Penso, logo... existo?
Mário Persona (*)
Colaborador
Você
já ouviu falar do garoto que criou um site de milhões? Que
garoto? Qualquer um. Garotos criativos todo mundo conhece. E tem um em
casa. Ou gostaria de ter para contar aos amigos. Um garoto prodígio
que cria um negócio de milhões é um excelente marketing.
Quer ele exista ou não.
A figura humana dá personalidade
ao produto. E cria um sentimento de proximidade. Lembro-me do primeiro
Chevrolet Opala que chegou à minha cidade. Dentro da agência,
abarrotada de curiosos, pediram a um jovem para manobrar o carro até
o local de exposição. Naquele momento, quem cruzasse o olhar
com
o pai do garoto recebia, à queima-roupa, a frase: "É meu
filho!" Peito estufado de orgulho e dedo apontando para o Opala vermelho.
"No futuro", escreveu Andy Warhol,
"todo mundo será famoso por quinze minutos". Acho que o lançamento
do Opala em minha cidade não foi o marco inicial desse futuro que
ele previu. Mas a Internet está sendo, ao permitir que trabalhos
fantásticos sejam criados por garotos, com direito a muito mais
que quinze minutos de fama. Ou até por marmanjos, vestidos com pele
de garoto, chapeuzinho vermelho, vovozinha ou o que for mais conveniente
na hora de vender.
Rosto que vende - Qualquer
marketeiro sabe que produtos e serviços precisam ter rosto e personalidade.
Se não fosse assim, não existiria mercado para modelos. Às
vezes é o próprio empresário quem empresta sua imagem
ao produto. Paul Newman pisca para você no site www.newmansown.com,
numa ação de marketing que ele próprio chama de uma
"descarada exploração visando o bem comum". Seu rosto está
em todas as páginas do site, vendendo pipocas, molhos, sucos e sorvetes.
A empresa, sem fins lucrativos, já rendeu cem milhões de
dólares para instituições de caridade, desde sua fundação
em 1982.
A fórmula, que funciona para
Paul Newman atraindo verba para obras de caridade, também funciona
para outras empresas. Meu biscoito de polvilho predileto - e sou vidrado
em biscoito doce de polvilho - tem no pacote a foto colorida do dono da
empresa. Um senhor grisalho, de camisa branca e gravata, fazendo pose de
executivo e dizendo: "Sou eu mesmo quem faz". Precisa mais? Como não
confiar no produto, se estou vendo a cara do dono bem ali no pacote. Ele
dá a mão - ou o rosto - à palmatória, para
o caso de o cliente encontrar falhas na qualidade.
A tecnologia permite que seres virtuais
tenham seus rostos e corpos emprestados a campanhas de marketing. Lara
Croft deixou de ser um personagem que estraçalha animais no game
Tombraider
para estraçalhar corações como musa de uma nova geração
de seres virtuais. Com menos músculos e mais charme, surgiu Webbie
Tookay, a modelo virtual da Illusion2K,
invejada pelas pretendentes às passarelas. Depois foi a vez de AnaNova
narrar as principais notícias do dia em um telejornal virtual, seguida
de cantores virtuais, como E-Cya.
Cliente virtual - Ser virtual
não é privilégio de empresas e produtos, mas até
de clientes. Você pode virar modelo digital para experimentar a roupa
que estiver comprando no site Just4MePlus,
da JC Penney. O sistema é da MyVirtualModel.
Basta preencher um questionário com suas medidas e características
físicas, para se enxergar na tela provando as roupas. A loja deve
estar tendo problemas com devoluções, pois que mulher é
sincera ao revelar suas medidas?
Para onde vão os modelos virtuais?
Se na pré-história da interatividade alguns sites já
mostram automaticamente fotos e produtos com base nas informações
de preferência colhidas em visitas anteriores, imagine juntar esta
tecnologia aos seres virtuais. Bancos de informações de clientes
serão como alcagüetes de uma nova era, revelando detalhes de
sua vida para um sistema gerador de seres virtuais. Já pensou ligar
o micro ou a TV, e sua mãe aparecer digitalizada na tela sugerindo
que tome a vitamina "X"?
O Laboratório de Tecnologia
Avançada da Sprint já trabalha no Chase Walker, um personagem
virtual para redes de alta capacidade. Muito parecido com um ser humano,
com expressões faciais e voz, ele poderá responder a comandos
de voz do usuário. Num futuro não muito distante, empresas
como a Widesoft poderão ter seu próprio modelo virtual. A
complexidade da tecnologia da informação poderia ser humanizada
ganhando um rosto. Para ficar mais real, ele poderia estar conectado a
um programa capaz de discorrer sobre temas de interesse, desde e-business
até assuntos mais amenos como este artigo sobre os seres virtuais...
Êpa! Será...?! Não... tenho certeza absoluta de que
sou real. Penso, logo existo. Ou não?
(*) Mário
Persona é diretor de comunicação da Widesoft,
que desenvolve sistemas para facilitar a gestão da cadeia de suprimentos
via Internet. |