o caso, eu tiro do gancho. Aí
se alguém ligar para mim, só vai conseguir linha se for engano.
Fazer download de um arquivo
não será mais como esperar subir um piano. Como aconteceu
com um amigo no ônibus. O motorista, impaciente, ameaçava
deixar o ponto quando o cobrador gritou: "Espere que está subindo
um piano". Todos riram da senhora que tentava embarcar todas as curvas
de seu corpanzil. Calmamente, ela se aproximou do cobrador e anunciou:
"Agora o piano vai tocar". E o ônibus seguiu ao som das gargalhadas.
Enquanto o cobrador tentava esconder a marca dos cinco dedos gordos que
enfeitavam seu rosto..
(*) Mário
Persona é diretor de comunicação da Widesoft,
que desenvolve sistemas para facilitar a gestão da cadeia de suprimentos
via Internet, editor da Widebiz
Week e moderador da lista de debates
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