Estamos contratando clientes
Mário Persona (*)
Colaborador
Não,
eu não me enganei. O título está correto. Estamos
contratando clientes. E qualquer empresa de olho na tendência dos
negócios deveria fazer o mesmo. A seleção e contratação
de clientes. O salário? Bem, durante o período de experiência
nenhum valor monetário estará envolvido na contratação.
Passado este período, o salário será igual a zero,
mas com reajustes em conformidade com a lei. Para não causar melindres
no Sindicato dos Clientes. Se é que existe.
Antes que encomende uma camisa de força
para entregar em meu endereço, é bom que saiba que você
já trabalha assim há anos. Sem perceber, você foi contratado,
começou a trabalhar e, dependendo de sua idade, já deveria
estar fazendo jus a uma gorda aposentadoria. Sua profissão? Muitas.
Você trabalha de telefonista, balconista, garçom, caixa de
banco e até de programador.
É provável que tenha
começado com a companhia telefônica. Fazendo o trabalho que
era das telefonistas, quando você mesmo começou a discar.
E o armazém da esquina? O balconista desapareceu junto com o balcão
e contrataram você para pegar produtos na prateleira. Depois foi
a vez de aprender a passear por entre as mesas do restaurante equilibrando
sua própria bandeja. Sem gorjetas. Os bancos exigiram um pouco mais
de habilidade. Mas apostaram tanto na sua capacidade, que até criaram
um banco só seu: o Personal Banking. Com o qual não tenho
qualquer parentesco. Depois surgiu a versão "beta", o presente de
grego que as empresas de software deixaram você experimentar.
Sua vez - É hora de
você também começar a contratar clientes. Mas vá
devagar. Não serão as condições aparentes -
salário zero, nenhum seguro saúde, menos cesta que a básica
- que irão cativar sua equipe. Você irá pagá-los
com uma moeda intangível, identificada na bolsa dos valores etéreos
por vários nomes. Conforto, bem-estar, sucesso, prazer, notoriedade,
entretenimento, prestígio, comodidade, autoridade ou fama.
E faço uma pausa para agradecer à opção "Sinônimos"
de meu processador de textos.
Qualquer uma destas palavras pode
ser traduzida por vantagem. Que será indiretamente enxergada,
por seus clientes, como economia ou ganho financeiro. Porque nem cliente
é de ferro. Como irá criar esse tipo de valor, é o
desafio que tem para enfrentar. Algo que ficou mais fácil em uma
sociedade em rede, onde você tem acesso imediato aos neurônios
de seus clientes para saber o que pensam.
Foco - A primeira providência
é deslocar o foco, caso sua empresa o esteja colocando no produto.
Se ainda estiver, considere-se um empresário de sorte. Por
que, com uma estratégia de foco no produto, sua empresa já
deveria ter desaparecido há um bom tempo. Mas, se já progrediu
a ponto de ter seu foco no cliente, não posso negar que esteja se
modernizando. Só que vou elogiar sua estratégia com uma expressão
contemporânea à mesma: "É uma brasa, mora!".
"Sem foco no produto, sem foco no
cliente, que foco devo ter?", perguntará você. Elementar,
meu caro Watson. Acompanhe meu raciocínio. Foco no produto ou no
cliente você consegue usando seu olho. Você não quer
contratar seu cliente? Não quer terceirizar serviços para
ele executar, reduzindo seus custos, mas deixando-o satisfeito com um hollerit
de comodidade, prestígio e prazer? Então terceirize o olho
também. Passe a usar o olho do cliente e você terá
o foco do cliente. Enxergará as coisas como ele enxerga e saberá
exatamente como fazê-lo feliz. Além de economizar córnea.
Confesse. Seja sincero em admitir
que, antes de ler este artigo, você ainda não tinha percebido
que já trabalha para grandes empresas como Embratel, Pão
de Açúcar, McDonald's, Bradesco e até para a Microsoft.
Pois é. Funcionário de carteirinha virtual, sem perceber.
Espero que tenha entendido que aquilo que você vê não
é exatamente o que deve enxergar. Como no suposto diálogo
entre Sherlock Holmes e seu caro Watson.
"Meu caro Watson", murmurou o sonolento
Sherlock na noite estrelada. "Por que vemos tantas estrelas no céu?"
"Ora, Sherlock, porque o universo
é formado por milhões de corpos celestes em suas órbitas,
mantendo entre si um equilíbrio perfeito, gerando sua própria
luz ou refletindo a luz alheia, permitindo a navegação noturna
dos navios de Sua Majestade, que transportam riquezas entre as colônias
do reino no qual o Sol nunca se põe! Acertei?"
"Errou. A resposta é elementar,
meu caro Watson: roubaram nossa barraca".
(*) Mário
Persona é diretor de comunicação da Widesoft,
que desenvolve sistemas para facilitar a gestão da cadeia de suprimentos
via Internet. |