Obrigado pela atenção
Mário Persona (*)
Colaborador
Gosto mais
de peixe do que de pescar. Especialmente depois de pronto, sem o cheiro,
gosma ou escamas do cru. Ou aquelas seringas aladas que ficam zunindo em
nossos ouvidos nas pescarias. Mas costumava pescar quase todos os domingos
em meu tempo de estudante. Saía cedo em direção às
pedras do Morro do Maluf, no Guarujá, fazendo uma escala na peixaria
para comprar camarões para isca. Parte deles eu lavava nas ondas,
até se dissolverem. E o anzol voltar vazio, com aquele sorriso sarcástico
de um olho só. O resto eu fritava em meu solitário almoço.
Já que nenhum peixe ousava me acompanhar.
Pior do que a humilhação
de almoçar iscas sozinho, era pescar com varinha de estudante acompanhado.
Ao meu redor sempre havia uma dúzia de aposentados, desfilando equipamentos
tão bons, que só faltavam pescar. Eu os observava gabando-se
de suas aquisições. Suas carecas, protegidas por chapeuzinhos
de pano cáqui, quase eram tocadas pelos queixos, de tão erguidos.
Mas não por altivez, e sim por força dos bifocais. Queriam
invejar com nitidez o anzol de última geração ou o
molinete com tração nas quatro rodas exibido pelo colega.
Mas aquela parafernália tecnológica
só servia para lavar seus camarões um pouco mais longe do
que eu lavava os meus. No resto era tudo igual. Nossas iscas sequer chamavam
a atenção dos peixes ou entravam em contato com eles. Com
exceção daqueles que compravam sardinhas para usar como isca.
Nunca fiz isso. Preferia almoçar camarões.
Isca - Um dia fiquei sem iscas.
E sem almoço. A solução foi apelar para os mariscos
grátis, abundantes sob meus doloridos pés. Com o canto do
olho os aposentados me observavam. Faziam cara de quem entende demais,
com pena de alguém que entende de menos. Mas isso foi só
até o primeiro peixe prateado surgir rebolando no ar. Naquele domingo,
almocei peixe, e não camarão. Acabara de descobrir que os
peixes preferiam o marisco ao camarão. Pelo menos os que moravam
em frente ao Morro do Maluf pareciam ser alérgicos a ele. Ao camarão.
Você precisa entender e atender
o gosto de seu cliente, se quiser fisgá-lo. E mesmo que você
gaste milhões em marketing, ou use toda a tecnologia disponível
para pescar com todas as varas, tudo será em vão se não
conseguir fazê-lo parar aquilo que fazia para prestar atenção
naquilo que você faz. Que deve ser algo de dar água na boca.
Numa ação parecida com o chupar limão na frente dos
músicos de uma big-band.
Lado errado - A antítese
disso eu vi num outdoor de pisos cerâmicos. A foto mostrava a face
do piso que fica assentada na argamassa e o slogan dizia: "Agora com nova
base atomizada". Nas construções e reformas pelas quais passamos,
a escolha do piso foi sempre de minha esposa. O piso da propaganda pode
ser excelente, mas duvido que esposas estejam interessadas em uma "nova
base atomizada". É a beleza e o design que as atrai, não
o processo de fabricação. Mulheres não compram roupas
pelo que vêem no avesso.
A isca que funcionaria em uma revista
especializada para construtores ou revendas, não serve para um outdoor
em mar aberto e cardumes ecléticos. Antes que você diga que
a propaganda funcionou por chamar minha atenção, saiba que
não basta chamar a atenção para vender. É preciso
dar atenção. Para fazer com que ele seja obrigado a parar
por causa da atenção que você lhe dispensou.
Isto evita criar, no cliente, a sensação
de que estão conversando por sobre o seu ombro. Experimente fazer
isso com sua esposa e vai entender o que estou falando. Você criará
nela a horrível sensação de exclusão, de invisibilidade,
de alguém que não existe para você.
Aprendi o quanto esta sensação
é ruim quando alguém quebrou o espelho do banheiro. Na manhã
seguinte, ainda meio dormindo, lavei o rosto amassado, enxuguei-o na toalha
passada e, quando olhei em direção ao espelho, não
vi ninguém. Apenas a moldura vazia e o monótono cinza do
fundo. Que fez meu coração disparar com o susto de pensar
que eu havia deixado de existir.
(*) Mário
Persona é diretor de comunicação da Widesoft,
que desenvolve sistemas para facilitar a gestão da cadeia de suprimentos
via Internet, editor da Widebiz Week e moderador da lista de debates
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