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Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 02/06/01 11:27:38
Crise de identidade 

Mário Persona (*)
Colaborador

A notícia publicada na página de esportes deu um susto. Não nos torcedores do Corinthians, mas nos profissionais de Internet. A dispensa de um treinador mostrou como muitos enxergam a Internet. "Não somos uma empresa da Internet", declarou o vice-presidente do clube. "Somos um clube e necessitamos de resultados positivos".
A Internet ganhou uma imagem de criança rica. Que nem imagina de onde sai o dinheiro que tem para gastar. Isso ocorreu graças à quebradeira das "pontocom", seguida por demissões nas que restaram. E como desgraça pouca é bobagem, a retranca da notícia de recessão da economia norte-americana vem bater no sul-americano Brasil, fechando indústrias e demitindo mais gente.

Emergente - Mas os investidores estrangeiros já consideram o Brasil um dos favoritos dentre os mercados emergentes. Enquanto a Internet passa por uma correção em sua identidade, retornando ao que sempre deveria ter sido. Para atender um mercado que vê na Internet um meio, não um fim. Uma ferramenta, não um videogame.

Para que você comprou seu primeiro micro? Seja sincero. A desculpa que deu à esposa, "para ajudar na educação das crianças", não serve. Confesse. Você comprou por causa dos games. Foram madrugadas inteiras tentando salvar a mocinha, vencer a corrida, destruir as naves inimigas. Enquanto seu filho dormia. E sua viúva também.

A moda passou e você parou de usar um micro para jogar. Veio a Web, e a criança em você acordou. Outra vez a desculpa foi "para ajudar na educação das crianças". Mas enquanto seu filho e sua viúva dormiam, você navegou. A moda passou, e agora você tem o micro, a Internet e uma crise ensaiando no horizonte. Quando todo mundo precisará economizar. O que cria mercado para soluções de otimização de processos, de empresas, do próprio trabalho.

Mais com menos - As empresas vão precisar fazer mais com menos. Menos recursos, menos gastos com comunicação, menos gente. Discursos sociais do tipo "as máquinas vão causar desemprego" podem parecer bonitos, mas a realidade é nua e crua. Sobrevive quem reduz custos e aumenta a produtividade. Para quem não aceita mudanças, eficiência continua sendo palavrão.

Se você é marketeiro, seu mercado crescerá, dentro e fora da rede. Não para a propaganda dos desgastados banners, mas para o uso da ferramenta em ações estratégicas para valorizar a marca. Mais produtivas que simplesmente "bannear" páginas Web. A Internet ajuda a construir a marca que sustenta a imagem da empresa. Que é o que permanece e ajuda a manter mercado em tempos de crise.

Na escassez, as empresas enxugam seus quadros. Quem fica, procura se reciclar estudando. E quem sai também. O que cria demanda para o ensino à distância voltado para o aperfeiçoamento profissional. Mas leia-se aqui educação que acrescenta recheio ao profissional. Em uma economia de guerra, o que se busca é competência. Não basta ter um MBA. É preciso ser um.

Teletrabalho - As relações de trabalho também mudam. O teletrabalho ajudará empresas de cinto apertado a trabalhar sem a gordura de empregados pendurados. Um trabalhador virtual economiza gasolina, tempo e encargos sociais. Oportunidade para quem sabe se locomover na rede, na busca e execução de serviços.

Empresas virtualizadas são mais econômicas, precisam de menos espaço, compram e vendem com maior eficiência, atingem mercados onde fisicamente não estão. Sabem gerenciar suas cadeias de suprimentos. Transformar estoques tangíveis em informações intangíveis. Reduzir o time-to-market (N.E.: tempo até lançar o produto no mercado), agilizar a entrega, economizar, otimizar e lucrar. Alguém precisa continuar construindo a plataforma onde isso acontece. É este o mercado para profissionais de Internet.

Mas é inegável que a onda das bolhas pontocom tenha danificado a imagem da Internet. Um dano difícil de ser reparado. Como o banheiro de um rico empresário, cliente de um arquiteto que conheci. Azulejos antigos e raros, pintados à mão, foram importados de Portugal especialmente para o banheiro da mansão. Apesar do empresário brigar com o azulejista, este terminou seu trabalho. Mas cuidou para que não sobrasse um azulejo sequer para reposição.

Meses depois, quando o empresário ocupou pela primeira vez o trono de seu majestoso banheiro, lembrou-se imediatamente do azulejista. De propósito, bem na parede diante da privada, estava assentado um único azulejo de cabeça para baixo. Enquanto isso, em algum lugar da cidade, o azulejista celebrava sua vingança.

(*) Mário Persona é diretor de comunicação da Widesoft, que desenvolve sistemas para facilitar a gestão da cadeia de suprimentos via Internet, editor da Widebiz Week e moderador da lista de debates Widebiz.