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Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 05/09/00 08:07:16
I hate you! 

Mário Persona (*)
Colaborador

Não, eu não odeio você. A razão do título é simples. Você abriria um e-mail chamado "I Love You", depois de receber um zilhão de avisos sobre um vírus com este nome? É claro que não. Meus artigos são publicados em dezenas de sites, jornais e revistas, mas viajam também por e-mail para alguns milhares de leitores. Não poderia ter o mesmo título do "I Love You", o vírus que já desiludiu tantos corações apaixonados e carentes de afeto. E deixou os computadores tão vazios quanto as recordações de um romance de verão.
Mas não se preocupe. Este texto está limpinho. Talvez até limpo demais para sua leitura valer a pena. Mesmo assim, vou arriscar. Sem cair na mesmice de falar dos prejuízos causados pelo vírus. Ou de seu criador, caçado pela polícia como alguém inteligente o suficiente para criar um vírus, mas estúpido a ponto de deixar nele nome e endereço. Mas é possível, porque tive um colega assim. Ele escrevia seu nome atrás das colas que preparava para as provas. Até a professora encontrar uma no chão da sala de aula.

O "I Love You" possui todas as características de uma campanha de marketing campeã. Usa um veículo poderoso e de amplo alcance, o e-mail, com um índice de eficácia maior que o da TV. Surpreso? Então tente imaginar milhares de pessoas recebendo uma mensagem única e pessoal. Cujo título faz com que executem uma ação, para abrir a mensagem, outra para ler seu conteúdo, e mais uma, para abrir o arquivo anexado. Um efeito dificilmente conseguido pelo fulgor lúgubre de um comercial na TV, que em muitos lares funciona cada vez mais como abajur, e menos como mídia.

Sonho de marketing - O título do e-mail atraiu, conquistou e gerou uma ação. O sonho de qualquer marketeiro. E, uma vez aberto, a mensagem não deixou por menos. "Kindly check the attached LOVELETTER coming from me". Irresistível! Alguém pedindo gentilmente para você abrir uma carta de amor anexada à mensagem! Quem não gostaria de receber uma carta de amor assim? Só que deste click em diante o encanto é quebrado. Pior que a carruagem de Cinderela voltar a ser abóbora é você descobrir que o e-mail se transformou em pepino. Para você resolver.

Apesar de seu aspecto destrutivo, que a mensagem entrou em sintonia com os anseios de seu "cliente", isto ninguém pode negar. Chegou, ganhou sua confiança, criou interatividade e ainda conseguiu convencer o Outlook de seu micro contaminado a emprestar uma lista de endereços de e-mail. E passou a se mandar para outras paragens às expensas de seu hospedeiro.

Uma boa campanha de marketing atrai, cativa, conquista e gera uma ação. E quando consegue usar cada pessoa "contaminada" como veículo e trampolim de disseminação, aí o sucesso é total. Como uma dona Maria que conta para todo o bairro que a camisa do marido ficou branquíssima com o novo sabão. Mas marketing apenas não basta. O produto precisa ser bom. Se a cor original era azul, dona Maria vai contar para todo o bairro, mas com outras intenções.

Conspirações - O "I Love You" conseguiu fixar sua marca, ainda que às avessas. Todo mundo só fala nele. Até os fanáticos por teorias de conspiração começam a sugerir que ele destrói arquivos de som e imagem porque vem de alguma empresa contra a pirataria multimídia. Ou do Bill Gates, para desacreditar a Internet e vender uma Internet mais segura junto com a próxima versão do Windows. Também tem gente botando a culpa em quem investe em empresas de antivírus e sistemas de segurança, para inflar as ações que comprou. Prepare-se para ser assediado pelo vírus das teorias.

Quando o impacto da onda atingiu o Brasil, fui procurado por um jornal querendo saber tudo sobre o vírus. E por uma emissora de TV, para gravar uma entrevista para o telejornal da noite. A repórter queria saber se eu já tinha recebido algum e-mail com o título "I Love You". Nenhum. Meu filho sim. Talvez por ser mais jovem e simpático.

Mas estou preparado para o caso de um "I Love You" chegar à minha caixa postal. Esse não me pega. Sei que virá de alguém tentando me enganar. Seu destino é o lixo. Mas se, depois de você ter lido meu artigo, eu receber um e-mail seu com o título "I Hate You", pode ter certeza de que vou abri-lo. Sei que está vindo de um leitor sincero.

(*) Mário Persona é diretor de comunicação da Widesoft, que desenvolve sistemas para facilitar a gestão da cadeia de suprimentos via Internet.