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Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 03/14/01 09:40:24
Privacidade no trabalho e Internet 

Ronaldo Lemos (*)
Colaborador

As relações de trabalho sofreram severas modificações com o advento da Internet. Desde a idéia de homeworking (N.E.: trabalho em casa) (idéia de que a presença física nas empresas deixa de ser necessária) até a incorporação do uso da Internet como ferramenta indispensável no trabalho diário, muitas coisas servem como exemplos de como os últimos cinco anos modificaram a vida corporativa. 

A expansão do uso e acesso à Internet no local de trabalho trouxe também algumas preocupações para as empresas. Nos Estados Unidos, por exemplo, empregadores passaram a considerar seriamente casos em que a Internet acabava sendo um veículo para assédio sexual no trabalho, para vazamento de informações confidenciais ou de propriedade da empresa, ou ainda um fator de perda de produtividade, em razão de sua utilização para atividades não-vinculadas diretamente aos objetivos profissionais da empresa. 

Monitoramento - A reação a essas preocupações foi imediata. Foram implementadas diversas iniciativas de vigilância e monitoramento das atividades on-line no ambiente de trabalho. Um estudo recente, publicado em abril do ano passado pela American Management Association, apurou que o índice de empresas que exercem algum tipo de monitoramento sobre seus funcionários saltou de 45% em 1998 para 74% em 1999. Só o monitoramento de e-mails, por exemplo, subiu de 27% para 38% no mesmo período. 

Para se ter uma idéia, a International Data Corporation (IDC) estimou que US$ 62 milhões são gastos anualmente somente na compra de softwares de monitoramento. A previsão é de que US$ 561 milhões sejam gastos até 2005. Isso tem feito com que empresas de alta tecnologia, como a Raytheon, responsável pela implantação do projeto Sivam (Sistema de Vigilância da Amazônia) no Brasil, desenvolvam produtos de olho nesse mercado. 

O mais recente é o SilentRunner, um software projetado para as empresas monitorarem absolutamente tudo que passa por suas redes, de e-mails a mensagens instantâneas (do tipo ICQ), em qualquer língua e sem que o usuário tenha qualquer conhecimento de que está sendo vigiado. 

Limites - A questão passa a ser, então, quais seriam os limites da vigilância no trabalho. Não estariam as empresas indo longe demais em seu afã de controlar o uso deturpado da Internet no ambiente de trabalho? 

O Direito Brasileiro é incerto sobre a matéria. A Constituição Federal garante a inviolabilidade de correspondência e o sigilo de dados. Entretanto, a interpretação dessas disposições para o caso concreto não é uma tarefa tão simples, tendo gerado controvérsias em inúmeras questões. 

Uma boa solução parece ser aquela que se discute atualmente nos Estados Unidos. A idéia é bastante simples e racional: em princípio, qualquer pessoa espera que suas comunicações pessoais, como, por exemplo, e-mails, sejam privativas. Essa privacidade seria inerente, ainda que o e-mail utilizado fosse aquele fornecido pela empresa, mas com a indicação clara de que o mesmo pertence a um único usuário. 

Assim, de maneira geral, a privacidade seria regra também nas empresas. Entretanto, dadas as crescentes preocupações expostas acima, o empregador poderia notificar expressamente o funcionário de que suas correspondências ou atividades on-line estariam sendo monitoradas. Essa notificação seria um requisito obrigatório para justificar a utilização de correspondências, mensagens pessoais ou dados sobre o acesso a sites que não se relacionam com as atividades profissionais como forma de repreensão ao funcionário. 

Outra forma de controle, chamada de controle afirmativo, que também vem sendo utilizada nos Estados Unidos, é a divulgação prévia de todos os websites cujo acesso é permitido, bem como os softwares cujo uso é permitido, no âmbito de uma determinada empresa. Em conseqüência, todos os demais sites e softwares não permitidos ficariam automaticamente proibidos, e a empresa poderia repreender o funcionário que violasse a regra de trabalho. 

Lei NEMA - Está sendo discutida, inclusive, a aprovação de uma lei específica nos Estados Unidos tratando desse assunto. A mesma está sendo chamada de NEMA (Notice of Electronic Monitoring Act), e apesar da resistência inicial, tudo indica que a mesma voltará a ser discutida ainda nesse ano (o texto encontra-se disponível clicando aqui). 

Assim, mostra-se claro o conflito entre interesses distintos: a proteção à privacidade dentro da empresa e o interesse dos empregadores evitarem que o acesso à Internet seja utilizado de forma contrária aos interesses da organização corporativa. Enquanto uma solução jurídica clara não chega ao Brasil, a adoção de regras de bom-senso, como aquelas apontadas acima, garante, pelo menos, que os princípios constitucionais não sejam imediatamente violados.

(*) Ronaldo Lemos atua na Suchodolski Advogados Associados.