Ciber crimes na rede sem lei
Angela Bittencourt Brasil (*)
Colaboradora
Enquanto
o Brasil não demonstra vontade política em legislar para
a nova realidade que é a comunicação eletrônica,
as autoridades administrativas começam a implantar delegacias especializadas
em crimes de informática, tal qual David contra Golias.
No começo dos anos 90, o mesmo
fenômeno ocorreu nos Estados Unidos que, no entanto, levavam a vantagem
de já ter o Ato de Fraude nos sistemas de telecomunicações
e de comunicações de dados (1988), considerando crime o acesso
não autorizado e o roubo eletrônico das informações.
De nada adianta delegacias especializadas
e um Ministério Público disposto a combater os crimes eletrônicos
se não temos ferramentas legais e técnicas capazes de combater
efetivamente o crime na Internet.
A imprensa anuncia que o Brasil é
o país onde se dá o maior número de ataques a páginas
Web, e isto acontece porque a sensação de impunidade leva
o infrator à certeza que mesmo que apanhados, dificilmente serão
condenados, pois, não havendo leis específicas, a analogia
não pode ser empregada no campo do direito penal.
Crimes outros, do tipo impróprio,
em que apenas o meio difere do ponto de vista da divulgação,
ainda são passíveis de caracterização, mesmo
levando-se em conta a subjetividade do seu caráter, como os crimes
contra a honra e as ameaças feitas por e-mail.
Interceptação
- Mas mesmo assim, como uma luz no fim do túnel, em 1996 foi promulgada
a lei 9.296 que no seu art.10 classifica como crime interceptar comunicações
telemáticas e de informática sem autorização
judicial.
Analisando o espírito desta
lei e a vontade do legislador, vamos ver que a palavra interceptar representa
qualquer intervenção nos sistemas de comunicação
eletrônica, seja por meio da Internet ou qualquer outro recurso usado
pela tecnologia em matéria de telemática.
Assim, sendo este art. 10 um tanto
amplo, mas o único que temos, ele pode ser a norma encaixável
nas ações dos hackers que violam páginas da
rede com o fim de modificá-las ou praticar o "man-in-the-middle",
ataque popular contra a infraestrutura da Chave Pública e Privada,
ainda que a generalidade com que o artigo assim nos apresenta coloca alguns
estudiosos em dúvida se uma invasão por hacker estaria
capitulada nesta norma.
Atualmente existem duas correntes
para a necessidade da implementação de
novos tipo penais para fazer frente
à nova realidade. Primeiro, os que defendem a desnecessidade de
nova legislação, sob o argumento de que as leis existentes
são suficientes para punir os ciber criminosos e que as normas penais
que temos são capazes de alcançar o avanço tecnológico.
Por outro lado, os defensores do direito eletrônico amplo afirmam
que novas leis penais são necessárias para que possa haver
o combate efetivo dos crimes cometidos pela rede.
Mesma natureza - Na realidade,
para muitas condutas perpetradas no mundo virtual nada muda em relação
à sua natureza, ou seja, apenas o meio empregado é o eletrônico,
mas são atos que igualmente poderiam ser cometidos por carta,
fax, jornal, televisão e assim, não vemos dificuldades para
a aplicação da lei penal em vigor. Como exemplo, o delito
de pedofilia que está insculpido no ECA e as fraudes em geral que
se encontram no Código Penal Brasileiro e outras leis esparsas.
Porém existem crimes que somente
acontecem por meio do computador e surgiram em função deste,
como é o caso da invasão de hackers e destruição
de sistemas, como falamos acima. O art. 10 da lei 9296/96 ao classificar
como crime o ato de interceptar comunicações telemáticas
e de informática sem autorização judicial é
por demais abrangente porque não especifica exatamente cada conduta
típica realizada na rede.
O atraso tecnológico no emprego
das ferramentas pelo poder público para combater o ciber crime é
uma questão de vontade política, vontade esta que se estende
à promulgação das novas leis que darão combate
efetivo ao crime eletrônico exclusivo. Enquanto o Brasil espera,
o crime na rede não pára e já existe uma distância
abissal entre o nosso ordenamento e a rapidez dos ciber criminosos. .
(*) Angela
Bittencourt Brasil é membro do Ministério Público
do Rio de Janeiro, editora do site Ciberlex,
professora de Direito Civil, autora do livro "Informática Jurídica,
o Ciber Direito" e co-autora do livro "Direito Eletrônico", articulista
e palestrante em seminários e congressos nacionais e internacionais,
membro da Comunidade Européia de Direito de Informática e
da Academia Mexicana de Direito de Informática. |